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"Falar da morte continua a ser tabu. Julgamos que não nos vai acontecer"

A entrevistada de hoje do Vozes ao Minuto é Mariana Abranches Pinto, presidente da associação Compassio.

"Falar da morte continua a ser tabu. Julgamos que não nos vai acontecer"
Notícias ao Minuto

22/11/22 por Natacha Nunes Costa

País Compassio

Mariana Abranches Pinto é presidente da Compassio, uma associação, sem fins lucrativos, que pretende construir comunidades mais compassivas, e é hoje a entrevistada do Vozes ao Minuto.

Numa conversa quase informal, Mariana conta-nos, por Zoom, que a sua missão como responsável da Compassio é fomentar a compaixão na nossa sociedade, seja ela pelos outros ou por nós próprios. Incumbiu-se de trazer para a atualidade um pouco do que havia antigamente, nas aldeias, onde a vizinhança servia de rede de apoio àqueles que não tinham familiares ou quem deles cuidasse.

A associação que tem a cargo trabalha nas áreas do cuidar, da doença, do envelhecimento, do isolamento social e da solidão. Ajuda quem está em luto e apoia quem está no fim de vida. Mostra que vale a pena viver com intensidade, mesmo com um diagnóstico de doença terminal, que não é egoísmo cuidar de nós próprios e que devemos escutar o outro e respeitar a sua dor, sem a pressa, impingida pelo mundo atual, de que a ultrapasse rapidamente.

Entre os vários projetos e iniciativas lançados pela Compassio, destacam-se os Death Cafe, onde se fala de morte enquanto se bebe um café e come-se um bolo; o mural ‘Antes de morrer, eu quero’, que nos faz refletir sobre a finitude da vida; e o ‘Casa’, um grupo comunitário de partilha para pessoas em processo de luto.

Durante a entrevista, Mariana, que tem um cancro da mama e uma filha em Cuidados Paliativos, fala-nos ainda do poder da espiritualidade, da serenidade, da paciência, do silêncio e do amor. Sempre com a palavra compaixão debaixo da língua. Nota-se-lhe a persistência, também nos gestos e no olhar. Um finca-pé com a morte. Até que ela chegue, a sua cartada preferida será sempre "sentir que a vida está completa".

A Compassio é relativamente recente, nasceu em 2019, mas já ajudou muitas pessoas. Para quem não conhece, qual é a missão desta associação?

Somos uma associação sem fins lucrativos que tem como missão colocar a compaixão no centro das relações humanas e das comunidades, com foco nas pessoas em situação de fragilidade, relacionada com a doença, solidão ou isolamento social, promovendo a ética do cuidar como um compromisso fundamental na sociedade. Chamamo-nos Compassio, associação para a construção de comunidades compassivas e estamos integrados num movimento internacional que são as Comunidades e Cidades Compassivas, que têm muito a ver com os Cuidados Paliativos, com temas ligados ao envelhecimento, às doenças graves, às doenças avançadas, ao morrer, à morte.

Basicamente, este movimento tenta recriar o que havia antigamente nas aldeias, onde ninguém morria sozinho 

E qual o objetivo desse movimento internacional?

As Comunidades e Cidades Compassivas surgiram há uns anos para por as pessoas a falarem mais sobre estes temas e para as tornar mais capacitadas em cuidar melhor e de uma forma mais compassiva. O objetivo é que as pessoas se envolvam mais no cuidado dos que estão a passar por estas situações pelas quais, na verdade, qualquer um de nós vai passar, de uma forma ou de outra. Basicamente, este movimento tenta recriar o que havia antigamente nas aldeias, onde ninguém morria sozinho.

Os vizinhos mobilizavam-se, levavam comida, as portas estavam até abertas, às vezes, para acompanhar pessoas que estavam sozinhas e ver como é que estavam as pessoas acamadas. Não é o voltar ao antigamente, porque é impossível, mas é colocar as pessoas a pensar, a refletir sobre estes temas, que ainda são tabu.

O movimento acenta em vários eixos, mas o principal é sensibilizar e capacitar as pessoas para a compaixão, daí o o nome Compassio. Qual a importância deste sentimento para o movimento?

