Greve em França leva milhares à rua contra reforma do sistema de pensões
Pela primeira vez em 12 anos, os principais sindicatos franceses unem-se hoje numa greve geral "inédita" contra a reforma do sistema de pensões que visa aumentar a idade de reforma no país de 62 para 64 anos.
© Lusa
Mundo França
"É uma greve inédita, ou, pelo menos, há muito tempo que não acontecia conseguir juntar as oito principais centrais sindicais e ter todas a dizer que não querem esta reforma", disse à Agência Lusa Boris Plazzi, secretário-confederal da CGT.
"É mesmo excecional ter toda a gente de acordo e é por isso que muita gente vai fazer greve", adiantou.
A oposição ao projeto de reforma do sistema de pensões apresentado pela primeira-ministra Elisabeth Borne no dia 11 de janeiro conseguiu unir as confederações CFDT, CGT, FO, CFE-CGC, CFTC, UNSA, FSU e Solidaires.
Entre outras propostas, esta reforma prevê aumentar progressivamente a idade da reforma de 62 para 64 anos até 2030, fazer com que uma carreira contributiva completa tenha 43 anos de descontos e ainda acabar com regimes excecionais de pensões para quem integra a partir de agora o mercado de trabalho.
A resposta dos trabalhadores após a insistência de Emmanuel Macron de apresentar esta proposta - afastada da agenda mediática desde 2020 devido à pandemia de covid-19 - não se fez esperar e os sindicatos preveem "um dia negro" em todo o país.
"Esperamos uma grande adesão (...). Temos muitas respostas positivas das nossas bases que mostram que muita gente vai fazer greve, não só no setor público, mas também no setor privado. Haverá muita gente nas ruas. Temos mais de 200 manifestações previstas em todo o país", detalhou Boris Plazzi.
Nos transportes, prevê-se a circulação apenas de um TGV (comboio de alta velocidade) e de nenhum Intercidades. É possível também que um em cada cinco voos seja cancelado no aeroporto de Orly, nos arredores da capital.
Em Paris, três linhas de metro deverão fechar completamente e outras 10 apenas vão circular nas horas de ponta. É na capital que vai acontecer a maior manifestação do país, que vai bloquear a circulação entre a emblemática Place de la Republique e Nation.
Nas escolas em todo o país, estima-se que pelo menos 70% dos professores façam greve e os próprios alunos apelaram à greve, tendo a intenção de barricar vários liceus. Também os hospitais vão estar parados, especialmente os serviços das urgências, sobrecarregados nos últimos meses.
A ameaça de escassez dos combustíveis volta também a assustar os franceses que dependem do carro para as suas deslocações quotidianas, já que os trabalhadores das refinarias também vão aderir à greve. Este setor já tem mais greves previstas em janeiro e em fevereiro.
Segundo uma sondagem da revista "Le Point", levada a cabo pelo instituto Cluster17, dois terços dos franceses são favoráveis a esta greve geral, especialmente os mais jovens, com 75% dos inquiridos entre os 18 e os 24 anos a responderem estar ao lado dos grevistas.
"Os preços explodiram em França e temos trabalhadores e famílias completas numa situação muito complicada", assegurou o líder da CGT.
"O Governo deveria ajudar as pessoas a terem dinheiro para acabar o mês, em vez de fazer reformas. Há já fatores suficientes de inquietude na sociedade, que levam a um clima social muito tenso e podem trazer muita gente à rua, durante muito tempo", adiantou à Lusa.
A greve é apoiada pela coligação de esquerda Nova União Popular Ecológica e Social, que integra a França Insubmissa, os socialistas, os ecologistas e os comunistas, assim como por outras forças de esquerda que não estão representadas na Assembleia Nacional.
Já a direita, ou seja Os Republicanos, debatem internamente se apoiam esta proposta do Governo de Borne, sendo que só o seu voto pode viabilizar a reforma no hemiciclo, dado que o partido de Macron não dispõe de maioria parlamentar.
A alternativa, que desagrada à classe política francesa em geral, é forçar a aprovação desta reforma através do artigo 49.3, que permite ao Governo francês fazer aprovar determinados textos sem votação formal no Parlamento. Este é um passo que os sindicatos consideram "antidemocrático".
"É um ato antidemocrático muito forte. O 49.3 já fui usado várias vezes desde o início do mandato, em junho de 2022, e contorna a oposição na Assembleia Nacional. Se usam este artigo, é porque o Governo não tem argumentos para convencer nem a sociedade nem os outros partidos de que esta é uma boa reforma para o país", declarou Boris Plazzi.
Esta lei começará a ser discutida na Assembleia Nacional em fevereiro e continuará a ser apreciada até ao final da sessão legislativa em junho.
Nessa altura, o Governo poderá recorrer ao artigo 49.3 e aplicar o novo sistema já a partir de setembro de 2023, caso não tenha o apoio para a provação no hemiciclo.
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