Fábio Miguel Malheiro Paim começou por se destacar dentro das quatro linhas, mas foi fora de campo que mais deu que falar. Após ter representado Sporting e Chelsea, 'mergulhou' no lado mais negativo da fama e chegou a gerar controvérsia, porém, desde que soube como abraçar o mundo do entretenimento, passou a sentir-se... revigorado.
Em entrevista exclusiva ao Desporto ao Minuto, Fábio Paím aceitou ser o terceiro convidado da rubrica 'Eu "show" de bola' (lançada na primeira semana de cada mês), em que se pretende perceber melhor o que faz alguém 'viajar' do desporto para o mundo do entretenimento. E que longa viagem...
O ex-avançado, que 'pendurou as botas' em 2021, chegou a ser apontado como uma grande promessa da formação do Sporting e do futebol português, inclusive com uma referência especial de Cristiano Ronaldo, mas a carreira sofreu um duro revés a partir de 2009, quando terminou a ligação aos leões, aos 21 anos.
'Atormentado' por depressões, Fábio Paím entrou no mundo das drogas e do álcool, ao ponto de ter sido preso em 2020, durante um ano, sendo que, antes disso, já havia participado em dois reality shows. A oportunidade musical e a mais recente participação no 'Big Brother Verão' surgiram na melhor altura para o antigo futebolista que, aos 37 anos, lidera a 'Palestra do Insucesso' - é lá que incentiva os jovens com o lema 'Oiçam o que eu digo, não façam o que eu fiz'.
Afinal, o que motiva alguém apaixonado pelo desporto 'abraçar' o ramo do entretenimento de forma tão diversificada? É o próprio Fábio Paím que nos explica.
Sporting? Podemos dar passos atrás para dar depois cinco ou seis para a frente. Na altura, não olhei para isso dessa maneira (...) Foi o princípio da minha queda
Ainda lhe dói não ter ido além do estatuto de jovem promessa no mundo do futebol?
Não... No passado, claro que isso doeu um pouco. Algumas pessoas falavam em tom de gozo… Foi difícil. Com o tempo, foi passando. Fui crescendo e aprendi a lidar com isso. Atualmente, não [dói]. Ficou no passado. Já tenho 37 anos e sei lidar com as coisas de outra maneira.
Aquela mítica frase de Cristiano Ronaldo ["Se acham que eu sou bom, esperem até ver o Fábio Paím"] 'massajou' o seu ego?
Na altura em que isso saiu, estávamos numa fase muito boa. O Cristiano não era o que é hoje. A frase não tinha tanto peso como teria hoje. O Cristiano, atualmente, é o maior jogador português, o maior jogador do mundo. Tem outro peso agora. Claro que fiquei agradecido. É um jogador que eu sempre gostei e admirei, mas nada disso me encheu o ego.
Fez formação no Sporting, somou empréstimos e foi parar ao Chelsea, até que terminou a ligação ao clube de Alvalade. Sente que a sua carreira acabou aí?
Sim, mas muito por culpa minha. Por vezes, voltar para trás não quer dizer nada. Podemos dar passos atrás para dar depois cinco ou seis para a frente. Na altura, não olhei para isso dessa maneira. Encarei como se me estivessem a rebaixar. Infelizmente, não tinha a cabeça que tenho hoje. Não tinha os apoios. Na altura, não levei isso como uma ajuda para trabalhar mais. Deixei de treinar e de fazer muita coisa, que deveria ter feito. Foi o princípio da minha queda.
Se eu tivesse tido a atitude e o acompanhamento certo, estaria entre os melhores [jogadores] do mundo (...) Refugiei-me no álcool e nas drogas, infelizmenteSe tivesse tido outra atitude, onde estaria neste momento?
Estaria entre os melhores do mundo, com certeza. Se tivesse tido a atitude e o acompanhamento certo, estaria entre os grandes. Com o talento que eu tinha... Não sou só eu que digo, mas toda a gente diz que, até hoje, não apareceu nenhum jogador com o meu talento. Isso já pode dizer alguma coisa. Já passaram muitos anos, mas se eu tivesse continuado a trabalhar, sim, estaria entre os melhores do mundo.
Como é que se motivou a continuar a jogar em palcos inferiores aos que já tinha estado?
Para mim, aquilo já não era motivação. Era uma forma de poder continuar a ganhar dinheiro. Era algo que eu sabia fazer e estava habituado a estar. Estava no futebol desde os sete anos e não sabia ser outra coisa que não jogador. Não sabia como viver sem ser no campo. Fui-me arrastando. Já não estava ali por prazer. Era até onde der, até onde as equipas me aceitassem. Foi um desespero em que já não sabia o que fazer.
