Analista compara insurgência em Moçambique a uma maratona
O analista João Feijó considera que a violência armada em Cabo Delgado ameaça prolongar-se e as autoridades devem estar preparadas para enfrentar "uma maratona", em vez de "uma corrida" que se resolve rapidamente.
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Mundo Moçambique
"Eu acho que este conflito será uma maratona, não será uma corrida de 1500 metros, como se pensava que ia ser", referiu à Lusa, a propósito dos cinco anos de conflito.
Os grupos insurgentes "jogam com o tempo" e estão preparados "para estar 10 ou 20 anos" a aterrorizar a região, "a viver no mato, do saque e do roubo".
"Nós não temos tempo", refere, numa alusão à pressa do país em ter as petrolíferas de volta para exploração de gás natural, à necessidade de pôr cobro a uma intervenção militar muito cara e ao desejo dos soldados em voltar para casa.
Feijó acredita que o Governo percebeu que terá de conviver com algum grau de violência, algo que poderá transformar-se num "conflito de baixa intensidade".
"O próprio Governo vem admitir que o problema da instabilidade vai se prolongar durante vários anos, mas temos de conviver com ele", acrescenta.
Só não se sabe se tal será suficiente para o regresso dos projetos de gás.
O investigador considera que essa é uma resposta que devia ser dada pela TotalEnergies, a petrolífera que teve de abandonar as obras junto a Palma, depois do ataque de março de 2021 e que diz continuar à espera de segurança.
O ataque marcou a entrada numa terceira fase do conflito, referiu, em que Moçambique pediu ajuda externa e o Ruanda entrou (a par da SAMIM, missão da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral), ajudando a reconquistar zonas que o estado "não conseguia administrar".
"Foi uma viragem", sublinha.
O ataque inicial aconteceu em Mocímboa da Praia a 05 de outubro de 2017, no que classifica como primeira fase do conflito.
Seguiu-se uma segunda fase, com grande pressão das forças rebeldes, que cresceram, estabeleceram bases, ocuparam território e levaram à suspensão dos projetos de gás de Moçambique, o maior investimento privado em África.
A ofensiva militar das forças aliadas reconquistou as zonas em redor dos estaleiros (Palma e Mocímboa da Praia, entre outras) e acabou com as grandes bases de insurgentes, onde "tinham contacto com a população" e "criavam uma entidade contrária ao Governo", descreve Feijó.
Os rebeldes que restam voltaram para as matas e, de novo, com ataques pontuais contra comunidades relativamente remotas, só que agora expandindo a área de atuação, agredindo distritos do sul de Cabo Delgado e na província de Nampula.
"Demos dois passos e frente e um para trás", avalia João Feijó.
Cinco anos depois, "continua uma grande névoa, não está claro" contra quem é que Moçambique está a lutar.
"Talvez esteja claro para os serviços de informação de Moçambique, Ruanda ou da SAMIM, mas essa informação não é passada para o público".
Alguns ataques têm sido reivindicados pelo grupo Estado Islâmico, mas "o que se sabe" contado por "quem esteve com os insurgentes, é que o grupo não é assim tão homogéneo".
Há estrangeiros e há moçambicanos, "com diferentes níveis de radicalização e motivação".
Há cerca de 800.000 deslocados internos devido ao conflito, de acordo com a Organização Internacional da Migração (OIM), e 4000 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos, ACLED.
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