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"Governo, claramente, vai levar um cartão vermelho nas próximas eleições"

Inês Sousa Real, porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), é a convidada do Vozes ao Minuto desta segunda-feira.

"Governo, claramente, vai levar um cartão vermelho nas próximas eleições"
Notícias ao Minuto

04/09/23 por Inês Frade Freire

Política PAN

O flagelo dos incêndios florestais não é um tema de agora. Aliás, em Portugal vai-se repetindo todos os anos, algo que não será alheio às alterações climáticas, que aumentam as condições quentes e secas que potenciam fogos de grande dimensões e que se espalham rapidamente.

Nesse sentido, é necessária uma maior aposta "na prevenção e não apenas naquilo que são apenas as medidas de combate", defendeu a porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) Inês Sousa Real, em conversa com o Notícias ao Minuto.

Na ótica da deputada única, tem-se assistido a "uma total inércia do Estado naquilo que é a reforma florestal, na verificação do cadastro florestal, na aposta nos vigilantes da natureza e na promoção e valorização dos serviços de ecossistemas".

À margem da entrevista e perante a aproximação do arranque da nova legislatura, Inês Sousa Real aproveitou para alertar o Executivo, propondo-lhe uma mudança de postura, sob pena de levar "um cartão vermelho nas próximas eleições".

A porta-voz do partido deu conta ainda dos assuntos que marcarão a agenda do PAN, assinalando a aposta na discussão sobre a atualização dos escalões do IRS das famílias e a importância do combate à violência doméstica, à crise climática e à pobreza energética. 

Há aqui um trabalho de casa por fazer do Governo

Com mais milhares de hectares ardidos este ano e com um relatório elaborado pelo relator para os Direitos Humanos e Meio Ambiente da Organização das Nações Unidas (ONU), David Boyd, a apelar por "mais ação" por parte do Estado português, considera que há uma falta de atenção no que diz respeito à prevenção de incêndios e à aplicação de medidas concretas por parte do Governo?

Efetivamente, o relatório do comissário da ONU que foi enviado para Portugal, no qual foi feita uma análise no seguimento dos incêndios florestais e rurais, sobretudo após o incêndio que ocorreu na Serra da Estrela, é bastante relevante e preocupante. A observação que foi feita faz uma crítica muito severa àquilo que é a aposta na monocultura sobretudo ao nível da floresta. É relatada uma gestão florestal ineficiente no que diz respeito a árvores resinosas como o eucalipto, o pinho, e apela a uma necessidade de um mosaico mais biodiverso, tal como o PAN já tinha vindo a defender.

Também é apontada a importância de reconverter a plantação e valorizar os serviços de ecossistemas - algo que o PAN já propôs no Orçamento do Estado para 2022. De recordar que o PAN conseguiu ver aprovada uma proposta que prevê uma majoração para os projetos de florestação em terras não-agrícolas que incluam o arranque de eucaliptos de crescimento espontâneo nas áreas que foram percorridas por incêndios. 

Trata-se de uma aposta naquilo que é a necessidade de retirar e diminuir a floresta, uma vez que são árvores altamente resinosas e cujo potencial de incêndio é muito elevado. É importante um mosaico mais biodiverso, apostando numa floresta autóctone e não na monocultura. 

Além disso, [o relator] vai mais longe e fala na falta de reparação e de conservação. Isto porque aquilo que verificou no terreno é que as áreas ardidas não têm sido recuperadas como deviam ser. Se olharmos para o caso da Serra da Estrela ou de Pedrógão Grande, no sítio em que se deram os incêndios, as telecomunicações não foram repostas, não há uma reconversão da área ardida noutro tipo de floresta.

Há aqui um trabalho de casa por fazer do Governo, que se agrava quando vemos a crítica neste relatório de que a classificação de alguns projetos ao nível de interesse nacional ou público está a condicionar a tomada de decisão e a própria avaliação ambiental ao nível daquilo que são os pareceres favoráveis.

Este relatório mostra a urgência de se apostar mais na prevenção e não apenas naquilo que são apenas as medidas de combate, por isso, é com preocupação que o PAN olha para este relatório. Verifica-se uma total inércia do Estado naquilo que é a reforma florestal, na verificação do cadastro florestal, na aposta nos vigilantes da natureza, na promoção e valorização dos serviços de ecossistemas.