Entramos numa parte mais sensível da sua vida, quando entrou no mundo das drogas e do álcool. Como aconteceu tudo isto?
Foram depressões. Procuramos refúgio em algo e nem sempre é nas melhores coisas. Refugiei-me no álcool e nas drogas, infelizmente. Não deveria ter sido assim, mas nem todos somos iguais. Nem todos temos as mesmas reações às coisas. Infelizmente, meti-me nesses mundos…
Fábio Paím esteve ligado ao Sporting entre 1998/99 e 2008/09 (época de empréstimo ao Chelsea) e somou 39 internacionalizações pelas camadas jovens de Portugal.© Getty Images
Os colegas de equipa que se cruzaram consigo, por essa altura, nunca o abordaram sobre o assunto?
No futebol, como costumo dizer, o jogador só pensa nele. A maioria dos colegas de equipa que tinha - se é que lhes posso chamar assim - só queria saber de si. Eu também não era uma pessoa de falar muito dos meus problemas. Cada um tinha a sua família. Cada um tem os seus amigos. Normalmente, somos mais colegas de equipa do que amigos. Querem fazer passar cá para fora que é tudo uma maravilha, mas não. Cada um pensa em si e nos seus.
Entrou no mundo dos reality shows em 2017, pela porta do 'Love on Top', na TVI. O que o levou a entrar nesse formato?
Um colega meu tinha-me feito um convite para participar. Eu também já tinha curiosidade por esse mundo. Acabei por aceitar, pela curiosidade.
Seguiu-se o 'Luta pela Fama', um reality show de Angola, em 2019, em que foi expulso por agressão. O que aconteceu?
Era parecido ao Big Brother [risos]. Eu não bati em ninguém, não toquei em ninguém. A rapariga estava a gritar-me aos ouvidos. Tirou-me do sério e atirei-lhe umas cartas. Foi por causa disso que fui expulso. Às vezes, as nossas reações não são o que a gente quer. Ela até continua a ser minha amiga. Não sou uma pessoa agressiva, apenas reagi ao que aconteceu.
Prisão? Ajudou-me muito. Sou muito agradecido. Diziam que a cadeia era um sítio complicado, mas se conseguirmos tirar o proveito do que aprendemos lá… Já depois destas duas participações em televisão, o Fábio foi preso por tráfico de droga, em 2020. Explique-nos o que sentiu nesse dia...
Andava na fase de consumos… A minha vida não estava a ser a mais correta. Meti-me nesse mundo... O consumo de droga não é barato e meti-me a vender para o consumo próprio. Soube que a polícia estava numa investigação e aconteceu isso. Como já disse, sou culpado. Agora alerto os outros miúdos para não se meterem [no mesmo caminho]. Por vezes, só pensamos na fama e no dinheiro. Não pensávamos como estava a cabeça das pessoas. Meti-me nesse caminho e paguei por isso. Agora tenho mais oportunidades, mas até há pouco tempo ainda andava a ser difícil. Tenho andado a lutar para ser melhorar, para ser uma pessoa melhor e para ajudar as outras crianças.
Aquele ano em que esteve preso ajudou-o a ser o que é hoje?
Ajudou-me muito. Sou muito agradecido. Só me diziam que a cadeia era um sítio complicado, mas se conseguirmos tirar o proveito do que aprendemos lá… Nós temos de lutar pelas nossas oportunidades. Fui bem recebido pelos presos. Ajudaram-me a ver que aquilo não era um sítio para mim. Quando saí, fui à procura de um trabalho no Algarve. Comecei a trabalhar na Rua da Oura [Albufeira]. Chamava pessoas para a discoteca. Foi muito importante para mim ter passado por aquilo [detenção]. Quando fui preso, no momento, pensei que era o fim do mundo. Pensei que nunca mais me iria reerguer, mas felizmente consegui.
Apesar de tudo, voltou a jogar e teve a sua última aventura da carreira de futebolista na Polónia, ao serviço do LZS Starowice (2020/21). Era o momento certo para 'pendurar as botas'?
Depois de sair da prisão, voltei a jogar. As coisas estavam a correr bem, queriam renovar comigo e o meu empresário enganou-me. Mais uma vez, fui na conversa dos empresários e decidi não voltar a jogar mais. Disse-me que tinha um contrato para mim, na Moldávia. Rescindi com o clube onde estava e, quando cheguei à Moldávia, não tinha nada... Decidi procurar outra coisa para fazer, até pela minha idade [33 anos na altura]. Já não era novo... [risos] Não posso mentir. Por culpa de muita coisa que fiz mal, o meu corpo já estava a dar sinal, com muitos problemas de saúde.