É necessário ter compaixão, cuidado e auto-compaixão para sabermos cuidar de uma forma mais compassiva e para deixarmos que cuidem de nós.  Ter, por exemplo, uma escuta mais compassiva. Não dizer frases feitas a uma pessoa que está doente ou que o pai está doente, como por exemplo: 'Não penses mais nisso'. Evitar essa fuga ao sofrimento típico da nossa sociedade. Compaixão é ter a profunda consciência do sofrimento do outro, também pode ser do próprio, e fazer algo para o aliviar.

Na Compassio dizemos que compaixão é coração, porque é empatia, é cabeça porque é preciso inteligência para perceber o que é preciso fazer para ajudar,  é ação, senão fica só na empatia, e é músculo, porque treina-se, ou seja, quanto mais compassivos formos mais compassivos seremos e mais os outros serão, gera-se uma cadeia de compaixão. Daí a importância desta palavra.

É necessário deixar a pessoa expressar-se, dizer o que pensa, usar mais o silêncio, ouvir em vez de falar tanto, seguir o que a pessoa diz 

Isso quer dizer que tentam não só ajudar as pessoas que estão a passar por uma doença terminal, na reta final da vida ou de luto, como a sociedade em geral...

Sim, a sociedade em geral. Os workshops que a Compassio promove também são para nós. Todos precisamos, não nascemos ensinados. Desde pequeninos que somos ensinados, na nossa sociedade atual, ao ‘está tudo bem’ e a afastar o sofrimento. Tentamos capacitar as pessoas para aguentarem isto, para serem mais resilientes e para acompanhar melhor os outros. Usamos frases feitas, como por exemplo, quando alguém está doente. ‘Não penses nisso’ ou ‘Vai passar’. Não! É necessário deixar a pessoa expressar-se, dizer o que pensa, usar mais o silêncio, ouvir em vez de falar tanto, seguir o que a pessoa diz. Há pessoas que dizem: ‘Não vou visitar aquela pessoa porque não sei o que dizer’. Isso também está errado! É abandonar! Por isso é importante capacitar-nos a todos para cuidar melhor uns dos outros, com um foco neste tempo de doença, morte, fim de vida, luto.

Além da compaixão, quais são os outros eixos pelos quais a Compassio se regula?

A ativação e dinamização de redes comunitárias compassivas, de cuidado compassivo. Estamos a trabalhar, por exemplo, com pessoas com doença avançada, que estão com uma rede social enfraquecida à sua volta. Vamos tentar ativar os vizinhos, as pessoas de proximidade para ajudar essa pessoa. Além disso, temos um terceiro eixo, que são os grupos de partilha, que nós chamamos os grupos Casa e que são grupos de partilha para pessoas em processo de luto ou pessoas com doença grave ou crónica. O objetivo é muito a sanação, um caminhar para aceitar a situação, seja ela qual for, e vivê-la o melhor possível e isso tem imenso sentido. Estamos agora com um grupo de luto, que vai fazer sete sessões seguidas e faz realmente grande sentido. A partilha de pessoas que estão a passar pelo mesmo, que é único, absolutamente singular, o de cada um, mas uma pessoa que está a passar por uma situação destas escuta muito melhor o outro que também está a passar por aquilo. A partilha é salvadora.

Daí terem criado o Porto Compassivo?

O Porto Compassivo é uma comunidade que cuida até ao fim. Somos os promotores desse projeto que, no fundo, pretende capacitar e sensibilizar a população do Porto em geral para um cuidado mais compassivo e para abordar estes temas, que são tabu, como morrer, a morte, o luto. Queremos ativar e dinamizar redes de vizinhança. Depois, dentro do Porto Compassivo, temos agora os Vizinhos Compassivos, que é centrado na União de Freguesias de Aldoar, Nevogilde e Foz do Douro, que tem um orçamento para este tipo de coisas e aí é que estamos mesmo num território mais pequeno a tentar experimentar esse modelo das redes compassivas. Neste momento somos duas pessoas na equipa, eu e a Patrícia Galião, que é mobilizadora comunitária, e estamos a avançar com isso. Estamos com muito entusiasmo.

E como é a adesão a este tipo de projetos?

Nós ficamos muito impressionados porque nunca pensamos que as pessoas aderissem tanto. O último workshop que fizemos chamava-se 'Os cinco arrependimentos de quem está a morrer', que é baseado num livro. Era online, mas estavam 200 pessoas inscritas e tínhamos 89 presentes. Há muito tempo que não tínhamos uma coisa assim com tantas pessoas. Por isso a adesão é grande.

