Numa entrevista à agência noticiosa espanhola EFE, publicada hoje, Moya salientou que o poeta luso pode ser visto como "a chave para encaixar esse puzzle" que é o homem ou então, pelo menos, se familiarizar com ele.
Moya, que já publicou as traduções de outros heterónimos de Fernando Pessoa, como Alberto Caeiro e Álvaro de Campos, acaba de dar à estampa a coleção "Visor de Poesia", a versão espanhola de "Odes de Ricardo Reis", baseado noutro dos heterónimos do poeta português e no livro "O Ano da Morte de Ricardo Reis", de José Saramago.
"[Fernando] Pessoa é um escritor com muitas caras. Não há um dia que não surpreenda ou que não irrite. Na vida, todos aparentamos ser apenas uma peça, mas, no fundo, sabemos que as coisas não vão por aí, que somos um puzzle", disse o tradutor.
Moya também já publicou uma tradução espanhola do "Livro do Desassossego", definindo a obra como "fantástica" e referindo que se pode abrir e ler em qualquer página.
Sobre "Odes de Ricardo Reis", o tradutor de Fernando Pessoa considerou este heterónimo como "autor" de alguns dos melhores poemas de toda a obra "pessoana".
"Alguém disse que [Ricardo] Reis era o melhor poeta clássico português. Desde logo, porque é classicista, mas, cuidado, é também o mais secreto. Alguns dos melhores poemas de Pessoa levam a sua assinatura. Talvez seja a sua poesia mais filosófica e mais elaborada, o que nem sempre é melhor", considerou.
"Acredito que [Ricardo] Reis é o que apresenta mais tendências e interpretações ocultas dos personagens que [Fernando] Pessoa criou. De todas as suas criaturas era a que mais se parecia com o próprio Pessoa", acrescentou.
Questionado sobre qual dos heterónimos, incluindo o próprio Pessoa, pensa que está mais próximo de si, Manuel Moya afirmou não ser fácil responder.
"Os três são muito distintos. Melhor dito, os quatro são muito distintos. Mas, sem dúvida, o que menos me interessa é o Fernando", respondeu.
Para o tradutor espanhol, Álvaro de Campos começa sempre "com ímpeto", mas acaba por acalmar-se.
"Tende, depois, para essa coisa tão portuguesa e tão indefinível, que é a saudade. Comove quase sempre. Basta ler o poema 'Estanco' para se perceber o que estou a dizer", afirmou.
Quanto a Alberto Caeiro, o tradutor espanhol considera que o heterónimo "evolui, mas acaba sempre por morrer".
"Mas é um poeta com uma clareza mental que a mim me deixa em suspenso. [Ricardo] Reis o mais limitado dos quatro, é frequentemente sublime, pois é emocionalmente mais próximo de Pessoa, em vez do contrário. E, claro, Bernardo Soares, autor do 'Desassossego'", sintetizou.
Nas diferenças entre Ricardo Reis e Álvaro de Campos, o também poeta espanhol destaca o "caráter expansivo e a força mental" do segundo.
"[Ricardo Reis] é a medida, a forma, a regularidade. No fundo, complementam-se. Reis, que ao princípio me parecia muito espartilhado, acabou por me vencer com a sua melancolia e ternura. Dos heterónimos, creio que é mentalmente o mais próximo de Pessoa. Campos é o mais distante e isso era o que me metia permanentemente em problemas", concluiu.