"Eu sou muito a favor da regulação e da legislação, acho que é fundamental, e há um equilíbrio muito fino e muito discutível entre onde é que eu vou com a lei, por onde é que eu castro e onde é que eu deixo de ser inovador e deixo de ser criativo", afirma Gonçalo Perdigão, coautor do livro 'Building Creative Machines', em parceria com Filipa Matos Baptista e João Santos Pereira.
A regulação que existe atualmente "é bastante equilibrada, desse ponto de vista, portanto, cria fronteiras claras, cria zonas que são proibidas e permite alguma adaptação a cada um dos países", adianta.
Tal "permite-nos crescer", mas o problema "está relacionado com aquilo que são as diferenças entre as regiões", recorda.
Na Europa, "somos pioneiros nesta regulação, outras zonas não o estão a fazer. E, então, até onde é que essas zonas podem ir", questiona o cofundador da Algorithm G, consultora internacional focada na aplicação da IA Generativa e Web3.
"Cada um tem que fazer o seu trabalho e eu acho que a Europa está a fazer bem esse trabalho", sublinha Gonçalo Perdigão.
Será que a IA torna os humanos mais preguiçosos? "Diria que esse efeito já surgiu com outras tecnologias e outros produtos", responde, apontado, por exemplo, a Wikipedia.
Esta "torna-nos um pouco mais preguiçosos porque resume a informação e é relativamente credível", mas também a Google "ajudou-nos durante 20, 25 anos a encontrar essa informação e, portanto, também aflorou esse processo" e a "informação que encontramos é aquela que o motor nos devolve, não é aquela que, se calhar, nós queríamos encontrar", salienta.
Portanto, "já houve no passado alguns efeitos que geraram essa situação".
Agora, "o que devemos perceber é como é que nós otimizamos o nosso tempo, reduzindo aquilo que são tarefas mais repetitivas ou mais burocráticas ou mais desinteressantes ou que criam menos valor e passamos isso para a máquina e validamos a resposta e, depois, aproveitamos o tempo que nos sobra para coisas mais interessantes, de maior valor, de mais ideação", defende.
Até porque "prefiro pensar em substituir trabalho de menor valor por trabalho de maior valor em vez de 'vamos ser mais preguiçosos'", mas "quem quiser ser mais preguiçoso pode ser mais preguiçoso, isso depois cabe a cada um definir o que é que quer ser", aponta.
No que respeita à IA, há também o tema da ética e da responsabilidade, que não sendo a mesma coisa, estão correlacionados.
"Estão essencialmente relacionados com a forma como estes modelos são criados, com o tipo de informação que usam", se essa informação "é uma informação com uma boa curadoria ou não, se está limpa ou não, se tem desvios, se tem tendências e de que forma é que estes desvios e tendências depois se manifestam nas respostas, nos 'outputs', e que de forma é que isso vai impactar o que quer que seja", discorre Gonçalo Perdigão.
A partir daí "entramos nos 'deepfakes', nas notícias falsas" e por aí fora, sendo que este "é um tema que tem estado a ser analisado sobre várias vertentes".
Os produtores dos modelos "estão a criar camadas de 'software' para conter esse efeito, para o filtrar", aliás, "há coisas que nós conseguimos fazer há um ano e que hoje já não conseguimos, certo tipo de pedidos".
Depois há a regulação/legislação, "onde a Europa está mais avançada do que qualquer outra região e que cria fronteiras e barreiras à boa utilização e às boas práticas".
Neste momento, "estamos numa fase já de implementação dessas regras" que "foram fechadas em agosto de [20]24, deverão estar em cada país da União Europeia implementadas até 2026 e há um consórcio em Portugal que está a trabalhar nisso".
Instado a comentar o facto dos modelos de IA replicarem os vieses dos humanos, Gonçalo Perdigão admite que sim.
"O modelo aprende com o conteúdo que foi gerado pelos humanos e com aquilo que é a forma de pensar e as tendências que existem, na sociedade, na cultura, no contexto humano. Portanto, essas vertentes, essas dimensões são todas replicadas depois nas respostas", refere.
"O forçar é difícil, mas o que tem estado a ser feito são várias baterias de testes para apanhar aqueles que são os blocos críticos", eliminando viés. No fundo, "fazer com que o modelo deixe de replicar aquilo que é a essência humana", porque esta "é uma essência com desvios e com tendências".
Em suma, "queremos que o modelo seja aquilo que nós próprios não somos", remata.
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