E a adesão vem mais de pessoas que estão a passar por estas situações ou a sociedade já começa a estar mais sensibilizada para estes temas?

Da sociedade em geral, mas claro que pessoas que passam por isto na pele estão mais atentas. Todas as pessoas que têm pais mais envelhecidos, tios, ou avós, têm mais atenção a estas problemáticas e ainda bem. Por exemplo, os Death Cafes, outra das nossas atividades, é um movimento internacional para combater o tabu da morte. É espetacular ver que ninguém fala sobre este tema em casa, mas as pessoas estão ali, não se conhecem e falam. Há bolo e há café e o tema é a morte. É uma tertúlia. Não há nenhum Death Cafe que seja igual a outro. Os encontros variam conforme os presentes. Além disso, é uma coisa aberta a toda a gente. Fazemos em sítios diferentes para apanhar, exatamente, públicos diferentes E é espetacular! É mesmo bom. Às vezes rimos num Death Cafe. Uma pessoa pensa que vai para lá chorar e não [risos].

Nós vamos morrer e isso é a coisa mais certa da nossa vida. Deve ser natural, por isso, falar da morte. Claro que não é para estarmos a falar da morte a todas as horas da nossa vida, mas é importante lembrar a finitude da vida

Conversas essas importantes para desmitificar a morte, certo?

Sim. Nós não falamos da morte, mas a probabilidade de passarmos por isso é enorme porque é muito raro as pessoas que morrem de uma morte imediata. Acontece, como é óbvio, com um ataque de coração, um acidente, mas as estatísticas dizem-nos que a grande maioria de nós vai morrer ao fim de um processo, mais ou menos longo, de doença. Portanto, quanto mais falarmos destes temas agora, enquanto não estamos a passar por eles, melhor. Falar com desconhecidos é mais fácil, com os nossos, é complicado, mas tem de ser feito. Por exemplo, se perguntar já à minha mãe se ela quer ser cremada quando morrer, quando isto acontecer podemos realizar o seu desejo e isso dá-nos uma paz enorme. Além disso, é melhor falar disso numa altura em que ela está sã do que chegar à hora e termos de ter essa conversa.

Nós vamos morrer e isso é a coisa mais certa da nossa vida. Deve ser natural, por isso, falar da morte. Claro que não é para estarmos a falar da morte a todas as horas da nossa vida, mas é importante lembrar a finitude da vida. A sua fragilidade. Além disso, falar da morte faz-nos aproveitar a vida ao máximo e e ir às questões mais essenciais da nossa vida: Estou a ser a pessoa que quero ser?; Estou a fazer o que quero fazer?; Estou numa relação que me faz feliz? Gosto do meu trabalho?. Falar da morte faz-nos refletir na vida a sério e vivê-la o melhor possível, claro que, de acordo com as nossas possibilidades. Uma das atividades que temos e que gosto muito, é um jogo de cartas facilitadoras de conversas sobre o fim de vida. É como se fosse um baralho de cartas, mas em vez de ases e copas tem frases que pessoas em fim de vida costumam dizer e que para elas são importantes, como não ter dores, estar acompanhadas e há lá uma carta que diz: 'Sentir que a minha vida está completa'. Para mim, essa é 'a carta' e é para isso que tento todos os dias trabalhar, para que o meu dia esteja completo. É importante sentir que a minha vida está completa agora, não é quando tiver 70 anos. Não é adiar para essa altura, é agora!

Eu, por exemplo, tenho cancro da mama e uma filha em Cuidados Paliativos, mas tento viver ao máximo. E as pessoas podem não estar a viver uma situação destas, mas têm avós, têm familiares, têm vizinhos que passam por situações semelhantes. É impressionante que falar da morte continue a ser tabu. Somos o único animal que parece que estamos a ver os outros a morrer, mas julgamos que a nós não vai acontecer. Por exemplo, outro dia estive num Death Cafe, em Leiria, e estavam lá vários profissionais de saúde de Cuidados Paliativos, que veem muitas pessoas a morrer e vários disseram: 'Ah, mas eu nunca pensei na minha morte'. Acho isso uma coisa... Como é que é possível?! Como é que eles acompanham estas pessoas e nunca pensaram na sua própria morte? Parece que criam uma barreira. A morte só acontece a um determinado tipo de pessoas? Não! Como é que é possível?! Acaba por ser quase uma defesa.

