"Portugal influencia tanto o meu trabalho que sinto ter de dar em troca"
Aos 29 anos, a cineasta portuguesa Inês Pedrosa e Melo prepara-se para embarcar numa nova fase da sua vida, dividida entre a Califórnia e Lisboa. Ao Notícias ao Minuto, fala sobre as suas influências, os seus sonhos de um dia vir a dar aulas e o filme em que está a trabalhar atualmente.

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Cultura Cinema documental
Inês Pedrosa e Melo tem 29 anos e divide a sua vida entre a Califórnia e Portugal. É de Coimbra, mas cedo rumou a Lisboa, de onde o trampolim transatlântico a fez aterrar no estado norte-americano 'onde as estrelas nascem'. É lá que faz a sua carreira cinematográfica, com trabalhos de cinema documental, olhando para os Estados Unidos e para Portugal em simultâneo.
Um dia, quer ser professora, até já deu algumas aulas, e o derradeiro passo arranca agora, no doutoramento em Film and Digital Media, na University of California Santa Cruz, com o apoio de uma bolsa que a fundação La Caixa decidiu atribuir-lhe.
Em entrevista ao Notícias ao Minuto, fala das suas ambições, do seu mais recente filme - que está ainda a ser realizado -, das suas influências e do significado que fazer cinema e transpor importantes mensagens para o grande ecrã tem na sua vida.
Como é que se gere a vida entre Lisboa e São Francisco?
Eu já cá estou há algum tempo, portanto, tem-se tornado mais fácil. Normalmente, quando falo com as pessoas, acaba por ser sempre o mais tarde possível para elas, mas não sou adversa a entrevistas madrugadoras. Aliás, a entrevista para a bolsa da fundação La Caixa foi às duas da manhã e eu estava cheia de medo, na altura, de adormecer, então não dormi nada. [risos]
É uma coisa que se gere e uma pessoa se habitua. Já sei que a partir da uma, duas da tarde já não vale a pena esperar respostas a e-mails.
Mas no início, com certeza, era estranho, não?
Sim, até porque a noite é quando acabamos por ter mais tempo. Nesse sentido, às vezes fazia - e ainda faz - falta sentir aquele pensamento de 'Ah, cheguei a casa' e ligar aos pais ou a uma amiga. Esse aspeto, lá está, não existe, mas pronto, liga-se de manhã, uma pessoa adapta-se.
O que acontece em São Francisco é que as coisas começam e acabam todas mais cedo. Eu habituei-me a acordar às 5/6 da manhã... tudo acontece mais cedo. O almoço, o jantar... as pessoas saem do trabalho mais cedo. Portanto, na verdade, até nem faz tanta diferença, porque acabei por adaptar-me.
Esclareça-me aqui como foi, cronologicamente, o seu percurso nos Estados Unidos. Ou seja, quando foi a primeira vez foi ficou aí a longo prazo, onde tem estado...
Vou começar mesmo pelo início. [risos] Sou de Coimbra, mas fiz o liceu em Lisboa, onde também fiz a licenciatura em Ciências da Comunicação, na NOVA FCSH.
Comecei também a fazer o mestrado em Antropologia Visual e a trabalhar ao mesmo tempo. Entretanto, ganhei uma bolsa da Fulbright, já em 2016, e foi aí que vim para os Estados Unidos pela primeira vez, fazer o mestrado em Documentário em Stanford.
Fiz o mestrado entre 2017 e 2019 e, depois, fiquei cá (EUA) mais um ano a trabalhar. Depois, em outubro de 2020, na altura da pandemia da Covid-19, voltei para Portugal e, em junho de 2021, voltei para cá.
O meu primeiro estágio, há muito tempo, foi na parte da comunicação empresarial, mas senti que era o cinema que queria fazer. A maior parte do meu percurso profissional tem sido feito cá. Quando voltei, no verão de 2021, vim com um visto de artista, o que eles chamam de visto de 'Capacidade Extraordinária', não se deve ligar muito ao valor dessas palavras. [risos]
Vim trabalhar em cinema documentário mas, para além da realização fazia edição de vídeo em documentário e também em companhias de tecnologia como a Google. Foi o que estive a fazer aqui até ganhar a bolsa e, agora, vou para a universidade em Santa Cruz, que é aqui perto.
Perto em termos americanos, não é?
