"Este relatório não permite identificar qualquer ato de má conduta ou abuso por parte do cardeal", destacou o Vaticano, em comunicado, na sequência do final de uma investigação solicitada pelo sumo pontífice a um ex-juiz de Quebec.
"Não está previsto um procedimento canónico mais completo" contra este conselheiro próximo do papa Francisco, adiantou ainda.
Esta decisão não surpreendeu o advogado canadiano da alegada vítima: "Isso não é de forma alguma sinónimo de um sistema de justiça independente", realçou Alain Arsenault à agência France-Presse (AFP).
Gérald Cyprien Lacroix, de 66 anos, está acusado no âmbito de uma ação coletiva que visa mais de uma centena de membros da diocese de Quebec.
Segundo o documento judicial consultado pela AFP, Lacroix, arcebispo do Quebec desde 2011 e cardeal desde 2014 é acusado de tocar numa menor, com 17 anos no momento dos alegados atos, entre 1987 e 1988.
Confrontado com este caso, o papa Francisco pediu em fevereiro ao ex-juiz André Denis "que conduzisse uma investigação sobre os factos, circunstâncias e imputação do alegado delito".
O pedido foi uma novidade para o Vaticano, que nunca confiou a um leigo uma investigação visando um cardeal.
"Nunca, que eu saiba, cometi quaisquer ações inadequadas contra ninguém, sejam menores ou adultos", defendeu-se o cardeal no final de janeiro.
"Os elementos recolhidos durante a minha investigação tornam implausível que os factos alegados contra o cardeal tenham ocorrido", concluiu, por sua vez, o juiz Denis.
"A grande fraqueza do meu relatório é que não me encontrei com a demandante", admitiu, no entanto, durante uma conferência de imprensa em Quebec.
A alegada vítima recusou um encontro, reservando as suas declarações à justiça, mas mantendo "obviamente todas estas acusações", explicou o seu advogado, que acrescentou que tem recebido todas as semanas novos depoimentos que se juntam à ação coletiva.
Reiterando a sua inocência, o cardeal Lacroix permanecerá nos bastidores durante algum tempo "para promover uma solução da ação coletiva", indicou a diocese de Quebec, em comunicado.
Desde a eleição do Papa Francisco em 2013, pelo menos três outros cardeais estiveram envolvidos em acusações de agressão sexual.
Em 2019, o papa Francisco destituiu o ex-arcebispo de Washington, Theodore McCarrick, uma sanção quase sem precedentes na história da Igreja relativa a um cardeal, depois de o Vaticano o ter considerado culpado de ter agredido sexualmente pelo menos uma adolescente de 16 anos em 1974 e de ter-se envolvido em comportamento sexual impróprio com seminaristas adultos.
A luta contra a violência sexual na Igreja constitui um dos projetos do pontificado de Francisco, que defende uma política de "tolerância zero" face à multiplicação dos escândalos, ao mesmo tempo que reconhece que a Igreja deve "fazer mais" contra este flagelo.
O papa argentino criou uma comissão consultiva para a proteção de menores, levantou o segredo pontifício sobre a violência sexual por parte do clero e obrigou religiosos e leigos a denunciar quaisquer casos à sua hierarquia. Mas o segredo da confissão permanece absoluto e as associações de vítimas exigem mais medidas.
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