A morte é um segundo. Deixar de respirar, o coração parar, dura apenas um segundo. Não é isso que interessa. O que interessa é o processo de morrer

Achamos que se não falarmos disso, não pensarmos nisso, não vamos morrer?

Nos nossos workshops temos debatido isso mesmo. Pensar da morte, falar da morte, não puxa a morte. Estejam descansados que já falamos disso há muito tempo e continuamos aqui [risos]. Não é preciso bater na madeira ou esses disparates. Quando estamos a falar da morte, estamos a falar da vida. A morte é um segundo. Deixar de respirar, o coração parar, dura apenas um segundo. Não é isso que interessa. O que interessa é o processo de morrer. Que este seja com menos sofrimento possível e que a pessoa, até esse último segundinho que é morrer, esteja viva. Nesse processo de morrer que viva. Estou muito dentro deste tema das pessoas com doenças muito avançada e essas pessoas tendem a viver a vida ao máximo. Portanto, nós temos é de estar com os ouvidos muito atentos a quem está a morrer. Quando isso acontece, as capas saem, as máscaras caem e apenas está a verdade e o que verdadeiramente interessa. Por isso vamos lá aprender com elas. Não vamos esperar até ao último segundo da nossa vida para viver o que verdadeiramente interessa. Tem muito sentido falarmos sobre a morte. É um tema apaixonante e é vida, com letras grandes.

Que melhorias são necessárias na nossa sociedade e na área da Saúde para dar mais qualidade de vida a quem está a morrer?

A base é a compaixão. Sem dúvida nenhuma. A compaixão pelos outros e a compaixão por nós próprios. Se toda a gente tem o direito de ser tratado com bondade, nós a nós próprios também o devemos. Além disso, é importante aceitar a compaixão dos outros sobre nós próprios, quando estamos em sofrimento. Por exemplo, os profissionais de saúde, a quem só tenho a agradecer, estão muito esgotados. Eles têm condições de trabalho difíceis e uma das coisas que têm muita falta, neles e na sociedade em geral, é falta de auto-cuidado, de auto-compaixão, de refletir. Nós temos uma vida muito apressada. É preciso 'slow down'. É preciso parar e uma coisa que os workshops da Compassio também têm é silêncio. Haver silêncio, parar. Concentrar-nos no aqui e no agora. Nós nunca estamos no aqui e agora. Estamos sempre no amanhã, no ontem, a seguir a isto. E isto é mesmo importante. Nós tivemos um programa que se chamava 'Salário emocional', dirigido aos cuidadores formais, aos profissionais de saúde, aos cuidadores de lares e incidia muito sobre estratégias de auto-cuidado, sobre como ser cuidador com paixão. E isso é essencial.

O tempo de doença, de fim de vida pode ser cheio de crescimento espiritual, de sanação. Pode-se estar a morrer e estar sano. Pode-se estar são 

O que eu mais quero, enquanto responsável da Compassio, é que as pessoas doentes sejam mais bem cuidadas e, para isso, os cuidadores, sejam eles formais ou informais, também têm de se cuidar. Quando tu te cuidas, melhor irás cuidar dos outros. Está muito incutido na sociedade que cuidar de mim é ser egoísta, mas a coisa mais egoísta que podemos fazer aos outros é não cuidar de nós próprios. Além disso, o espiritualismo também é importante. Acabei de fazer uma pós-graduação em acompanhamento espiritual em clínica, que é uma coisa que, em Portugal, ainda só padres é que fazem. A espiritualidade é uma vertente que nós temos. É inata. As pessoas podem achar que não são espirituais, mas são. Espiritualidade é diferente de religiosidade. A religiosidade é uma forma de expressa essa espiritualidade, mas a espiritualidade tem a ver com as questões existenciais: 'O que é que eu estou a fazer neste mundo?', 'Este sofrimento tem algum sentido?'. Nós podemos estar muito afastados desses temas e andar só neste 'rame rame', mas quando surgem as doenças ou outra situação desafiadora, isto vem ao de cima. A pessoa vai concluir, com a doença, que, afinal, o que é mais importante não era o que pensava que era. O tempo de doença, de fim de vida pode ser cheio de crescimento espiritual, de sanação. Pode-se estar a morrer e estar sano. Pode-se estar são. Há pessoas que estão cheias de saúde e não estão assim. Há pessoas a morrer e cheias de vida e em paz. Estar em paz consigo mesmo é uma grande graça.