Maior investimento deve ser naquilo que é o apoio financeiro dado aos projetos para a deseucaliptização

Considera que, muito além de campanhas de sensibilização, devia haver um investimento maior no reforço de meios técnicos e humanos com, por exemplo, mais formação para agentes da proteção civil e bombeiros? 

Além disso e acima de tudo, o maior investimento deve ser naquilo que é o apoio financeiro dado aos projetos para a deseucaliptização - ou seja, reconverter a floresta. Existe uma falta de execução das verbas e da utilização do fundo ambiental para projetos de conservação da natureza por parte do Governo e, depois, por outro lado, da reconversão destes mosaicos e da recuperação das zonas ardidas.

Quando olhamos para o próprio Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), há uma baixa execução, é praticamente inexistente. Depois, quando se olha para o relatório de 2021 do Tribunal de Contas, até se verifica a perversidade de o fundo ambiental financiar quem mais polui e quem mais lucra, e que deveria estar a ser usado para a proteção e conservação da natureza. 

É com muita preocupação que o partido verifica esta falta de execução no país. Aliás, recordo que a medida do PAN, aprovada no Orçamento do Estado para 2022 [arranque de eucaliptos de crescimento espontâneo em zonas onde houve incêndios], ainda está por executar.

Acha que deveriam ser implementadas políticas ambientais mais concretas para fazer face à ameaça que as alterações climáticas apresentam ao combate aos incêndios?

É imperativo que precisamos de proteger este grande consumidor de carbono que é a floresta, prova disso é o facto de a Comissão Europeia já ter anunciado que vai haver um envelope financeiro que vai ascender a 100 mil milhões de euros - incluído já no quadro atual plurianual - para investir na biodiversidade, onde se inclui também o restauro.

No entanto, ao verificar-se que, por outro lado, o dinheiro continua a ir para o eucalipto ou para o pinheiro e haver uma destruição de tudo aquilo que é o sobreiro, o castanheiro - as árvores autóctones - claramente vamos perder esta batalha contra as alterações climáticas e, acima de tudo, contra os grandes incêndios florestais.

Em termos de propagação do incêndio, é muito mais difícil combater um incêndio que tem um grande potencial de combustão com árvores resinosas do que um incêndio com árvores autóctones - que retêm mais humidade no solo e ardem, por isso, de forma mais lenta.

A proposta do partido para a promoção do restauro ecológico [Programa Nacional de Deseucaliptização], que parecia da mais elementar urgência, foi rejeitada. Foi conseguido, no entanto, aprovar um grupo de trabalho no âmbito da Assembleia da República. Mas não chega, é preciso ir mais longe. 

É preciso implementar essa medida que foi rejeitada, é preciso que o Governo, de uma vez por todas, execute a proposta para o arranque e controlo de eucaliptos de crescimento espontâneo em zonas onde houve incêndios, sob pena de continuarmos a apostar de forma errada naquilo que é uma gestão da floresta.

Por algum motivo, na campanha na Madeira, o PAN comprometeu-se em plantar uma árvore por cada voto obtido, porque é necessário, com urgência, um compromisso para com a plantação de árvores autóctones, da proteção da floresta e dos poucos habitats e ecossistemas em Portugal. Esse investimento não tem sido feito e o Governo tem falhado aqui redondamente.

Há que prevenir plantando, vigiando a floresta e criando mecanismos

Tendo em conta que todos os anos há grandes incêndios em Portugal, acha que a fiscalização florestal e a moldura penal para os incendiários não estão a ser executadas como deveriam?

Sim, acho que deveria haver, aliás, uma aposta em medidas cautelares. Longe de qualquer narrativa populista, há, do ponto de vista percentual, uma faixa dos incendiários que se indiciam por incêndios e, por isso, é importante que se adeque, não tanto a moldura penal, mas sobretudo as medidas preventivas e cautelares do ponto de vista penal.

Efetivamente, se falamos de pessoas que estão identificadas, e estando agora a decorrer uma revisão constitucional, são necessárias medidas cautelares em relação àquilo que são os fenómenos decorrentes dos incêndios provocados por incendiários.

Aliás, o PAN apresentou várias medidas que visam garantir um direito a um clima estável e densificar aquilo que é o conceito de proteção ambiental para que, depois, do ponto de vista penal, se possa acompanhar e não haver dúvidas de constitucionalidade em relação a algumas medidas.

