Meteorologia

  • 19 ABRIL 2024
Tempo
15º
MIN 14º MÁX 21º

"A reprovação, o julgamento e os olhares": Ser mulher e não ter cabelo

Alopécia deriva do grego (alopex- raposa) e significa falta de cabelo. É uma doença conhecida por afetar sobretudo a população masculina, porém, a verdade é que se estima que em todo o mundo pelo menos 40% das mulheres venham a sofrer de alopécia em algum momento da sua vida. Mas o que significa realmente ser mulher mulher e não ter cabelo?

"A reprovação, o julgamento e os olhares": Ser mulher e não ter cabelo
Notícias ao Minuto

08:15 - 06/06/18 por Liliana Lopes Monteiro

Lifestyle Alopécia feminina

"Os primeiros tempos foram duros. É difícil assistirmos passivamente a uma mudança tão drástica da nossa imagem que se transforma naquilo que nós não gostamos. Entramos num ciclo de emoções onde a revolta e o medo stressam ainda mais o nosso sistema alimentando o seu descontrolo. Eu decidi rapar o cabelo quando percebi que o ia perder todo e sinto que isso foi o melhor que poderia ter feito", explica Cátia Ferreira, que aos 24 anos foi diagnosticada com alopécia areata. 

Rui Oliveira Soares, Coordenador da Unidade do Cabelo do Centro de Dermatologia do Hospital CUF Descobertas, explica ao Lifestyle ao Minuto que a alopécia se divide em dois grandes grupos: " Existem as alopécias cicatriciais, nas quais há um processo que leva à destruição definitiva do folículo (dentro deste grupo, a doença mais frequente nos caucasianos é o líquen plano pilar). São doenças relativamente infrequentes. Depois temos as alopécias não cicatriciais. Este conjunto engloba a situação mais comum que determina a alopécia - a calvície comum ou alopécia androgenética e a alopécia areata, cuja expressão clínica mais conhecida é o aparecimento de peladas". 

Para Cátia, a condição significa que o cabelo vai caindo através do aparecimento de peladas localizadas no couro cabeludo (ou noutras partes do corpo). “No meu caso específico, normalmente em fases críticas de queda, perco cerca de 90% do cabelo e, dependendo do episódio de queda, alguns pelos corporais como sobrancelhas e pelos nos braços. Os episódios de crescimento que se seguem embora lentos têm sido de 100% de recuperação”, diz.

De acordo com Rui Oliveira Soares, a frequência da alopécia na mulher varia com a idade, afetando cerca de 10% das mulheres aos 20 anos, 20% aos 40, 60% aos 60 e cerca de 80% das mulheres aos 80 anos.

E as causas são sobretudo genéticas. "O principal fator é a predisposição genética para o cabelo da zona de cima se ir tornando cada vez mais fino. Esta predisposição é determinada por herança multigénica (provocada por vários genes de múltiplos cromossomas). Estes genes regulam o tipo de recetor para a hormona masculina (caspase), que existe sobretudo na parte de cima do couro cabeludo e menos nas áreas de trás e de lado", elucida. 

"Os processos que determinam a falta de cabelo em homens e mulheres são iguais, mas as doenças que provocam a falta de cabelo podem ter expressão clínica e frequência diferente dependendo do género. Por exemplo, relativamente à calvície comum (alopécia androgenética), no caso dos homens a linha anterior do cabelo recua e pode existir ausência total de pelo na zona de cima, enquanto na mulher a linha anterior habitualmente não recua e a perda de cabelo não é total", explica o clínico. 

Melhorar, sim. Curar, não

Num primeiro momento, aquando do diagnóstico, Cátia experimentou medicamentos de aplicação tópica (como o Minoxidil e outros produtos de farmácia que são normalmente prescritos) e recusou os corticoesteroides injetáveis e de via oral que lhe foram apresentados e recomendados pelo dermatologista, por conhecimento dos seus efeitos secundários. “Foi uma opção minha. Recorri nessa fase à Medicina Tradicional Chinesa e fiz tratamentos de acupuntura e alguma fitoterapia. Sinto que me ajudou bastante, principalmente pelo controlo emocional, recuperação física e mental e pela aceitação da minha nova imagem”.

Rio Oliveira Soares aponta que é possível melhorar a situação, "não curar", desde que ainda existam folículos. E que os tratamentos atuais permitem engrossar os cabelos ainda existentes.

