A peça estrear-se-á, simbolicamente, no adro da Igreja de Nossa Senhora do Populo, nas Caldas da Rainha, onde em 1504 Gil Vicente apresentou o 'Auto de S. Martinho' e onde em 2004 o Teatro da Rainha levou à cena uma verso diferente do mesmo auto.
Desta vez, a proposta do Teatro da Rainha, companhia residente neste concelho do distrito de Leiria, é para levar à cena uma peça em que "passado e presente se cruzam".
De acordo com a sinopse divulgada pela companhia, a peça 'Os Míseros -- Prantos, Lamentos, Loas e Pregões' parte de personagens de Gil Vicente e "atraca numa ilha, desenhada por Henrique Bento Fialho, destapando satiricamente a caixa de Pandora das desgraças universais".
A peça desenvolve-se em dois painéis, no primeiro dos quais entram em cena o Anjo, do 'Auto da História de Deus', anunciando a chegada de Lúcifer, do seu meirinho Belial e de Satanás, fidalgo do seu conselho, todos apostados em destruir a obra de Deus.
Da "luta entre o bem o e mal" fica uma "terra amaldiçoada" em que a morte se transforma em Maria Parda. Ao funeral desta chega João Mortinheira, da "Tragicomédia dos agravados" e ao palco subirá ainda Genebra Pereira, do 'Auto das Fadas', Apariço e Ordonho, de 'Quem tem farelos' e, por fim, o pobre, do 'Auto de S. Martinho', mendigando, e o próprio S. Martinho, a distribuir sopa pelo pobres.
No segundo painel da peça, Martinho "isola-se numa ilha e vive no meio da natureza, de costas voltadas para a civilização", pode ler-se na sinopse, aludindo a parte do espetáculo que, sob o subtítulo 'S.N.S.', aborda "o novo normal".
Martinho, que só queria ter por companhia um livro para ler, é visitado por Caronte, o barqueiro que traz notícias do mundo, como a da humanidade a enfrentar uma pandemia causada por um virus desconhecido.
À ilha chegam ainda duas raparigas mais interessadas nos telemóveis do que nos problemas do mundo e um negacionista que parece contaminar todos os habitantes do local onde não há médicos, nem hospitais.
A peça, que estará em cena até ao dia 23, com apresentações ao ar livre, tem encenação de Fernando Mora Ramos e as interpretações de Beatriz Antunes, Mafalda Taveira, Fábio Costa, João Costa, Nuno Machado e Vítor Sousa.
Henrique Manuel Bento Fialho (1974) é formado em Filosofia. Foi professor, livreiro e trabalha, atualmente, para o Teatro da Rainha, onde programa o ciclo 'Diga 33 --Poesia no Teatro'. Tem vários livros publicados, entre ensaio, poesia e ficção. Estreou-se na escrita para teatro com 'Na cama com Ofélia', espetáculo encenado por Fernando Mora Ramos em 2022.
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