No entanto, esse não é o único fator, uma vez que há fenómenos aliados como a monocultura, a seca extrema que o país continua a atravessar e as ondas de calor em algumas regiões - como Évora, Beja, Viseu, Guarda. Ainda agora em Nelas (Viseu) tivemos os incêndios novamente a atingir a população.

É necessário olhar para o ordenamento do território com uma outra visão e aliar depois as políticas também dessa forma. Só haver uma aposta naquilo que são as políticas preventivas em relação aos incêndios provocados pelos incendiários não é suficiente.

É preciso ainda adaptar a floresta e prevenir e combater aquilo que possam ser os efeitos extremos das alterações climáticas. Quando há uma vasta área de eucalipto, o solo é empobrecido, não consegue reter a umidade e, com isso, vai aumentar o nível de calor e as ondas de calor, tornando muito mais difícil o combate aos incêndios.

O PAN teve o cuidado de reunir, quer com a Liga dos Bombeiros Portugueses, quer com os vários agentes que estiveram a intervir no incêndio na Serra da Estrela no ano passado - bombeiros, proteção civil, juntas de freguesia, movimentos associativos - e todos eles são unânimes em dizer que tem de haver uma interrupção do que é a monocultura. Portugal não pode ter quilómetros de floresta que é de eucalipto ou de pinho porque senão não vai ser possível fazer um combate aos grandes incêndios.

A dimensão penal é importante com uma maior prevenção e com medidas cautelares mas também há que prevenir plantando, vigiando a floresta e criando mecanismos. O país precisa de vigilantes da natureza, não só para garantir que os caçadores são fiscalizados, mas também que os incendiários são fiscalizados, controlados e detetados mais celeremente.

Por mais que se queira olhar só para a dimensão penal, há aqui uma dimensão em que o PAN tem insistido, que é o crime do ecocídio. O ecocídio tem, dentro daquela que é a sua dimensão, a responsabilidade política pela inação ou então por aquilo que são decisões políticas que permitem a destruição do património natural para as gerações futuras - e que também contribuem para os grandes incêndios.

Cada vez que se perdem florestas, perdem-se espécies e muitas delas ameaçadas de extinção, tal como foi apontado no relatório do comissário da ONU, que realça a necessidade da preservação da biodiversidade.

Tem de haver um plano para que os animais não sofram nestas circunstâncias

O PAN defendeu já, após o incêndio em Cascais - que levou à evacuação de um canil -, a criação de um plano de retirada de animais em situações de risco. O que é que o partido vai propor para que esse plano seja desenvolvido?

O partido já deu entrada, não só nesta legislatura, como em legislaturas anteriores, de uma iniciativa precisamente para garantir a inclusão de animais de um plano setorial para a proteção animal no Plano Nacional de Emergência de Proteção Civil.

O Governo, na sua teimosia da maioria absoluta, continua a fechar-se na sua bolha e a rejeitar este tipo de iniciativas. A verdade é que, apesar de ao nível da proteção civil estar previsto que todos os seres devem ser resgatados, não existe depois um plano setorial estratégico que permita uma articulação entre as várias autoridades que estão no terreno e quem tem a capacidade da retirada destes animais. 

Foi dada entrada de uma iniciativa que visa também obrigar todos os alojamentos, tenham ou não fins lucrativos, a ter os planos de proteção civil e de retirada dos animais e que, no caso das associações de proteção animal, o Estado crie uma linha de apoio para a adaptação dos alojamentos.

Isto porque o que se verificou em Cascais é que quem forneceu as transportadoras para os animais foram as associações, foi quem foi ao local com mais de 100 transportadoras. Eu própria cheguei a estar no terreno a acompanhar as associações e verificar in loco a dificuldade que estava a ser tida.

Outras das propostas do PAN é que a recusa por parte de qualquer particular ou entidade do acesso das autoridades para a retirada dos animais - tal como se verificou em Cascais por parte de hotéis caninos - constitua crime de desobediência e, como tal, possa ser dada, de imediato, a ordem de prisão e proceder-se à evacuação.

É inadmissível que em pleno século XXI se corra sequer o risco de outros episódios como Santo Tirso - em que morreram mais de 70 animais carbonizados por força da recusa das responsáveis por um estabelecimento particular em retirar os animais - ou então até mesmo nas cheias que Algés, Loures, e outras zonas da Área Metropolitana de Lisboa tiveram este ano - em que os animais morreram afogados por estarem acorrentados.