Diziam que eu era ator pornográfico. Isto espalhou-se de tal maneira que eu disse 'Já que estou a ter a fama, vou ter o proveito' [risos]Já longe do futebol, decidiu aventurar-se num filme erótico, algo que deu muito que falar. Era um desejo antigo?
Não... Vou ser sincero, sou uma pessoa que gosta muito de desafios. Eu tenho parcerias com motéis e coisas do género. Tive de ir fazer uma sessão fotográfica num motel, com raparigas que trabalham nesse ramo. No dia a seguir, os jornais e as televisões já diziam que o Fábio Paím era ator pornográfico e que já tinha feito um filme para adultos. Eu não tinha feito nada... Foi apenas uma sessão fotográfica. Isto espalhou-se de tal maneira que eu disse: 'Já que estou a ter a fama, vou ter o proveito' [risos]. Foi assim que eu acabei por fazer o filme. Não me arrependo. Foi algo engraçado, com duas atrizes espetaculares. É mais uma coisa que fica marcada na minha vida.
Voltaria a fazer algo do género?
Não, não... Não tive necessidade [na altura]. Foi curiosidade. Foi algo que quis fazer. Fiz o filme e as pessoas não levaram isso tão a sério. Não quero ser chamado de ator pornográfico, se bem que nem era o caso. Aquilo foi um filme erótico. Quem quiser ver, vai perceber que não é o que as pessoas pensam.
Lançou ainda a música 'Tipo Fábio Paím', em outubro de 2024. Pensava em ser cantor?
A verdade é que, quando gostava de cantar, não tinha voz para ser um cantor. Só que as coisas evoluíram tanto e realizei mais um sonho, o de fazer uma música. Foi um sucesso. Vou lançar mais uma ou duas. Nos próximos meses? Sim. Estamos a tratar das coisas para que isso aconteça.
No passado mês de julho, entrou no 'Big Brother Verão', da TVI, ao lado de Bruno de Carvalho. Como começou essa relação?
O meu presidente… [risos] A relação que tenho com ele já é cá de fora. Eu já falava muito com o Bruno. Infelizmente, o pai dele está muito doente e eu não tinha noção que ele ia entrar [no programa]. É uma relação de amizade e de carinho. O Bruno é uma pessoa muito especial. Não tinha ligação com ele quando era presidente [do Sporting]. Sempre o admirei, como é óbvio. Gosto da maneira como ele é carinhoso e humilde. É mesmo um amigo. Quando ele gosta, gosta. Gosto de pessoas assim, que nos querem levar para a frente, que nos ajudam a crescer e que nos chamam à razão quando não a temos. Era algo que eu precisava na vida há muito tempo.
O que aconteceu para ter entrado lesionado na casa mais vigiada do país?
Parti o calcanhar. É uma lesão muito chata. Entrei na casa ainda sem fazer fisioterapia e nem podia ir para a piscina. Agora, vou fazer fisioterapia porque já consigo andar. Perdi muito músculo. Tenho de fazer os meus tratamentos para voltar ao sítio e ficar como antes. Saí de lá de muletas, mas saí a andar muito melhor.
Acho que saí de lá ['Big Brother Verão'] uma pessoa melhor, com mais controlo das emoções e a aguentar situações de pressão. É uma das coisas que tenho trabalhado e na casa ajudou-me muitoEntre brincadeiras e discussões, o Fábio excedeu-se em alguns momentos mais polémicos. O que faria de diferente?
Talvez conseguir falar mais sobre as coisas que tenho guardas dentro de mim e melhorar o poder de encaixe. Ali, aprendemos a ter poder de encaixe. Estamos com pessoas que não são do nosso mundo. Levam o programa como um jogo, como dizem. Eu entrei sem jogo, apenas como Fábio. Quando me viam [nesses momentos], era um Fábio provocado e com o ego mexido. Quando assim é, ninguém é de ferro. Aprendi a controlar-me em situações de stress. Não dormimos bem, não nos alimentamos da melhor forma e levamos com as mesmas pessoas durante 24 horas por dia. Há pessoas que nos conseguem levar ao limite. Acho que saí de lá uma pessoa melhor, com mais controlo das emoções e a aguentar situações de pressão. É uma das coisas que tenho trabalhado e na casa ajudou-me muito.
Sente que o 'Big Brother Verão' o ajudou para 'limpar a imagem' que tinha?