Segundo o especialista, são três os níveis de intervenção: "O 'Médico/Tópico'. Atualmente não existem dúvidas de que o mais eficaz produto aplicado diretamente no couro cabeludo é o medicamento Minoxidil. Os médicos associam, por vezes, champô apropriado. O 'Médico/Sistémico' que inclui a administração de finasterida/dutasterida (comprimidos) por via oral, de modo a bloquear a ação da hormona masculina no folículo piloso, constitui, em muitos casos, uma ajuda preciosa, embora o seu uso não esteja aprovado/regulado para esta situação. Sabe-se hoje que a dose eficaz na mulher é bastante mais alta que a dose eficaz no homem. A associação de polivitamínicos/oligoelementos (via oral) é comum, embora a sua utilidade não seja óbvia, excepto em casos em que exista carência de algum nutriente", faz sobressair.

Por fim, existe o nível "'cirúrgico', referente ao transplante de cabelo: que consiste em remover cabelos das áreas não afectadas pela queda geneticamente determinada (de lado e atrás), sob a forma de pequeníssimos pedaços de pele (microenxertos) e implantá-los na área mais afectada pela queda. O cabelo implantado, por possuir recetores hormonais diferentes, não se perde com o passar dos anos. A técnica atual consiste em implantar cabelo a cabelo, o que permite uma aparência natural. Este método é moroso, envolve um trabalho de equipa entre médicos e técnicos. E a densidade de cabelo que se obtém é limitada, mas habitualmente é suficiente para obter um ganho significativo na aparência."

Cátia conta já com quatro episódios de queda (quase total) de cabelo, em apenas cinco anos, aos quais se seguiram quatro episódios de recuperação, sendo que neste momento tenta manter um estilo de vida saudável e equilibrado, com suplementação específica (reforço) e tratamentos de acupuntura nos momentos em que surge uma nova queda ou durante os quais se sente “mais debilitada, descontrolada emocionalmente ou com elevada exigência intelectual. Não tenho recorrido a outro tipo de fármacos (da medicina convencional) pela pouca eficácia que apresentam em casos de alopecia areata como a minha”, relata.

A paciente confessa que inicialmente a experiência foi extremamente dura. Ainda assim, admite que quando finalmente decidiu rapar o cabelo foi quando sentiu algum domínio da situação no meio do caos em que a sua vida e saúde emocional se tinham tornado.

“A partir daí tudo fluiu... aceitei a minha nova imagem ( que passei a apreciar) e desde então uma espécie de ativismo interior em relação aos padrões de beleza despertou em mim. Neste momento, embora me continue a afetar, estou muito bem resolvida com a minha alopécia, que faz parte de mim mas não me limita ou condiciona, e que ciclicamente me tem visitado”, garante.

"A alopécia é devastadora do ponto de vista psíquico e social"

Não obstante, Cátia não relativiza o estigma social associado à perda de cabelo nas mulheres. Algo que é comum, mas que a sociedade cobra e não compreende.

“Sim, em relação aos estereótipos de beleza que a sociedade ao longo do tempo foi criando, as mulheres são as mais afetadas. A associação da beleza feminina aos longos cabelos belos e sedosos é algo bem marcado”, afirma.

E considera que esse estereótipo pode chegar ao ponto da não aceitação de uma mulher sem cabelo em diversos contextos sociais (principalmente profissionais), em meios mais conservadores ou em ambientes mais seletivos e exigentes onde há que seguir o padrão. “Se não atinge a não aceitação, atinge pelo menos a reprovação, o julgamento e os olhares são muito desconfortáveis para quem os recebe”, acrescenta Cátia.

Já o médico acrescenta: "Na nossa sociedade a mulher é pressionada para um ideal de beleza não compatível com a falta de cabelo. Não é fácil muitas vezes à mulher afetada abordar o assunto. Também alguns profissionais de saúde não são conscientes das repercussões tremendas na qualidade de vida da mulher".

E sublinha: "Na minha experiência, a alopécia em fase avançada, e sobretudo na mulher jovem, é devastadora do ponto de vista psíquico e social"

Rui Oliveira Soares recomenda que as mulheres estejam atentas a certos sinais de modo a retardarem o mais possível o desenvolvimento da patologia. "Perda de densidade; zonas sem cabelo; e queda excessiva (comparada com a habitual para essa época do ano)", alerta. 

A outras mulheres que sofram da mesma doença, o conselho de Cátia é simples. “Olhem para dentro, temos mais força e beleza do que aquela que imaginamos! E... estamos juntas”.

Recomendados para si

;

Receba dicas para uma vida melhor!

Moda e Beleza, Férias, Viagens, Hotéis e Restaurantes, Emprego, Espiritualidade, Relações e Sexo, Saúde e Perda de Peso

Obrigado por ter ativado as notificações de Lifestyle ao Minuto.

É um serviço gratuito, que pode sempre desativar.

Notícias ao Minuto Saber mais sobre notificações do browser

Campo obrigatório