É fundamental que o Estado crie este plano para que depois, nos vários níveis de intervenção - seja municipal, seja supramunicipal ou nacional - possa haver esta articulação entre as autoridades veterinárias concelhias para que depois possa ser canalizada nos animais. Também é necessário dotar de meios alguns locais estratégicos, tal como é feito nos demais sistemas de evacuação.

Para isso é preciso identificar onde é que existem alojamentos, se cada alojamento tem o seu sistema de deteção e proteção contra os incêndios e capacidade de evacuação. Se toda a sociedade fizer a sua parte, os animais não ficarão para trás e, sobretudo, a morrer numa profunda agonia.

Nesse sentido, tem de haver um plano para que, efetivamente, os animais não sofram nestas circunstâncias e que haja alguém responsável por adotar medidas de urgência e tomar decisões - nomeadamente o médico veterinário responsável - para evitar que os animais morram todos carbonizados.

O humor e a arte são muitas vezes aliados do progresso civilizacional

Agora gostava de a questionar sobre dois temas que me parecem pertinentes. Após o artista plástico português Bordalo II ter pintado de vermelho os símbolos de tourada nas sinaléticas do Campo Pequeno há duas semanas (que já tinham sido retirados em 2019) como vê esta intervenção?

O PAN reagiu de imediato àquilo que foi a recolocação das placas com a sinalética alusiva às touradas no Campo Pequeno, na cidade de Lisboa, considerando que é um retrocesso face aquela que foi a decisão tomada em 2019, precisamente por força do diálogo e da negociação do partido com o anterior executivo. 

Não se deve esquecer que os lisboetas, naquelas que são as sondagens da Universidade Católica Portuguesa, já mostraram que não concordam com quaisquer apoios públicos às touradas, mais de 90% consideraram que aquele espaço [Campo Pequeno] deve ser utilizado para outras finalidades e, de facto, há um número muito significativo que entendeu até que as touradas devem acabar na cidade de Lisboa. 

Nesse sentido, e não só tendo em conta aquilo que é o sentir da população lisboeta, mas também tendo em conta este retrocesso por parte do executivo de Carlos Moedas, o PAN contactou de imediato a Câmara Municipal solicitando esclarecimentos. Aquilo que foi transmitido é que iria ser apurado o sucedido porque tinham a indicação que não tinha sido dada nenhuma ordem para aquele serviço.

O PAN já apelou diretamente ao presidente da Câmara Municipal, Carlos Moedas, que reponha as anteriores placas e que garanta que Lisboa, que tem inclusivamente um provedor do animal - que lamentavelmente ainda não se pronunciou sobre este assunto - seja uma cidade de respeito e de compromisso para com o bem-estar animal, que não se coaduna com o apoiar a tauromaquia ou tão pouco fazer da tauromaquia um cartão de visita a quem a visita, nomeadamente a população estrangeira.

Nesse sentido, é fundamental para o PAN não só a remoção das placas mas a reposição das anteriores.

Em relação àquela que foi a ação de Bordalo II, quer o humor quer a arte são muitas vezes aliados do progresso civilizacional e, portanto, veio demonstrar aquilo que é o sentir social relativamente a esta atividade.

Alguns tentam elevá-la a espetáculo cultural, mas que não deve ter lugar em pleno século XXI, considerando os valores éticos e morais que os devem reger, incluindo os de evitar todo e qualquer sofrimento aos animais.

Além disso, é lamentável que precisamente depois de Lisboa ter recebido o Papa Francisco, que na sua encíclica Laudato Si condena os maus tratos aos animais, dizendo que é contrário à dignidade humana causar sofrimento inútil aos animais, assim que o mesmo se tenha ausentado da cidade, estas placas tenham sido colocadas.

O que se espera é que a cidade volte a ser a Lisboa amiga e de respeito pelos animais. Da parte do PAN, continua disponível para trabalhar e dialogar com o executivo e garantir não só que são repostas as placas mas também transmitir outras preocupações.

O partido terá todo o gosto em acompanhar Carlos Moedas no dia em que as placas forem repostas na cidade e removido aquele elemento alusivo à tauromaquia.

É sintomático daquilo que tem sido o papel da mulher na sociedade

E no âmbito das próximas eleições regionais da Madeira, Mónica Freitas é a única mulher como cabeça-de-lista. O que significa para o partido esta representatividade? 

