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Moçambique: Analista alerta para risco de dois tipos de segurança

O investigador João Feijó, do Observatório do Mundo Rural (OMR), alertou hoje, em entrevista, à Lusa para o risco de se criarem dois tipos de segurança no norte de Moçambique: uma para os projetos de gás outra para o resto da província.

Moçambique: Analista alerta para risco de dois tipos de segurança
Notícias ao Minuto

07:27 - 14/03/22 por Lusa

Mundo Ataques

"Esta solução militar tem de existir, tem de haver segurança no terreno, mas a questão que se coloca é: segurança para quem? Só para os grandes investimentos da multinacional Totalenergies" ou uma "segurança mais alargada, para as populações?" - questionou, em relação à situação em Cabo Delgado.

Feijó, sociólogo e doutorado em estudos africanos, recorda que a petrolífera francesa já anunciou que "só regressaria depois de as populações" voltarem a estar no terreno de onde fugiram, pelo que "parece que há um esforço coletivo por parte destes diferentes atores - Totalenergies, tropas estrangeiras, tropas nacionais e Governo - no sentido de dar prioridade a Palma e Mocímboa da Praia".

A petrolífera suspendeu o projeto de 20 mil milhões de euros - o maior investimento privado em África - há um ano, após o ataque armado a Palma, vila à volta da qual se começou a construir uma nova cidade e complexo industrial para explorar as reservas de gás do Rovuma - classificadas entre as maiores do mundo.

Depois do ataque, Moçambique aceitou receber tropas estrangeiras do Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), numa ação que tem sido aclamada pelo presidente executivo da Totalenergies, Patrick Pouyanné, e classificada como exemplo pelo presidente francês Emmanuel Macron.

"O Ruanda, em cooperação com Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), ajudou a fornecer uma reposta inédita para a situação em Moçambique", disse em fevereiro, acrescentando que é necessário assegurar "financiamento" e promover tais operações.

Com acesso ainda limitado, tanto por terra como por via aérea, e dependente de colunas militares ou autorizações das Forças de Defesa e Segurança (FDS) moçambicanas, Palma "foi limpa e estar a ser preparada" para receber "muitos funcionários públicos", descreve João Feijó.

"Vão regressar nos próximos dias, foram já chamados" no sentido de reativar os serviços e o mesmo tipo de regresso está a ser preparado para Mocímboa da Praia - vila portuária que esteve ocupada cerca de um ano, até agosto de 2021, por grupos rebeldes.

"Esse triângulo Afungi, Mocímboa da Praia e Palma será o primeiro com mais segurança, precisamente para a indústria do gás. Há esta grande pressão para revitalizar o mais depressa possível o gás, porque o Governo precisa de receitas e está a contar com estas para também poder fazer outros projetos", sublinhou.

Feijó admite ser legítima a urgência em sossegar a zona dos projetos e gás, mas "há que tomar decisões conscientes", refere.

"Se vamos criar dois tipos de segurança, uma em volta dos megaprojetos e outa fora, estamos a criar dois tipos de cidadania e uma economia de enclave", referiu.

Ou seja, há o risco de nascer "uma zona de grande investimento e presença internacional, sem ligação com o tecido económico à volta e que viaja diretamente para o estrangeiro ", sem o "conteúdo local que se esperava", ou seja, as ligações com o tecido empresarial local.

E em redor desta zona de grande investimento "temos 700 mil deslocados, descapitalizados", com os serviços públicos destruídos e que "continuam a ser alvo de pequenos ataques", como tem acontecido nos últimos meses nos distritos de Nangade, Macomia e Meluco.

"Temos de ter consciência" que dar segurança o quando antes ao triângulo dos projetos de gás "pode ser bom para o país, porque vai gerar receitas, mas não resolve o problema de fundo" de desigualdade social.

"Não estou contra o desenvolvimento, mas alerto para um risco que pode existir. Espero daqui a três anos dizer que estava enganado", acrescentou João Feijó.

"Infelizmente, olhando para outros países com características semelhantes, estão reunidos os ingredientes para que a situação se volte a repetir", concluiu.

Estima-se que o conflito em Cabo Delgado, no terreno desde 2017, já tenha provocado mais de 3.100 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e mais de 859 mil deslocados, de acordo com as autoridades moçambicanas.

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