E antes que esse momento chegue, têm por exemplo o mural 'Antes de morrer, eu quero' para levar as pessoas a refletirem sobre a finitude da vida. Como está a correr essa iniciativa?

O mural está a ser um sucesso, está a ter uma adesão brutal. É impressionante e mesmo as pessoas da junta de freguesia, que estavam um bocadinho receosas e é que autorizaram isto, agora já dizem que o devíamos ter feito há mais tempo e que devíamos ter uma parede maior. O mural está a ter um acolhimento brutal! Brutal, mesmo! O objetivo é lembrar a finitude da vida, a importância de a aproveitar bem a vida, por isso é que foi lançado na altura dos finados e está junto a um cemitério.

 E quais são os desejos que mais aparecem por lá?

Aparece muito o desejo de ter um filho, viajar. Passam lá muitos miúdos e aparecem alguns disparates [risos]. Há os 'quero namorar com o não sei quantos'. Uma criança escreveu: 'Antes de morrer quero que a minha mãe deixe ir ao jantar' e eu escrevi: 'Podes ir'. [Risos]. Isso são brincadeiras. Mas pedem-se coisas muito bonitas como 'quero ser melhor pessoa', 'quero ser a melhor versão de mim próprio', 'quero crescer espiritualmente'. Ah! houve uma que me encantou que foi: 'Fazer o meu avô orgulhoso'. As crianças escrevem muito: 'Quero ter um cão', 'quero ter um gato', 'quero conhecer o Messi', 'quero não sei o quê do Ronaldo'. Mas vê-se de tudo: 'Quero comer uma mariscada', 'quero ir à ilha'.

Atualmente, o tempo que se dá a uma pessoa que está em luto não é suficiente. (...) Uma pessoa pode chorar, outra pode estar aparentemente muito bem, mas ninguém sabe o que realmente se passa lá dentro

Já sobre o processo de luto, recentemente a Organização Mundial de Saúde declarou o luto prolongado como uma doença crónica. Acha que este anúncio era importante?

Não sei, não tenho teoria sobre isso, mas sei que o luto também é um tabu. Sei que é cada vez mais importante falar dele e que a sociedade pressiona as pessoas para despacharem este sentimento, para esquecerem as pessoas que perderam e isso não pode ser assim. O luto é um tempo muito difícil e precisamos de uma sociedade mais compassiva também neste sentido. Uma sociedade que saiba, pelo menos, o que não dizer. Se nós soubermos o que não dizer às pessoas que estão num processo de luto já é uma grande coisa. Ah! E não fugir, acompanhar. Se calhar levar uma sopa e estar em silêncio, pois esse é um tempo extremamente difícil.

Atualmente, o tempo que se dá a uma pessoa que está em luto não é suficiente. Este tipo de sofrimento não é determinado. É uma coisa realmente muito singular. Devemos validar o sofrimento da pessoa. Dizer-lhe: 'O teu sentimento importa, o teu sofrimento é válido'. E não há forma correta para exprimir essa dor. Uma pessoa pode chorar, outra pode estar aparentemente muito bem, mas ninguém sabe o que realmente se passa lá dentro. Para sermos verdadeiramente compassivos temos de acompanhar a pessoa, não é abandoná-la nem desvalorizar os seus sentimentos.

Por fim, que tipo de apoios é que a Compassio recebe? Como é que a associação sobrevive?

Desde março que nós temos uma coisa que é: 'Quer fazer um donativo à Compassio?', pois, na verdade, nós vivemos de financiamentos. Agora, temos financiamento para um ano, mas a seguir não temos nada. Tivemos parados durante algum tempo devido a isso mesmo e é uma pena se pararmos novamente.

Estamos sempre a concorrer a novos concursos, como o 'La Caix'a, e a outros orçamentos colaborativos. No fundo, concorremos a todos os concursos que achamos que são adequados para nós. Se quiserem fazer um donativo à Compassio, está no nosso site como fazê-lo. Basicamente, é só mandar um e-mail e pedirem o NIB. Quando se inscrevem num workshop está lá também o NIB, ou MBWay. Seria muito bom para continuarmos o nosso trabalho. A melhor forma de ajudar-nos é vir aos nossos workshops, ser nossos sócios.

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