Estarmos perante a única cabeça-de-lista que é mulher nas eleições regionais da Madeira é sintomático daquilo que tem sido o papel da mulher na sociedade.

As mulheres sistematicamente são remetidas para a esfera da vida privada em que os cargos de poder e de chefia não são destinados às mulheres e mesmo os cargos em que os partidos podem eleger, não optam por colocar mulheres como cabeça-de-lista.

Portanto, é com muita tristeza que se verifica que nas eleições regionais da Madeira só existe uma mulher a concorrer, mas também é com muito orgulho que se assume como uma alternativa na Madeira.

Quando temos uma mulher a poder dar voz não só às mulheres e aos jovens, como às preocupações dos madeirenses, há uma opção de escolha alternativa para a Madeira, diferente de todos os demais partidos. 

Acredito que esse voto de confiança se traduzirá não só numa maior confiança dos eleitores no PAN, mas também naquilo que é o papel e o caminho a fazer em matéria de igualdade de género. O fosso que temos é de mais de 100 anos para mitigarmos e chegarmos à igualdade.

Mesmo no parlamento nacional tem-se visto um retroceder no número de deputadas presentes e, portanto, no próximo dia 24 de setembro, aquilo que o PAN espera é levar a Mónica Freitas ao parlamento regional. Certamente que todos os votos dos madeirenses irão contar e o voto no PAN é um voto que faz a diferença.

Com o aproximar do arranque do novo ano parlamentar, quais são as expectativas do partido para as eleições Europeias de 2024?

Sobre as expectativas para as Europeias em 2024, o que posso dizer é que o PAN tem um projeto único, distinto das demais forças políticas, que quer levar à Europa. 

O que o partido pretende é trabalhar para reforçar a sua representação.

O foco será priorizar aquilo que são as problemáticas que o país hoje em dia atravessa

Qual vai ser o foco da agenda do partido e com que propostas pretende marcar a discussão?

Vai ser um ano bastante peculiar porque saímos de uma pandemia e estamos a viver uma guerra que provocou uma crise socioeconómica sem precedentes e, como tal, é fundamental que no próximo Orçamento do Estado - que vai começar a ser discutido agora no arranque desta sessão legislativa - haja uma atualização dos escalões do IRS das famílias para que possa haver um verdadeiro alívio.

O que se verifica é que as famílias não conseguem pagar os encargos com a habitação por força dos juros que aumentaram 300, 400 e até 500 euros, ou do aumento das rendas, ou do aumento do custo de vida e da alimentação quer das famílias, quer dos animais que integram o agregado familiar. É fundamental que haja uma atualização à taxa da inflação.

Por outro lado, e ainda dentro daquilo que é a componente fiscal, o PAN vai bater-se para que o IVA dos serviços médico-veterinários e da alimentação dos animais seja reduzido. Não faz qualquer sentido que a alimentação de um animal de companhia continue a ser taxada a 23% - como se fosse um bem de luxo - e que não seja feito absolutamente nada por parte do Estado para esta redução, ou tão pouco para acompanhar medidas como a que o partido propôs para que seja, pelo menos, criada uma linha de devolução do IVA às associações de proteção animal.

Depois é necessário noutras áreas, em particular no combate à crise climática, fazer uma aposta mais séria no combate à pobreza energética. O PAN tinha feito uma recomendação ao Governo para a criação do programa ‘Sol para todos’ - que foi aprovada - com vista a viabilizar a transmissão de excedentes de energia de forma solidária para famílias vulneráveis. 

A instalação de painéis fotovoltaicos e a transição para uma economia verde deve ser feita através dos telhados dos parques já existentes - dos parques de estacionamento, dos edifícios públicos - de forma a poder potenciar-se a distribuição de energia para quem vive em situação de pobreza energética - e tornando mais eficaz este tipo de apostas naquilo que tem de ser um processo de transição. Não pode é ser à conta da destruição de património natural.

Sem dúvida nenhuma também que este inverno vai ter de servir para preparar o combate aos incêndios para o próximo ano através dos programas de deseucaliptização - essa será também uma prioridade para nós.

Há graves problemas do ponto de vista social, ambiental e até de proteção dos direitos humanos, sociais e de proteção animal e, portanto, o foco será priorizar aquilo que são as problemáticas que o país hoje em dia atravessa. 

