Mariana Mortágua, Sofia Aparício, Miguel Duarte e Diogo Chaves, os quatro portugueses que estiveram detidos em Israel por integrarem a Flotilha Global Sumid, chegaram este domingo a Portugal e denunciaram as condições em que estiveram detidos. No entanto, apesar das dificuldades, frisaram que o ónus da questão está na causa palestiniana.
"Hoje de manhã, quando saímos da prisão de Israel, não fazíamos ideia do que é que se passava no mundo. Estivemos incontactáveis durante vários dias. Poder perceber que a flotilha criou esta mobilização tão grande, poder perceber que há quem se está a mobilizar e a sensibilizar, é o maior orgulho", começou por referir a coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua, em declarações aos jornalistas.
A deputada bloquista, que já tinha também feito declarações a partir de Madrid, contou que, durante os quatro dias em que os quatro estiveram detidos numa prisão de Israel, viram "camaradas a ser espancados" e estiveram "várias horas algemados", além de terem sido "provocados por um ministro israelita".
"Uma coisa muito presente em todos nós é que percebemos a diferença entre ser europeu e ser palestiniano. Por muito que tenha sido difícil e que tenha havido abusos, isto deu-nos uma ideia do grau de impunidade das forças israelitas contra os palestinianos. Se eles nos fazem isto a nós, imagino o que fazem a palestinianos", atirou.
Já o ativista Miguel Duarte revelou que todos "tiveram fome" e passaram "sede". "As celas estavam absolutamente sobrelotadas", disse, acrescentando que alguns detidos estiveram vários dias sem receber medicamentos.
"Não existem direitos de prisioneiros nas prisões israelitas. Se tivemos alguma proteção à nossa integridade física, foi porque somos europeus. Porque temos mobilizações no mundo inteiro em favor à flotilha", denunciou.
"Vimos um soldado israelita com os nossos passaportes a falsificar as nossas assinaturas"
A atriz Sofia Aparício contou que as autoridades israelitas fizeram-nos "assinar dois documentos escritos em hebraico". "Obviamente, não assinámos. A maior parte dos camaradas assinou o de libertação após 72 horas e houve quem não assinasse absolutamente nada", disse.
Miguel Duarte deu como exemplo uma situação ocorrida durante o dia de hoje, em que lhe foram dados documentos e pedido que os assinasse "o mais depressa possível" e "quase sem ler".
"Os documentos diziam que Israel nos tinha capturado legalmente e trazido para Israel de forma legal. Recusámo-nos a assinar e vimos um soldado israelita com os nossos passaportes a falsificar as nossas assinaturas para mostrar que nós aceitámos ser intercetámos legalmente", afirmou.
E frisou: "É preciso ser claro em relação a isto: Fomos intercetados, fomos raptados em águas internacionais e levados ilegalmente e contra a nossa vontade para Israel".
Diogo Chaves, por sua vez, lamentou ter deixado "camaradas para trás" nas prisões israelitas, mas considerou que "fazia mais sentido vir o mais cedo possível" para Portugal para continuar a luta.
"Cidadãos de todo o mundo mobilizaram-se para fazer o que os governos não estão a fazer"
Interpelada por uma jornalista, Mariana Mortágua recusou a ideia de os ativistas da flotilha serem considerados "heróis". "Não somos heróis. Somos pessoas que estão a fazer aquilo que os nossos governos não estão a fazer", frisou.
A deputada disse, ainda, que "quem devia estar a furar o cerco humanitário e a proteger a lei internacional são os governos dos países que se dizem democracias".
"Não fizeram isso e cidadãos de todo o mundo mobilizaram-se para fazer o que os governos não estão a fazer, que é abrir um corredor humanitário até Gaza, lutar contra um genocídio, lutar pela liberdade do povo da Palestina", afirmou.
Mortágua rejeitou criticar a Embaixada de Portugal em Israel, defendendo que a crítica é apenas "ao Governo português que não aplica sanções" e "permite aviões militares passarem por território português".
Mariana Mortágua, a atriz Sofia Aparício e os ativistas Diogo Chaves e Miguel Duarte aterraram esta noite no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, após terem sido repatriados de Israel.
Os quatro portugueses foram recebidos em euforia por dezenas de manifestantes, que empunharam bandeiras e lenços da Palestina e traziam cartazes com palavras de ordem como "Libertem a Palestina" e "Obrigado Marina, Sofia, Diogo e Miguel por nos representarem".
Rodeados de vários polícias, foram escoltados para a entrada do aeroporto onde improvisaram a conferência de imprensa, com as perguntas dos jornalistas e as respostas dos ativistas a serem interrompidas por gritos de alegria e também de crítica ao Governo português.
"Paulo Rangel, pau mandado de Israel" foi das palavras de ordem que mais se ouviu.
Entre os manifestantes encontravam-se antigos e atuais dirigentes do Bloco de Esquerda como Francisco Louçã, Catarina Martins, Luís Fazenda, Jorge Costa e outros.
Os ativistas, recorde-se, foram detidos na noite de quarta para quinta-feira passada, quando as forças israelitas intercetaram as cerca de 50 embarcações da Flotilha Global Sumud, que pretendia entregar ajuda humanitária na Faixa de Gaza.
[Notícia atualizada às 07h26]
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