Sem dúvida, sem dúvida. Por comparação aos outros concorrentes, a minha página de Instagram foi a que mais cresceu. Sou uma pessoa que digo não tenho grande à vontade para falar e que não sou muito culto, mas as pessoas gostam de mim e a TVI está a dar-me a mão. Tenho ido ao programa comentar. Isso quer dizer alguma coisa. As pessoas falam comigo na rua e penso que isso [o programa] foi espetacular para mim. Deu para mostrar quem eu sou. Um miúdo tranquilo, com as suas falhas, claro. Não é só polémicas. Tenho um estilo diferente daquele que tinha e estou a mudar, mas preciso de tempo para ser melhor a cada dia e não voltar a ser o Fábio que era.
O que acha que esta fase pós-Big Brother pode dar de positivo ao Fábio no futuro?
Já está a dar. Tenho a minha família perto de mim, de volta. É o mais importante. Posso continuar a ter exposição para poder continuar os meus trabalhos. Tenho pessoas muito boas à minha volta que me têm ajudado a ter outra exposição para poder crescer na carreira musical, nas palestras e em tudo aquilo que gosto de fazer. A 'Palestra do Insucesso' consiste em trabalhar com os miúdos. É o que eu mais amo fazer. Posso-os ajudar da melhor forma, para que tenham aquilo que eu não tive: ter uma pessoa como eu, que já passou pelo que passou, mas que dá a cara para ajudar as pessoas.
Palestra? Nem todos vamos ser Cristiano Ronaldo. Quem está no mundo do futebol é que quer vender isso.De que forma a 'Palestra do Insucesso' está a ajudar o Fábio?
Eu já gostava de ajudar os jovens quando jogava. Os jovens são o nosso futuro. Encaminho os miúdos para que não caiam nos mesmos erros que eu e para que não tenham as mesmas ilusões. Sempre me 'pintaram' o futebol como se fosse a coisa mais bonita do mundo, mas... Há esse lado, mas tem mais de insucesso do que de sucesso. Nem todos vamos ser Cristiano Ronaldo. Quem está no mundo do futebol é que quer vender isso.
Detalha toda a sua história a esses jovens nas palestras?
Sim, conto-lhes a minha realidade. Não vou para ali contar mentiras. De outra forma, não estaria a ser fiel comigo próprio e com os miúdos. O que vemos, muitas vezes, é muita mentira. Não é correto.
Sente-se julgado por quem o ouve?
Não, muito pelo contrário. Pode acontecer ser julgado por alguns pais [dos jovens], que têm ideia que os filhos podem, às vezes, tirá-los de alguma miséria. Não podem obrigar os miúdos a serem o que não querem. Por vezes, os pais olham para aquilo que fiz na vida e julgam. Têm de entender que eu estou ali, mas não é para os miúdos serem como eu, que não fui exemplo para ninguém. É precisamente para os miúdos não fazerem o que eu fiz. É completamente diferente. Estou a dar cara para ajudar. Não quero que eles sejam como eu, que não passem pelo que passei e que os pais passem o que a minha mãe passou. Não vou conseguir ajudar todo o mundo, mas se conseguir ajudar uma ou duas crianças, para mim, já é ótimo.
Após o fim da experiência no 'Big Brother Verão', Fábio Paím continua a aparecer no ecrã, como comentador do reality show da TVI. © Reprodução Instagram Fábio Paím
Para além de tudo isso, pretende manter-se ligado ao mundo da televisão?
Não é algo que eu tenha em mente. Não estudei para isso. Gosto de estar ligado a podcasts e marcas de roupa, não tanto à televisão. Nunca se sabe. Se houver oportunidades, estou disponível para trabalhar. Se alguém achar que posso entrar em alguma coisa, estou disponível.
Pensa em algo fora do universo 'Big Brother', num outro ramo do entretenimento?
Adorava fazer uma novela ou um filme. Adorava poder ter essa experiência, como é óbvio.
O jogo do 'Prefere...?'
Prefere estar no mundo do entretenimento ou no mundo do desporto?
Atualmente, prefiro estar no entretenimento, na música.
Prefere ser reconhecido no futuro por aquilo que fez na televisão ou pelo deu que falar como futebolista?
Preferia pelas minhas palestras, não sei se vale. Fui falado pelos dois lados, mais pelo que fiz no campo, mas atualmente pelo 'Big Brother', com visibilidade do lado bom. Não é do lado mau. O jogador fez muita porcaria e acho que as coisas agora estão a mudar.
Prefere conquistar um troféu ou vencer um programa televisivo?
Vencer um troféu como jogador, claro. Um programa de televisão não é algo que se possa vangloriar tanto.
Todas os meses o Desporto ao Minuto apresenta-lhe uma nova edição da rubrica 'Eu "show" de bola', em que se pretende perceber melhor o que faz alguém 'viajar' do mundo desportivo para a arte do entretenimento.
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