Isto a par do desafio democrático que estamos a assistir com uma degradação das democracias. Aliás, há 18 meses que se iniciou a guerra na Ucrânia e, portanto, sabemos a ameaça que há nos vários Estados. Terá de haver medidas mais robustas para se dar resposta ao momento que vivemos - que é extremamente complexo.

Além das propostas que apresenta, que outros temas pretende ver abordados e alvo de debate na Assembleia da República?

O PAN, felizmente, com a Revisão do Regimento do Parlamento, já vai ter a possibilidade de fazer agendamentos nesta sessão legislativa e marcar a agenda - ainda que pouco, uma vez que vamos ter apenas quatro agendamentos por sessão legislativa.

Há algumas matérias que têm ficado para trás, nomeadamente no que diz respeito à violência doméstica e igualdade de género, que o partido não deixará de insistir com a introdução das quotas para o Tribunal Constitucional e o Conselho de Estado.

Continua a haver cifras negras na violência doméstica e no abuso infantil. Aliás, o caso de Jéssica, de três anos, de Setúbal, que morreu devido a maus-tratos, chocou o país e demonstrou que é preciso uma reforma na forma como as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens trabalham e como são protegidas as crianças da violência no país. Está a falhar-se em grande dimensão nessa medida.

Também a questão do direito ao luto pela morte de um animal de companhia, para que as pessoas possam faltar justificadamente ao trabalho. De facto, há um laço social e emocional que está aqui a ser desconsiderado pelo legislador.

Além disso, como já referi, vai ter de ser feito um debate sério sobre a transição energética e justa para potenciar uma economia verde no país. A economia verde tem um potencial de empregabilidade muito elevado, ao contrário daquilo que se possa pensar, não é inimiga do progresso, muito pelo contrário. Aposta num desenvolvimento verdadeiramente justo e sustentável, numa justiça social e ambiental. Portanto, há um debate que o PAN entende que deve ser feito.

Também pretende defender os direitos das próximas gerações, nomeadamente a um clima estável. É importante que se conclua, o quanto antes, o processo de revisão social e que não seja atrasado porque vai não só permitir pela primeira vez consagrar a proteção animal na lei fundamental, mas também reconhecer alguns direitos das próximas gerações.

O PAN querer ver discutido e alargado, evidentemente, a proteção penal a todos os animais e não apenas aos animais de companhia. É um passo, uma vez que a vizinha Espanha já pune os crimes contra todos os animais e não apenas contra os animais de companhia.

Há debate que ainda tem de ser feito em várias dimensões, quer ambiental, quer na igualdade de género, quer na proteção animal, e o PAN cá estará para promovê-lo.

Podia chamar-se a este programa, ao invés de mais habitação, mais ilusão

Sobre o veto presidencial ao programa Mais Habitação, o que acha desta decisão? E quais seriam as propostas do PAN para melhorá-lo?

A decisão era mais do que esperada. Só o Partido Socialista (PS) é que, na sua teimosia, ficou fechado na sua bolha da maioria absoluta porque podia chamar-se a este programa, ao invés de mais habitação, mais ilusão. As medidas que são propostas [no programa] deixam dúvidas de inconstitucionalidade como é o caso do arrendamento forçado ou, até mesmo, da taxa extraordinária que foi criada sobre o alojamento local e que, no entender do partido, parece absolutamente desproporcional.

O PAN, na altura em que foi elaborado [o programa], tinha proposto que ao invés de se taxar o alojamento local se taxassem as unidades hoteleiras e os fundos de investimento. 

Não faz qualquer sentido que haja um pacote por parte do Governo que deixa de fora verdadeiros apoios às famílias. O PAN tinha alertado para a necessidade, não só da proporcionalidade destas medidas mas também de alargarmos os apoios existentes a mais beneficiários. A classe média está, neste momento, a ser asfixiada e, se essa classe do nosso país desaparecer e tivermos um fosso cada vez maior entre os mais pobres e os mais ricos, isso vai pôr em causa a economia.

Por outro o lado, o partido tinha, no pacote de medidas apresentadas - a única aprovada  - o alargamento da isenção do IMI de três para cinco anos - mas, com este veto, ficou adiada precisamente pela irrazoabilidade de haver depois medidas que vão além daquilo que era proporcional.

