Não há eleição em Portugal em que o tema da falta de representatividade dos partidos políticos nos debates televisivos não venha à baila. A sensivelmente um mês das europeias, as sondagens apontam para uma vitória do PS mas renhida, com o PSD a começar a assomar-se.
A presença nos meios de comunicação social é indiscutivelmente preponderante para qualquer partido em campanha eleitoral e os debates entre candidatos podem ser um empurrão precioso (a quem as coisas corram bem) na reta final da campanha.
É nisso que os partidos acreditam. Até ao momento, estão marcados três debates, um na SIC (já no dia 1 de maio), outros dois na RTP, no dia 13 e no dia 20.
No primeiro, na SIC, participam os seis partidos com representação no Parlamento Europeu (PS, PSD, CDS, BE, CDU e Marinho e Pinto, eleito eurodeputado pelo MPT nas últimas europeias e agora cabeça de lista do PDR). Na TVI, ainda não há datas acertadas, permanecendo tudo em aberto.
Já a estação pública, terá um debate com os 12 candidatos de forças políticas sem representação no PE - e até ver a única televisão a fazê-lo - no próximo dia 13. Os cinco cabeças de lista dos principais partidos voltam a encontrar-se, no dia 20, na RTP, seis dias antes das eleições, confirmou ao Notícias ao Minuto a direção de informação da estação pública.
Além dos debates, a estação pública terá ainda os frente-a-frente, encontrando-se no dia 11 os candidatos do PS e do PSD.
À exceção da RTP, os partidos sem qualquer representação parlamentar e que fazem parte dos boletins de votos no dia 26 de maio não têm ainda agendado palco na caixinha mágica. As televisões argumentam - sempre argumentaram -, que não é viável um debate com todos os candidatos, mas também ainda não encontraram uma forma de dar o mesmo palco a todas as forças em jogo.
Livre fala em "cartel"
Descontente, o Livre lançou o mote: uma petição exigindo maior representatividade e justiça nos debates televisivos. Rui Tavares, cabeça de lista nestas eleições, é categórico: "Em Portugal os partidos do sistema, organizados em cartel, e em conluio com as direções de informação dos canais de televisão restringem os debates televisivos apenas a cinco partidos".
Tavares lembra que já foi assim em 2015 quando "a Assembleia da República, à beira de eleições legislativas, alterou a Lei da cobertura das campanhas eleitorais em favorecimento destes mesmos cinco partidos". "Agindo de forma concertada – como um cartel! – estes cinco partidos bloqueiam a participação de outros partidos nos debates, bastando, para isso, a ameaça de não participarem". Uma situação que "não é justa nem democrática", contesta Rui Tavares, exigindo "que se dê voz a todos os cidadãos e se respeite o seu direito a ser informados". "Não podemos escolher o novo parlamento com base nas escolhas do parlamento anterior".
O PAN, encabeçado por Francisco Guerreiro nestas eleições, e cujo objetivo é repetir no PE a conquista alcançada no Parlamento português, está apenas contemplado no debate com os pequenos partidos na RTP, aguardando respostas das outras estações.
E o que pensam os outros?
Habituado ao plateau da televisão e a estar do lado dos grandes partidos, Pedro Santana Lopes critica agora a falta de representatividade nos debates. “Um Estado, que se diz de Direito, que faz debates só com cinco partidos devia sentir vergonha”, contestou o fundador da Aliança. Mas vai mais longe.
“Os apoios financeiros são só para quem já lá está. Debates, só para os mesmos (…) O Presidente da República marcar data de eleições? Só com os que já entraram”, exemplifica, questionando: “porque não consagram, na Constituição que são proibidos novos partidos?” Santana apela, por isso, à intervenção da Comissão Nacional de Eleições.
O Iniciativa Liberal, que tem como cabeça de lista o economista Ricardo Arroja, admite que ter debates a 17 é “difícil de gerir”, contudo, “os meios de comunicação social deviam criar condições para que todas as candidaturas tivessem o mesmo espaço”. E isso inclui não só os debates como os espaços noticiosos.
Quanto aos debates, “quem organiza devia fazer o esforço”, procurando ser “criativo, inovar e tentar implementar modelos diferentes que permitissem dar a conhecer todas as candidaturas em pé de igualdade. E dentro dos meios de comunicação social, aqueles que são Públicos (RTP e Rádios) têm especial obrigação para encontrar esses formatos e darem esse mesmo espaço”, diz o partido ao Notícias ao Minuto.
Visão diferente tem André Ventura, cabeça de lista da coligação Basta às europeias. “Ao CHEGA e à Coligação BASTA pouco importa se os debates são a 4, 5 ou 10”, afirma, acrescentando que a campanha que a coligação que representa “está a fazer-se na rua e com uma mobilização incrível, pelo menos da nossa parte”.
