Vigilância biométrica tem riscos, mas a proibição total pode ser pior

O professor e especialista em sistemas de biometria Nuno Gonçalves defende que a vigilância biométrica tem riscos e é falível, sendo necessário garantir que os dados não são mal utilizados.

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Lusa
26/10/2023 22:43 ‧ 26/10/2023 por Lusa

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O recurso à vigilância biométrica é um dos pontos de mais difícil consenso entre o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão Europeia, que pretendem terminar o processo legislativo sobre Inteligência Artificial até ao final do ano.

Nuno Gonçalves, professor especialista em Biometria da Universidade de Coimbra, alerta para a possibilidade de erros na identificação de pessoas com recurso a esta tecnologia, que permite o reconhecimento pelas suas características físicas em tempo real.

A utilização destes sistemas é algo "relativamente comum nos Estados Unidos", disse, referindo que já houve decisões que foram anuladas em tribunal em relação a cidadãos que foram mal identificados por sistemas biométricos.

A biometria, como "ciência que estuda a utilização de características humanas únicas para identificação ou verificação das pessoas", não é infalível e os sistemas que a utilizam, "apesar de terem uma taxa de exatidão elevada, não é a 100%", afirmou.

Além disso, existe ainda um "viés de género e racial": "A probabilidade de um homem negro, ou de uma mulher negra, serem condenados de forma errada é superior à de um homem branco" e a razão para isto é "o facto de o sistema ser feito com bases de dados muito grandes de imagens que têm maioritariamente amostras de homens brancos caucasianos", acrescentou o especialista.

Do ponto de vista do professor Nuno Gonçalves, poderiam admitir-se "algumas exceções muito controladas" para vigilância biométrica, até porque a "tecnologia está a permitir a própria proteção da informação biométrica".

"A história tem demonstrado que as proibições das evoluções científicas e tecnológicas acabam por não resultar e permitem sim que as coisas se façam de forma descontrolada", advertiu.

Quanto ao processo legislativo europeu, Nuno Gonçalves defendeu que uma exceção controlada pode ser admitida se "existir forma de garantir que os dados não são mal utilizados" nem são usados para "policiar pessoas".

Beatriz Dias, jurista associada da Tecnologia Media e Comunicações (TMC) da sociedade de advogados CMS, defende que a posição do Conselho Europeu - que pede exceções à proibição da vigilância biométrica - é abrangente, admitindo contudo que, "em última instância, poderão estar em causa os direitos fundamentais e liberdades".

O risco de haver "uma entidade ou organismo do Estado que sabe onde as pessoas estão e o que está a acontecer" é um dos receios que o recurso à utilização da vigilância biométrica suscita.

Perante a possibilidade de um ataque terrorista, os Estados-membros querem criar "mecanismos de salvaguarda" e defesa e devem ter em conta outro direito fundamental, a liberdade dos cidadãos, como dois pratos numa balança, considerou.

Contactado pela Lusa, o secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa, Mário Campolargo, frisou que "aquilo que está a ser discutido a nível europeu é a procura por um equilíbrio entre aquilo que é a defesa do Estado e uma forma em que os direitos do cidadão possam ser compatíveis para se garantir um equilíbrio correto".

O secretário de Estado defende "uma solução europeia que facilite a inovação tecnológica, a proteção dos direitos do cidadão e, em casos excecionais, permitir ao estado democrático que tenha os recursos que necessita".

A Comissão Europeia mantém a expectativa de concluir até ao final do ano o regulamento europeu sobre Inteligência Artificial, apesar de se manterem divergências em vários pontos, entre os quais a vigilância biométrica, admitiu hoje fonte oficial, um dia depois de uma reunião entre os co-legisladores europeus sobre o regulamento da Inteligência Artificial.

Leia Também: UE procura consenso sobre vigilância biométrica no regulamento sobre IA

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