Vinte anos depois de Tom Hurndall ser morto pelo exército israelita na Faixa de Gaza, o seu pai volta a criticar as ações de Israel e a atitude dos governos que apoiam Telavive, acusando-os de "encorajar ativamente a morte de mulheres e crianças" no enclave palestiniano.
Anthony Hurndall, pai de um ativista britânico morto por um atirador furtivo enquanto cuidava de crianças em Rafah, no sul de Gaza, tornou-se também ele num ativista, lutando por uma maior justiça nos territórios palestinianos ocupados. Na altura, em 2003, Hurndall abandonou o seu emprego para ajudar a investigação à morte do seu filho como advogado.
Num comunicado citado pelo The Guardian, garantiu ser um defensor do estado israelita e da solução de dois estados, mas afirmou que, nos 20 anos desde a morte do seu filho, as atitudes das forças armadas israelitas (IDF, na sigla em inglês) só se tornaram mais agressivas, letais e autoritárias.
"As IDF discriminam regularmente civis e crianças como militares, ou como pessoas armadas, e fabricam relatos de eventos como pretexto para a sua matança. Estas alegações são semelhantes às que a IDF usa para justificar os bombardeamentos e outros ataques a alvos civis e hospitais em Gaza", atirou Hurndall.
Anthony Hurndall, who for years pursued accountability to secure justice for his son, British photographer Tom Hurndall, who was shot by an Israeli sniper in Gaza 20 years ago, tells @SkyNews that you can’t rely on Israeli accounts of events.@jocelynhurndall pic.twitter.com/5nwOjSYuHH
— Husam Zomlot (@hzomlot) November 30, 2023
Com a sua experiência de investigação de crimes pelas forças israelitas - e notando que a pressão internacional foi crucial para condenar o sniper que matou o seu filho a oito anos de prisão -, o advogado apontou, contudo, que os palestinianos não terão os mesmos recursos para investigar a morte da maioria dos civis em Gaza, pelo que a responsabilização das forças israelitas na justiça será mais difícil.
"Apenas quando confrontados com provas irrefutáveis e submetidos a uma pressão incessante do governo britânico e da imprensa, é que o exército cedeu e aceitou responsabilidade. Infelizmente, os civis palestinianos não têm os recursos ou o apoio para se protegerem dessa forma", lamentou.
Anthony Hurndall criticou ainda os governos internacionais que têm apoiado incondicionalmente Israel, em particular o Reino Unido, apontando-lhes o dedo e considerando que a sua passividade com a força de ação das forças israelitas "encoraja" a morte de milhares de civis em Gaza.
"Os governos ocidentais e os média parecem prontos a aceitar os relatos e a narrativa israelita, e ainda as reproduzem. Com isso, estão a encorajar ativamente a morte de mulheres e crianças e, na minha perspetiva, são eles próprios cúmplices na morte de civis e em crimes de guerra", sublinhou o ativista.
O cessar-fogo acordado entre o Hamas e Israel, mediado pelo Qatar, Egito e EUA, tem permitido a libertação de reféns israelitas, sequestrados pelo grupo fundamentalista durante o ataque de 7 de outubro, bem como a libertação de presos israelitas. Estes detidos, incluindo dezenas de crianças e mulheres, estavam presos desde antes da guerra, e muitos estavam sob detenção no âmbito de uma prática israelita de 'detenção administrativa' - um sistema que tem permitido às autoridades israelitas prender palestinianos sem acusação, por tempo indefinido, mesmo na Cisjordânia ocupada.
Muitos libertados têm também revelado histórias de abuso, de tortura e de pobres condições sanitárias impostas nas prisões israelitas. Alguns são jovens adultos, que foram detidos pela polícia por atirarem pedras, ficando na prisão durante anos.
O ataque do Hamas sobre Israel fez cerca de 1.200 mortos no dia 7 de outubro, sequestrando também mais de 200 pessoas. Como retaliação, o exército israelita dizimou a Faixa de Gaza ao longo de quase dois meses, matando mais de 15 mil palestinianos, incluindo milhares de crianças, e deixou a região palestiniana numa profunda crise humanitária reconhecida pela Organização das Nações Unidas.
Leia Também: Guterres denuncia "catástrofe humanitária épica" em Gaza e pede ajuda