Eurico Dias Nogueira, o bispo que atraiu a atenção da PIDE

O arcebispo emérito de Braga, Eurico Dias Nogueira, que morreu hoje durante a noite aos 91 anos, era o único prelado português ainda vivo que tinha participado no Concílio Vaticano II.

D. Jorge Ortiga lembra "homem de diálogo"

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Lusa
20/05/2014 11:50 ‧ 20/05/2014 por Lusa

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Eurico Dias Nogueira participou nas sessões finais do Concílio reformador da Igreja Católica(1962-65) em representação da então diocese de Vila Cabral, Moçambique (atual cidade de Lichinga, na província de Niassa), para onde tinha seguido imediatamente depois da sua ordenação como bispo em 1964.

Sobre a sua participação no Concílio Vaticano II, expressou por diversas vezes o seu entusiasmo, considerando também que não se foi tão longe quanto alguns gostariam.

"O Concílio tornou-se um lugar de discussão clara, pública e sem reservas, mas terminado verificou-se que havia uma tendência, de novo, da Santa Sé para centralizar", disse numa entrevista à agência Ecclesia em 2012, defendendo então a realização de um Concílio de "50 em 50 anos".

Nascido em Dornelas do Zêzere, distrito de Coimbra, em 1923, foi ordenado sacerdote em 1945, depois de ter frequentado o seminário em Coimbra, cidade onde viria também a ser ordenado bispo.

Em 1972, foi transferido para a diocese de Sá da Bandeira, em Angola, tendo resignado em 1977 da entretanto elevada a arquidiocese de Lubango. Foi nomeado arcebispo da diocese de Braga nesse mesmo ano, onde permaneceu até 1999, quando foi sucedido pelo atual arcebispo Jorge Ortiga.

Foi ainda professor, publicou vários livros e foi juiz de segunda instância do Tribunal Eclesiástico. A reconstrução dos seminários e a realização de um sínodo são algumas das marcas que deixou na arquidiocese.

Orgulhoso por ter sido bispo em dois continentes, três países e quatro dioceses, foi quando esteve nas antigas colónias de Angola e Moçambique que atraiu a atenção da polícia política (PIDE), que considerava que o então bispo tinha "atitudes de hostilidade, censura e pouco reconhecimento para com o Governo".

Chegou a ser considerado comunista pelo regime do Estado Novo, rótulo que nunca assumiu.

"Não dizer bem do Governo era automaticamente ser comunista. Era um exagero", disse sobre o assunto.

Considerado uma voz irreverente dentro e fora da Igreja, foi crítico do processo de descolonização, considerando que se tivesse sido conduzido de outra forma teria permitido a muitos portugueses ficarem lá.

Numa entrevista em 2012 à Antena 1, afirmou que a Igreja Católica "esteve demasiado tempo calada" sobre os casos de pedofilia e lamentou que a instituição tenha optado por "abafar" os escândalos.

Para a história ficam outras declarações suas, como as que preferiu sobre o escritor José Saramago que, em 1992, considerou "um ateu confesso e comunista impenitente".

Sobre o livro do escritor "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" disse tratar-se de "um livro blasfemo, espezinhador da verdade histórica e difamador dos maiores personagens do Novo Testamento".

A propósito da polémica instalada em 1991 sobre a transmissão do filme "Império dos Sentidos", de Nagisa Oshima na RTP2, película considerada "violenta e obscena" que esteve na origem de um aceso debate sobre a linha que separa o erotismo e a pornografia, Eurico Dias Nogueira diria na altura: "Aprendi mais em dez minutos de filme do que em toda a minha vida".

O corpo de Eurico Dias Nogueira estará hoje em câmara ardente na Sé Catedral de Braga. A missa exequial será na quarta-feira, às 15:30.

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