“Há partidos que se estão sempre a queixar. Se são atacados, são atacados. Se são ignorados, não há democracia”, atira, completando que para “para ter um lugar à mesa é preciso lutar por ele”. Aliás, André Ventura vai mais longe ao afirmar que “é bom” que não o convidem para certos debates. “ Para não ter de estar no mesmo espaço do que aqueles que têm sistematicamente traído o povo português”. E termina recordando: “como se vê na televisão, eu irrito-me facilmente, até é bom não estar com certas pessoas”.
"Debates ou conversas em família?"
"Debates ou conversas em família?", pergunta o PCPT/MRPP. Em matéria de pluralismo eleitoral, sublinha ao Notícias ao Minuto, “partidos parlamentares, Governo, Presidente da República e Comissão Nacional de Eleições entenderam-se para dar uma machadada definitiva no pouco que restava de democracia em períodos eleitorais”.
Para este partido, os debates cingidos exclusivamente aos partidos com representação parlamentar "são uma afronta à inteligência dos cidadãos eleitores, a quem assim se dá a escolher apenas entre os que são precisamente os escrutinados nas eleições, os únicos responsáveis pela política que devia ser objecto da crítica e da escolha de outras alternativas".
Também o PCPT/MRPP recorda que esta situação passou a ser permitida "depois da última alteração legislativa fascista que consagrou como absoluto o critério jornalístico na promoção de debates eleitorais, definindo esse critério como o de seleccionar apenas os partidos com representação parlamentar". O partido - que diz ser a única força a defender a saída de Portugal da União Europeia e do Euro - afirma, no entanto, não se queixar desta situação e considera até que ela é "perfeitamente compreensível numa democracia podre como a que vivemos, agora até reforçada com o contributo do PCP e BE".
"Um escândalo que serve o poder instituído e o abstencionismo"
O Nós, Cidadãos! começa por perguntar: "Quem tem medo de Paulo Morais e da luta contra a corrupção?", puxando assim da principal bandeira do partido para o sufrágio de 26 de maio. O presidente, Mendo Henriques, está convencido de que "a democracia apenas poderá renovar-se com novos nomes e novas caras" e que, para isso, "os candidatos têm de ter voz igual até porque o público já conhece os partidos com assento parlamentar e quer escutar os novos". A confirmar-se que os debates apenas incluem candidatos dos partidos com assento parlamentar, "é um escândalo que serve o poder instituído e o abstencionismo".
O Nós, Cidadãos diz ainda que vai contactar os outros partidos sem assento parlamentar para efetuarem uma ação conjunta "contra esta pretensão de matar a voz dos portugueses".
Boicote só à Esquerda?
O MAS (Movimento Alternativa Socialista) mostra também desagrado perante a falta de representatividade na comunicação social. "Demonstra como o sistema em que vivemos ainda deve muito a uma democracia plena e efectiva", aponta Tiago Castelhano ao Notícias ao Minuto, assinalando que as campanhas eleitorais "já são desequilibradas devido as desigualdades em termos de financiamento" das mesmas e a "desproporção de tempo na TVs ou jornais dado aos partidos parlamentares torna as campanhas eleitorais muito pouco democráticas".
O facto de só os partidos com representação parlamentar estarem contemplados nos debates televisivos demonstra ainda - "de forma clara e inequívoca" - que existe "uma protecção e acordo do regime para que o parlamento se resuma as actuais cinco forças políticas", lamenta, constatando ainda que este 'boicote' se aplica à Esquerda, "dado que tanto a comunicação social como o regime concedem espaço a partidos como o Aliança e o Chega".
No boletim de voto nestas europeias está ainda o PURP (Partido Unido dos Reformados e Pensionistas) que diz não aceitar que os partidos com assento parlamentar legislem "em causa própria", "excluindo todos os partidos do acesso a passarem a sua mensagem aos cidadãos".
O partido - cuja causa é sobretudo "uma maior equidade entre os cidadãos, em particular, os reformados com reformas miseráveis" - entende que "vivemos uma democracia podre e bafiosa, alegadamente mafiosa, estilo Siciliano, só faltando o Al Capone, para premir o gatilho, para exterminar todos os outros". Reformados e Pensionistas queixam-se da "corja de políticos" que tem governado o país desde o 25 de Abril, que têm sido "os maiores corruptos (cerca de 95 % deles)".
E lamenta que só seja ouvido na altura das campanhas - "porque os 'outros' tudo fazem para os silenciar - e garante que irá "denunciar acutilantemente toda esta vergonha nacional". Quanto aos debates, "não fomos convidados, a não ser as Entidades Publicas (RTP e outras), que face à Lei, são obrigados a darem-nos voz".
Concorrem ainda nestas eleições o PTP e o PNR.