Realizou-se pela primeira vez em Portugal, no Hospital CUF Tejo, a substituição da válvula cardíaca tricúspide por uma prótese feita à exata medida do coração do doente, através de cateterismo cardíaco, um procedimento minimamente invasivo, revela o hospital em comunicado.
A prótese foi construída após um estudo detalhado do coração do doente que necessitava desta intervenção. “A realização de um AngioTAC prévio permitiu estudar minuciosamente os detalhes anatómicos do coração do doente, efetuando-se medições muito precisas das estruturas cardíacas, permitindo desenhar uma prótese única, customizada e adaptada especificamente ao coração deste doente”, explica Ruben Ramos, cardiologista da CUF que liderou a equipa que procedeu a esta intervenção.
O processo de construção da prótese demorou cerca de oito semanas e foi realizado na Alemanha. Já a intervenção, feita sob anestesia geral, pode ler-se em comunicado, "é menos invasiva que a cirurgia convencional - por se tratar de um procedimento percutâneo realizado através duma veia da virilha, a veia femoral, sem recurso a qualquer incisão cirúrgica - requer menos tempo de internamento e possibilita uma recuperação mais rápida". É uma abordagem apropriada para "pessoas com contraindicação cirúrgica ou cujo risco cirúrgico seja considerado elevado".
A técnica de substituição de uma válvula cardíaca por via totalmente percutânea, isto é, através de cateterismo, com próteses estandardizadas já é feita para a válvula aórtica desde 2008 em Portugal. Nos últimos anos tem-se introduzido esta opção terapêutica também para as outras válvulas cardíacas.
A válvula tricúspide "é apelidada, no meio médico, como a válvula esquecida" porque, "habitualmente, é a menos intervencionada”, refere Ruben Ramos. Os motivos são vários, a começar pelo facto de, "durante muitos anos, se ter julgado que a válvula tricúspide era um mero espectador de outras patologias cardíacas, valvulares ou não". No entanto, e sobretudo "na última década, provou-se que a insuficiência valvular tricúspide é um importante preditor de mortalidade nas pessoas com doenças das válvulas mitral e aórtica (as doenças valvulares mais comuns) e nas doenças do músculo cardíaco, o miocárdio", aponta o cardiologista.
Por outro lado, Duarte Cacela, que também liderou a equipa, explica que os sintomas de insuficiência tricúspide "são mais insidiosos no seu aparecimento", levando a um diagnóstico tardio. "Acresce, ainda, o facto da insuficiência tricúspide estar, frequentemente, associada a doença concomitante de outras válvulas ou estruturas cardíacas, cujas manifestações são mais agudas ou exuberantes e que acabam, assim, por receber uma maior atenção médica; e, ainda, o facto de haver um insuficiente aperfeiçoamento das ferramentas de diagnóstico disponíveis para avaliação das estruturas do lado direito coração."
Ruben Ramos justifica que os resultados da cirurgia convencional na válvula tricúspide parecem ser "menos bons que os das outras válvulas" e o próprio risco cirúrgico, em doentes frequentemente muito frágeis e com múltiplas comorbilidades, "pode ser muito alto ou até proibitivo". "Esta última barreira está agora a ser ultrapassada através desta técnica de substituição valvular totalmente percutânea", sublinha.
Estima-se que mais de 85% da população tenha algum grau de insuficiência tricúspide, De acordo com dados citados em comunicado pela CUF. Enquanto graus ligeiros de insuficiência valvular tricúspide são considerados entidades benignas, estados mais avançados (moderada ou grave) estão associados a pior prognóstico. Sintomas como cansaço, inchaço das pernas e/ou barriga, falta de ar, má digestão, vómitos, diarreia, emagrecimento/desnutrição (por má absorção) não podem ser ignorados e requerem avaliação médica, pois são sinais de alerta para esta patologia.
A progressão da doença é influenciada pela idade e género. Em pessoas com mais de 70 anos a prevalência da doença tricúspide moderada e grave atinge cerca de 1,5% nos homens e 5,6% nas mulheres. Duarte Cacela refere que o procedimento realizado "permite oferecer aos doentes portugueses o que de mais avançado e inovador existe a nível mundial, constituindo em Portugal um avanço no tratamento dos doentes com insuficiência tricúspide, melhorando a sua qualidade de vida".
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