Mesmo em relação ao parque público - e o PAN considera que é fundamental a existência - é sabido que vai demorar a ser construído e o alojamento estudantil idem. O Governo não pode estar a pedir aos particulares algo que ele próprio não pratica, que coloquem no mercado de arrendamento as suas casas quando o Governo tem um vasto património público que não está a ser inventariado e não está a ser disponibilizado quer para o arrendamento acessível, quer para o alojamento estudantil acessível.

Além disso, poder deduzir os juros com o crédito à habitação no IRS é algo de mais elementar justiça, porque é uma despesa que as famílias têm e que não estão a poder deduzir naquilo que são os seus encargos familiares.

Também no que diz respeito ao arrendamento, é preciso encontrar mais apoios e tornar o programa mais atrativo, quer no apoio ao arrendamento jovem quer para os próprios senhorios colocarem as casas no arrendamento. Isto porque muitas vezes os benefícios fiscais não são suficientes, pelo contrário, acaba por haver uma carga fiscal demasiado excessiva.

Portanto, este programa, de facto, é mais ilusão e menos habitação. O direito à habitação é um direito fundamental, a crise habitacional que se vive no nosso país está a empurrar cada vez mais pessoas não só para a pobreza mas também para situações em que se tornam sem abrigo na rua. Há pessoas que trabalham e que não têm uma casa onde viver, que estão a viver em barracas.

Comprometemo-nos na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável que iriam ser erradicadas as barracas no nosso país e isso parece que ainda está longe no horizonte de acontecer. 

Portanto, o veto presidencial era mais do que expectável. Da parte do PAN, vai novamente insistir e procurar dialogar com o Governo para que se alterem ainda algumas medidas, que se acolham outras das que foram propostas, para que, de facto, seja um programa mais justo e mais próximo das reais necessidades das famílias. 

Além disso, espera-se - uma vez que se tem ouvido até aqui o PS dizer que não vai mudar nada no programa - que dê um passo atrás e não tenha o orgulho de não saber ouvir, acima de tudo, os portugueses. 

Os portugueses estão a passar por muitas dificuldades e precisam de respostas urgentes, não é daqui a uns anos, não é quando a crise existir. De recordar que quando foi a crise inflacionária, o Governo também teve uma postura excessivamente otimista a dizer que não ia atingir Portugal e só um ano depois é que implementou as medidas para que outros partidos já tinham vindo a alertar.

Neste momento, quer com a inflação, quer com o aumento das taxas de juros, quem está, de facto, a encher os cofres, são os bancos e o próprio Estado, que está a arrecadar muitos milhares de milhões de euros em impostos - que não eram uma receita sequer prevista. Portanto, é necessário mudar a carga fiscal e conseguir-se um programa Mais Habitação mais justo.

O Executivo tem de mudar de postura porque vai levar um cartão vermelho nas próximas eleições

Como é que tem visto o desempenho do Governo? Acredita que o Executivo cumprirá o mandato até ao fim?

O PAN tem a plena consciência que se o Governo não tivesse sido dissolvido há tão pouco tempo - em 2021 houve eleições antecipadas -, tendo em conta todos os casos e casinhos que surgiram e que minam a confiança nas instituições e a credibilidade das instituições públicas e políticas - seja por alegados casos de corrupção, seja pelo caso que assistimos em relação à companhia aérea TAP que envolveu o ministro das Infraestruturas João Galamba - os portugueses iriam estar a exigir, neste momento, que o país fosse às urnas.

De facto, depois, alia-se a circunstância infeliz de ter-se estado mais de seis meses com o país a ser gerido em duodécimos devido às eleições antecipadas e um Orçamento do Estado tardiamente aprovado. O PAN até foi das forças políticas da oposição que teve a responsabilidade de se abster e dar uma oportunidade para o Orçamento do Estado ir à especialidade para que as famílias não ficassem sem respostas nem soluções.

E, neste momento, apesar de o PAN não se nortear por sondagens, a verdade é que o que indicam é que, se houvesse eleições, o PAN teria novamente um grupo parlamentar. No entanto, seria profundamente injusto para os portugueses mais meio ano de gestão em duodécimos para haver eleições, para uma nova discussão do Orçamento do Estado. No meio de tudo isto, era um ano perdido na totalidade para a execução do PRR e são fundos comunitários que o país não se pode dar ao luxo de desperdiçar.

