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A opinião de Gonçalo Almeida: O futebol e as finanças

O espaço de opinião de Gonçalo Almeida no Desporto ao Minuto, no qual o ex-advogado FIFA analisa os temas que marcam a atualidade do ponto de vista do direito desportivo.

A opinião de Gonçalo Almeida: O futebol e as finanças
Notícias ao Minuto

14:29 - 17/07/20 por Gonçalo Almeida

Desporto Exclusivo

Esta semana, tomámos conhecimento da decisão do Tribunal Arbitral do Desporto de Lausanne (Court of Arbitration for Sport - CAS) no âmbito do processo que opunha o Manchester City FC à Union of European Football Associations (UEFA) e na sequência do recurso apresentado pelo clube Inglês contra a decisão proferida em primeira instância pela Adjudicatory Chamber of the UEFA Club Financial Control Body (UEFA CFCB), que o havia excluído das competições organizadas pela UEFA durante duas épocas desportivas e lhe aplicou uma multa equivalente a trinta milhões de Euros, nomeadamente em virtude de um alegado incumprimento das regras de fair-play financeiro (Financial Fair Play – FFP) constantes do processo de licenciamento de clubes da UEFA.

Alegadamente, terá o Manchester City FC inflacionado as suas receitas de patrocínio, nomeadamente do seu patrocinador principal, a Etihad Airways, companhia área propriedade dos Emirados Árabes Unidos, com o propósito de encapotar algum financiamento por parte do seu acionista maioritário, o Sheikh Mansour bin Zayed Al Nahyan, membro da família real de Abu Dhabi.

Nesse alegado contexto, concluiu o UEFA CFCB que tal estratégia visava contornar a norma do break even financeiro, a qual, de forma resumida, determina que os clubes de futebol filiados nas cinquenta e cinco (55) federações-membro da UEFA e que pretendam participar nas competições por si organizadas, nomeadamente, a Liga dos Campeões ou a Liga Europa, devem depender apenas de receitas próprias, não podendo estas ser superadas pelos custos inerentes à sua atividade. Foi assim o clube Inglês condenado pela violação das regras do FFP e, concomitantemente, pelo incumprimento grave do dever de colaborar com a investigatory Chamber do CFCB, o órgão de investigação da UEFA, responsável no âmbito destas matérias.

Em sentido contrário e para absoluta surpresa de muitos, decidiu o CAS absolver parcialmente o Manchester City FC, não considerando como provada a referida acusação quanto ao incumprimento do FFP ou decidindo pela prescrição de parte da acusação, tendo ainda assim condenado o clube Inglês pelo incumprimento do dever de colaboração, com a aplicação de uma multa equivalente a dez milhões de Euros.

Apesar de algo surpreendente, tal decisão do CAS encontra-se longe de ser inédita, uma vez que ainda recentemente, o Paris Saint-Germain FC, na sequência das transferências milionárias dos jogadores Neymar Júnior e Kylian Mabppé, num processo em que tudo apontava para a condenação do clube igualmente pelo incumprimento das regras do FFP, acabou por ser absolvido junto do mesmo CAS, por questões do foro processual.

Ora, toda esta dinâmica em torno do fair-play financeiro, reflete a extrema importância de que se reveste a sua natureza e estrito cumprimento, sendo esta uma matéria cada vez mais atual, exigente e necessariamente melhor regulada, nomeadamente ao nível do processo de licenciamento de clubes para efeitos de participação nas competições europeias organizadas sob a égide da UEFA, mas igualmente ao nível de competições nacionais, tal como sucede em Portugal para efeitos de participação nas competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional, a qual possui um sistema de licenciamento próprio, necessariamente condizente com a natureza profissional das competições por si organizadas.

Tais processos de licenciamento abraçam, de um modo geral, diversas matérias, tais como, entre outras, desportivas, infraestruturais e financeiras. Multidisciplinariedade da qual resulta inevitavelmente um processo algo complexo, embora cada vez mais desejável e compreensível, tanto a nível nacional como internacional. Não sendo de estranhar que o princípio do FFP seja aquele que mais frequentemente suscita questões conturbadas e que facilmente gera interpretações distintas, culminando, não raramente, em processos de natureza litigiosa.

Mas independentemente da sua complexidade, dificuldades de implementação ou de cumprimento por parte dos clubes, creio ser pacífico defender a enorme importância prática de que se revestem os processos de licenciamento no futebol, por ora instituídos em Portugal somente ao nível das competições profissionais de futebol, em particular, se atendermos à necessidade absoluta de (tentar) regular financeiramente uma indústria, como é o futebol, na qual, à semelhança da esmagadora maioria das restantes atividades, o dinheiro tem uma enorme preponderância, a qual pode afetar, de forma gravíssima, a estabilidade das competições e, inclusivamente, os respetivos resultados desportivos.

É precisamente a denominada verdade desportiva, a prioridade das prioridades para o futebol e sua indústria, que importa salvaguardar a todo o custo. Nem que para tal, os sistemas de licenciamento impliquem, em última instância, a implementação de severas sanções desportivas e financeiras, quando deparados com casos de grave e reiterado incumprimento, a que infelizmente ainda assistimos tanto no panorama nacional, como internacional, pese embora toda uma evolução, diga-se em bom da verdade, bastante positiva, ao longo da última década.

E quanto mais não seja, na salvaguarda da viabilidade económico-financeira dos próprios Clubes, noção abrangente, e para o efeito ainda com maior pertinência, às Sociedades Desportivas. E por inerência, a todos os seus trabalhadores, incluindo, claro está, os seus praticantes desportivos. Ou até em termos de melhoramento dos seus desempenhos financeiros, incentivando-se uma melhor gestão e, consequentemente, maior credibilidade para a indústria, credibilidade essa que se refletirá, naturalmente, nas próprias competições desportivas.

Enfim, penso ser evidente que o caminho a percorrer neste contexto desportivo-financeiro é ainda bastante longo, particularmente se considerarmos que alguns destes mecanismos de controlo são novidades recentemente introduzidas por muitas Ligas de Futebol/Associações Nacionais e que matérias como o FFP encerram enormes dificuldades per se, principalmente ao nível da investigação, perante as enormes e frustrantes limitações com que os órgãos de investigação se deparam ao nível do acesso à prova, e a que o referido processo UEFA v. Manchester City FC não escapou.

Todavia, em minha opinião, no futebol, tal como na vida, as adversidades com que nos deparamos ou as dificuldades com que os sistemas de licenciamento se deparam, não podendo ser ignoradas ou menosprezadas, devem ser encaradas enquanto desafios, sempre com o fito de se evoluir positivamente, e no caso do licenciamento em particular, para uma regulação mais rápida e eficaz na defesa dos próprios Clubes e, claro está, da verdade desportiva.

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