"Nestes casos, há momentos e momentos para se fazer justiça. A situação é muito complicada e o mundo parece que anda para trás. Eu estive agora na Bolívia, no dia 09 de outubro [data do fuzilamento de 'Che' Guevara], e os militares do antigo regime reivindicaram absolutamente tudo o que fizeram e [o presidente] Evo Morales condecorou alguns desses militares" disse à Lusa, em Lisboa, Juan Martin Guevara referindo-se aos veteranos que participaram na operação de captura e morte de "Che" Guevara.
"Se o discurso de Evo Morales foi um discurso duro, revolucionário, os factos não foram os mesmos porque os militares continuam a ter poder e a dizerem o que lhes apetece. O que eles dizem é, evidentemente, contrário à realidade: eles assassinaram um prisioneiro", acrescentou.
Juan Martin Guevara, 72 anos, é autor do livro "O Meu Irmão Che" em que relata a história da família até à atualidade e sobretudo a personalidade do irmão Ernesto que admite ter sido alvo de uma ação "combinada" dos serviços secretos dos Estados Unidos e da União Soviética na Bolívia.
"Alguns, entre os quais eu me incluo, desconfiaram que o KGB havia colaborado com a CIA para o capturar -- A URSS não gostava de revolucionários" (página 163), escreve o irmão mais novo de "Che" Guevara que se refere também à "traição" do Partido Comunista da Bolívia.
No dia 29 de setembro de 1967, a agência de notícias norte-americana Associated Press noticia, pela primeira vez, que o Exército boliviano iniciou uma operação com 1.500 homens para localizar "Che" Guevara no sudoeste do país.
"Ramón", aliás "Che" Guevara é capturado pelo Exército da Bolívia, apoiado por conselheiros militares das forças especiais dos Estados Unidos e agentes da CIA no dia 08 de outubro do mesmo ano.
Um dia depois, "Che" Guevara é fuzilado às 13:10 pelo oficial subalterno Mario Terán, 27 anos, sob as ordens diretas do presidente boliviano René Barrientos.
O general Barrientos, no poder desde o golpe de Estado de 1964, é apontado como um militar com fortes ligações a empresas norte-americanas e à CIA, que se envolve no combate à guerrilha marxista.
Após o fuzilamento, as mãos de "Che" Guevara são amputadas para confirmação das impressões digitais na Argentina e mais tarde enviadas para Havana.
A localização dos restos mortais do "comandante" revolucionário é mantida em segredo até 1995 quando uma equipa de especialistas forenses descobre um morto sem mãos numa vala comum junto à pista do aeroporto de Villagrande, na Bolívia.
Em 1997 o cadáver de "Che" Guevara é finalmente trasladado para Cuba.
Para o irmão do comandante revolucionário argentino a "História fará o julgamento do que se passou" e conclui que o atual presidente boliviano, Evo Morales, "não tem poder para julgar aqueles que foram assassinos e não combatentes", referindo-se aos militares bolivianos que criticaram abertamente as comemorações oficiais dos 50 anos da morte de "Che" Guevara.
"Por isso, (no passado dia 09 de outubro) eu não subi ao palco, nas comemorações na Bolívia. Fiquei junto às pessoas porque considero que se trata de uma questão política do governo boliviano. Que o resolvam eles entre si. Mas, o que é verdade, é que os militares tomaram uma posição clara e que tornaram pública", contra as cerimónias, sublinha.
O livro 'O meu irmão CHE' (Objectiva, 277 páginas) de Juan Martin Guevara em colaboração com a jornalista Armelle Vincent está publicado em Portugal.