"Creio que existem desafios, não dou por garantido o controlo já da inflação. Há vários fatores que podem levar a que a situação volte a agonizar-se e não é certo que a inflação esteja já controlada", disse Nazaré da Costa Cabral, em entrevista à agência Lusa.
A responsável do Conselho das Finanças Públicas (CFP) acredita que o controlo da inflação é o grande desafio macroeconómico.
"Sabemos que a inflação é sempre um mal do ponto de vista económico que acarreta as perdas, nomeadamente para as franjas da população que têm rendimentos mais baixos e, portanto, é evidente que essa tónica tem que estar sempre presente", salienta.
Nazaré da Costa Cabral admite que "há aqueles que perdem mais e aqueles que perdem menos, nomeadamente todos aqueles que têm rendimentos regulares e que porventura não vejam esses rendimentos atualizados em conformidade com a inflação", mas "também há quem acabe por ter algum ganho, nem que seja momentâneo".
"Aliás, o próprio Estado terá sido, porventura, no ano passado, o grande ganhador com a inflação pelas consequências que isso teve na própria cobrança da receita fiscal", considera.
Questionada sobre o investimento público em áreas como saúde e educação, a presidente do CFP sublinha que "os ganhos em termos de consolidação orçamental nos últimos anos também se deveram a opções que levaram a que o investimento acabasse por ser sacrificado".
"Muitas vezes" o investimento executado fica abaixo do previsto no Orçamento, aponta, dando nota de "isso gera problemas em vários setores, não só por força da despesa de capital, mas também por outro tipo de despesa que muitos entendem que deveria ser reforçada, e esses setores sofrem os efeitos desse mesmo desinvestimento".
"E vemos as conflitualidades, as tensões sociais que existem hoje em dia, e isso parece-me inegável", disse.
Por outro lado, alerta para que "há algo" que também tem de "ser pensado, não basta só aumentar a despesa".
"Vemos que a área da saúde nos últimos anos tem assistido a um grande crescimento da despesa. Neste momento, já ocupa cerca de 13% da despesa total do Estado. É uma fatia já muito significativa", realça, antes de salientar que "nem por isso se tem traduzido uma melhoria na prestação do serviço público".
Para a presidente do CFP, "não basta pensar que distribuindo mais verbas, alocando mais despesas e aumentando a despesa, isso por si só acarreta a melhoria do serviço público".
"Não temos instrumentos que sejam capazes de uma adequada priorização da despesa, onde é que o Estado deve estar, onde é que porventura não deve estar ou deve estar menos", alertou.
Segundo Nazaré da Costa Cabral, "faz-se um exercício que só na teoria pode ser chamado de revisão da despesa pública, que não é um verdadeiro exercício de revisão da despesa pública, e isso tem gerado, além das tais ineficiências, redundâncias, gastos supérfluos, duplicação de estruturas da administração pública, e que aliás tendem a crescer e a multiplicar-se".
"Estamos num processo de descentralização de áreas, por exemplo, saúde, educação, ação social. Essa descentralização deveria significar poupança de estruturas, poupança até de recursos. A proximidade supostamente deve gerar eficiência, e aquilo que nós estamos a ver é que não estamos a ter esse efeito de poupança, antes pelo contrário", adverte.
Em detrimento do desejado, "as estruturas da administração central mantêm-se e ao mesmo tempo" criam-se "estruturas da administração local".
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