Aquilo que o PAN sempre defendeu é que o Governo tinha de ter uma reforma estrutural e profunda, e que o primeiro-ministro, António Costa, deveria ter pedido ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para formar um novo Governo e fazer alterações ao nível governamental.

Com a alteração do Regimento da Assembleia da República, voltaram os debates quinzenais. Agora é perceber se há uma maior aproximação ao diálogo e se, a maioria absoluta - que em plena campanha eleitoral prometeu por diversas vezes que iria ser uma maioria dialogante - vai cumprir com o compromisso que fez aos portugueses. 

Da parte do PAN, tem sido honrado o compromisso para com os portugueses, têm sido colocadas sempre em primeiro lugar as causas defendidas e as preocupações reais e efetivas do país. Da parte do Governo, isso não tem acontecido. O diálogo tem sido muito pouco e, de facto, muito aquém daquilo que tem sido prometido e, acima de tudo, que o país precisa e mais do que a própria maioria precisa. 

O partido contribuirá sempre de forma positiva e crítica ao Governo, mas sempre apresentando soluções de forma construtiva com alternativas. Agora o Executivo tem de mudar de postura porque, claramente, na ótica do PAN, vai levar um cartão vermelho nas próximas eleições.

É muito desafiante para nós mulheres estarmos na política

Após ter sido reeleita porta-voz do PAN, em maio, que balanço faz do primeiro mandato à frente do partido?

Foram dois anos bastante atribulados, seja por força da pandemia, seja por força desta antecipação do ato eleitoral, até porque, também, de alguma forma, fui a quinta mulher em Portugal a ser eleita líder de um partido em todos estes anos de democracia.

É muito desafiante para nós mulheres estarmos na política e liderarmos partidos porque somos frequentemente mais questionadas e temos de dar mais provas daquilo que valemos.

No entanto, apesar dos anos conturbados que aconteceram durante este mandato, dos atos eleitorais que foram atravessados e a pandemia, tem sido muito gratificante não só poder representar causas em que acredito. Vindo do ativismo, poder dar voz a todas estas preocupações é uma grande honra e um grande privilégio.

Aliás, por sentir que o trabalho não estava acabado e que havia ainda muito para fazer, é que eu e a minha equipa nos recandidatámos. 

O PAN é realmente um projeto alternativo na sociedade que faz muita falta porque é necessário ter uma força ambientalista, que traga a agenda dos animais para a sociedade e para o Parlamento porque estavam atirados para segundo plano. 

O partido já mostrou que faz a diferença, por exemplo, pela aprovação das iniciativas. Fomos o partido da oposição que mais iniciativas apresentou e aprovou. Regra geral os números só são contabilizados tendo em conta os projetos de lei, esquecendo-se dos projetos de resolução que muitas vezes o Governo acolhe.

Quando olhamos e vemos o rácio de uma deputada única em relação a todos os demais deputados, de facto o PAN é aquele que mais tem aprovado e que inclusivamente mais tem contribuído para a descida da carga fiscal dos portugueses. Foi assim com a alimentação vegetal, foi assim com a descida do IVA em painéis fotovoltaicos, ou do IVA para a aquisição de bicicletas. 

Portanto, posso orgulhar-me deste mandato por o partido ter conseguido fazer a diferença num tempo muito complexo como o que o país e a Europa vivem em que temos visto crescer forças populistas que têm tido alguma dificuldade em trazer o tema ambiental para a agenda política.

O PAN tem continuado a fazer a diferença, tem alterado medidas muito importantes - como o fim de estágios não remunerados para os mais jovens, o aumento de prazo de prescrição dos crimes sexuais, a valorização dos bombeiros, entre outras.

Apesar de todo o momento complexo e das dificuldades que se enfrenta sempre, seja no contexto político seja por sermos mulheres na política, é muito gratificante e o balanço é positivo.

O PAN gostaria de fazer mais e melhor pelos portugueses, não vai baixar os braços para conseguir isso, mas sempre com uma política de proximidade quer do ponto de vista com a população e com as causas, quer do ponto de vista interno.

Foi criada uma juventude, que foi oficializada neste último congresso, está a ser promovida a criação de mais bases, mais distritais, foi criado um conselho consultivo. Portanto, o partido está a procurar ter uma democracia mais participativa e aberta, quer dentro do partido, quer fora do partido, uma vez que a aproximação dos cidadãos à política e à vida pública é absolutamente imprescindível para uma democracia mais saudável.

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