As autoridades camaronesas admitiram, em meados de abril, que dez crianças e três mulheres foram mortas a 14 de fevereiro por soldados apoiados pela milícia étnica Peule, no bairro de Ngarbuh, da aldeia de Ntumbaw, na região noroeste. Segundo a ONU, foram mortos pelo menos 23 civis naquela operação, incluindo 15 crianças (nove com menos de cinco anos) e duas mulheres grávidas.
Durante dois meses, as autoridades de Yaoundé negaram qualquer responsabilidade por parte do exército naquela operação, até terem aberto uma investigação sob pressão da comunidade internacional.
Durante a audiência de hoje, o representante do Ministério Público admitiu que as autoridades militares não dispunham de meios para processar todos os alegados perpetradores do massacre. "Conseguimos deitar as mãos a estas pessoas (referindo-se aos três soldados presentes na cadeira dos arguidos) porque estão sob comando militar", explicou.
O tribunal adiou então o julgamento para 21 de janeiro para que o Ministério da Defesa pudesse ser responsabilizado "civilmente" pelo massacre de fevereiro.
Os três soldados estão a ser processados por "homicídio, fogo posto e destruição, violência contra mulheres grávidas, violação de instruções".
O Ministério Público descreveu aqueles atos como "comportamento imoral suscetível de minar a honra e dignidade do exército".
Um quarto acusado, um civil, está "em fuga", de acordo com o Ministério Público. Mas todos enfrentam a hipótese de prisão perpétua.
"Aqueles que deram as ordens devem apresentar-se para se explicarem, para que a verdade possa prevalecer. Devem ser processados", disse Ernest Gbaka, um advogado de defesa, à agência de notícias francesa AFP, no final da audiência.
Os soldados e um grupo de autodefesa "invadiram" uma base rebelde separatista e, "após trocas de tiros, durante as quais cinco terroristas foram mortos a tiro", "descobriram que três mulheres e dez crianças tinham morrido em resultado da sua ação", admitiu a presidência camaronesa em abril.
Durante dois meses, Yaoundé tinha afirmado que as mortes de civis eram o resultado de um "infeliz acidente": a explosão de contentores de combustível, na sequência de trocas de fogo entre soldados e separatistas.
"Ngarbuh é um dos alvos de um ciclo prolongado de abusos militares perpetrados em regiões de língua inglesa", disse a Human Rights Watch numa declaração divulgada na segunda-feira, observando que "a impunidade tem sido uma das principais razões da crise anglófona".
A violência nas duas regiões de língua inglesa, Noroeste e Sudoeste do país, onde os grupos rebeldes separatistas e as forças de segurança têm lutado entre si nos últimos três anos, deixou mais de 3.000 pessoas mortas e 700.000 deslocadas.