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"Tudo pode acontecer" entre Hezbollah e Israel em confrontos na fronteira

 Um pastor libanês pôde tornar-se herói ao fazer frente a um "bulldozer" israelita que avançava há semanas na disputada fronteira entre os dois países, em confrontos que fazem recear a reedição de guerras de décadas anteriores.

"Tudo pode acontecer" entre Hezbollah e Israel em confrontos na fronteira
Notícias ao Minuto

10:44 - 15/07/23 por Lusa

Mundo Conflito

Aos 58 anos, Ismael Nasser foi filmado em junho a fazer frente sozinho a um 'bulldozer' Israelita, surgindo irredutível em frente à máquina que continuava a avançar empurrando um monte de terra para cima do pastor que ficou enterrado até à cintura até que forças das Nações Unidas impediram o condutor de continuar.

"Esta terra pertence ao Líbano e não vamos sair desta terra", disse Nasser pouco depois do incidente em entrevista às televisões locais, comentando o vídeo que se tornou viral.

"Não vamos sair desta terra porque pertence aos meus compatriotas, aos meu antepassados, à minha família, que pagou com sangue por esta terra e não a vamos dar a Israel", acrescentou.

Fonte da missão de paz das Nações Unidas no Líbano (UNIFIL) disse à Lusa que a situação atual na fronteira entre Israel e o Líbano é "extremamente sensível", após semanas de confrontos que já causaram feridos.

Na quarta-feira, três membros do movimento armado xiita Hezbollah, considerado terrorista pela União Europeia e Estados Unidos, ficaram feridos após uma explosão na zona fronteiriça.

Após o incidente, o exército israelita (IDF) disse em comunicado que usou "armas não-letais" para afastar "vários suspeitos" que Israel acusou de tentar sabotar a vedação instalada entre os dois países.

O líder do Hezbollah, Sayyed Nasrallah, disse no mesmo dia que "serão tomadas as medidas necessárias" após uma investigação sobre o incidente.

O tumulto aconteceu no aniversário do início da guerra entre o Hezbollah e Israel em 2006, e é o mais recente após uma longa lista de ataques que se têm intensificado desde o início do ano e que têm despertado receios dos tempos de guerra entre os residentes locais.

Em abril, milícias não identificadas do sul do Líbano lançaram 'rockets' contra Israel numa aparente retaliação contra operações de Israel na Palestina. Tel Aviv respondeu com 15 mísseis que caíram sobretudo em zonas agrícolas, mas os destroços acertaram na casa de Abdelkhaliq Abdelsattar, enquanto o produtor de laranjas e a sua mulher e sete filhos dormiam.

"Os meus filhos viveram a guerra na Síria mas nunca viram algo assim", contou à Lusa. A poucos metros da casa, uma cratera de vários metros marca o lugar onde o míssil caiu no meio do laranjal.

"Sobrevivemos por milagre", disse.

Recentemente, os confrontos na região intensificaram-se após Israel ter terminado a construção de um muro à volta de Ghajar, uma vila ocupada por forças israelitas, assim como as Chebaa Farms e Kfarchouba, e os Montes Golã, na Síria, em 1967.

Em 2000, as tropas israelitas retiraram do Líbano, exceto na região de Ghajar, até hoje contestada pelos dois países. Em 2000, a "linha azul" - zona tampão desenhada pela missão de paz da ONU na zona fronteiriça (UNIFIL) - dividiu Ghajar em duas partes, deixando a zona norte da vila como território libanês.

Com a construção do muro, Hezbollah e o Estado libanês acusam Israel da anexação total da vila. Em resposta, Israel acusou o Hezbollah de montar tendas na região contestada e ameaçou atacar as estruturas.

Na quarta-feira, Nasrallah acusou a comunidade internacional de permitir Israel terminar a construção de um muro à volta de Ghajar "e tornar a vila numa área turística sob o silêncio das Nações Unidas".

Em comunicado enviado à Lusa, a UNIFIL reiterou que a ocupação do norte de Ghajar constitui uma violação da resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovada no fim da guerra em 2006.

"Apelámos repetidamente a Israel para que pare as suas atividades a norte da linha [azul]", lê-se no comunicado.

No entanto, os ataques e acusações mútuas têm continuado.

Na segunda-feira, o líder da UNIFIL transmitiu a Beirute um pedido israelita para que os libaneses removam as tendas montadas recentemente pelo Hezbollah na área em conflito. Nesse mesmo dia, o exército israelita acusou soldados libaneses de atravessaram a fronteira. 

Em resposta, o Líbano transmitiu à UNIFIL que as duas tendas estão em território Libanês e indicou que Israel deve retirar as suas tropas da parte libanesa da região.

"Eles não podem tirar nem um metro desta terra", disse à agência Lusa um agricultor local que não quis ser identificado. "Eles violam o território, eles ocupam o território, mas esta terra tem donos", disse o agricultor.

A comunidade internacional e em particular a UNIFIL apelam à calma entre as partes mas os avisos não se materializam em ações sancionárias, como o Libano tem pedido. 

No entanto e apesar da recente escalada de violência este tipo de ações retaliatórias entre Israel e Hezbollah têm sido uma constante desde o final não declarado da guerra entre o grupo xiita e Israel, lembrou Heiko Wimmen, diretor de projeto para o Iraque, Síria e Líbano do "Crisis Group", uma organização dedicada à prevenção de conflito.

Wimmen disse à Lusa que a reciprocidade de ataques entre os dois elementos funciona como um método de dissuasão e portanto não há um risco real dos últimos confrontos se transformarem num novo conflito armado.

"Ninguém quer um confronto severo, tanto os israelitas como o Hezbollah sabem que numa guerra a sério, ninguém vai sair vencedor", disse.

"Mas há sempre riscos. Basta que um destes ataques resulte na morte de civis e a situação pode evoluir e tornar-se fora de controlo", admitiu.

Nawal conhece bem o caráter volátil da região. Nascida em Tyre, a maior cidade do sul do Líbano a poucos quilómetros de Israel, Nawal fugiu pela primeira vez em 1979, a meio da guerra civil, para os Estados Unidos, onde vive há 40 anos.

Agora reformada e de férias em Tyre, Nawal diz à agência LUSA que no Líbano é preciso aprender a "esperar o inesperado".

"Não se pode pensar no que pode acontecer porque tudo pode acontecer...Eu gostava que deixasse de acontecer, gostava que mais uma geração não tivesse que sofrer o que nós sofremos", diz.

A casa de Nawal estremeceu em abril deste ano quando os mísseis israelitas explodiram perto da sua rua, em resposta aos 34 'rockets' lançados da região por milícias palestinianas, segundo o exército israelita. Foi a maior escalada de violência desde o final (não-declarado) da guerra entre Hezbollah e Israel.

"Já sabemos que assim que 'rockets' são lançados daqui, [Israel] vai responder. Mas nós sabemos que eles no fundo não querem aumentar isto. Se é disto que se trata, podemos viver assim, desde que ninguém saia ferido", disse.

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