Pois, exato, é perto nas dimensões dos Estados Unidos (A University of California Santa Cruz fica a pouco mais de 120 quilómetros do centro de São Francisco). [risos]
A questão de fazer edição para empresas de tecnologia, pode-se dizer que é equiparável ao cliché dos fotógrafos artísticos que fotografam casamentos para pagar as contas no fim do mês?
Sim, completamente. Obviamente não é, de todo, a minha paixão, mas é de onde vinha a maior parte da minha remuneração. É completamente só um trabalho para pagar as contas, já não o faço, mas servia para poder continuar a trabalhar nos meus projetos e financiar outras iniciativas.
Como é que se chega ao ponto de poder viver só dos projetos? É um setor bastante precário, pelo menos em Portugal...
Eu nem sei se já cheguei a esse ponto. [risos] É preciso muito 'hustle' (luta). Trata-se de uma cultura de fazer autopromoção que me permitiu conseguir chegar a rendimentos para ter uma vida com conforto suficiente.
Há mais oportunidades aqui, acho que isso é evidente. Eu nunca tentei fazer o que fiz aqui em Portugal e não sei se chegaria ao mesmo sítio. Talvez sim, mas não tenho a certeza. Aqui há mais oportunidades, mas também há outras coisas que dificultam mais a vida, como os custos mais altos, o acesso à saúde... a incerteza ao nível do tecido social e da nossa rede de apoio do estado social que, na Europa, nos é dada.
É, realmente, uma luta e, nos últimos meses, com a crise económica e os cortes nas empresas de tecnologia, têm-se sentido impactos muito significativos. E, aliás, as greves que estão a decorrer, atualmente, são sinal disso. É muito complicado. Tentamos sempre lutar por mais e ir fazendo 'networking', que é aquela palavra chata de que toda a gente gosta tanto de falar.
Qual é a sua posição sobre essas greves dos argumentistas e dos atores de Hollywood? Se bem que não é exatamente a sua área...
É mais na parte da ficção, não é a área onde tenho trabalhado, mas posso dizer que, tomando em conta aquilo que pedem, faz absolutamente todo o sentido. A questão dos direitos de autor, como existe noutras indústrias, também deve existir aqui. A verdade é que, quando pensamos na greve dos guionistas de 2006, a realidade da televisão é muito diferente. Estamos a falar de contextos em que, se as séries, antes, passavam na televisão durante um ano e depois acabavam, agora estão, permanentemente, à disposição de todos com as plataformas de streaming.
Então quando metemos a inteligência artificial aqui à baila, realmente a ameaça que isso traz ao panorama da criatividade, na edição de vídeo, na escrita e na realização... até no que toca aos atores. Agora há ferramentas que imitam as vozes dos atores, e isso é muito problemático.
Não há regulação absolutamente nenhuma, estamos num panorama completamente diferente e isso tem de ser regulado, de alguma forma. Nos Estados Unidos, tudo o que é regulamentação governamental é algo de que toda a gente tem medo, mas é absolutamente necessário. Gostava que houvesse mais energia por parte do estado, mas acho que isso aqui é impossível. Sendo assim, acho que têm todo o direito a continuar a greve.
O que é que isto significa para a parte de documentário da indústria?
Historicamente, isso até tem querido dizer que para o pessoal do documentário, há mais trabalho. Em 2006 e 2007, as greves geraram um 'boom' de 'reality TV' e de documentários, mas não acho que seja justo que a indústria documental lucre com isso, portanto mantenho-me solidária para com a greve e espero que saia algo positivo daí.
Acho que consigo trazer, de certa forma, alguma sensibilidade europeia, digamos assim, para os filmes que faço sobre os EUA
Regressando agora às suas obras, como é que sente que a vida nos Estados Unidos, misturada com a herança de viver em Portugal, tem afetado a criação dos filmes? A sua linguagem, digamos.
A maneira de fazer e pensar cinema nos EUA é relativamente - para não dizer bastante - diferente, comparativamente à Europa. A questão do tecido social e a maneira como os EUA existem como país faz muito parte dessa realidade também. Estou a trabalhar num projeto agora que está diretamente relacionado com o tecido social dos EUA. Acho que consigo trazer, de certa forma, alguma sensibilidade europeia, digamos assim, para os filmes que faço sobre os EUA. Mas também faço muitos filmes sobre Portugal, sobre a minha identidade e sobre a história e as heranças culturais do nosso país.
Portanto, por um lado, faço filmes nos EUA que são um bocadinho diferentes dos filmes que, normalmente, se fazem cá. O meu cinema é um que reflete mais sobre si próprio, que indaga mais sobre grandes questões da Humanidade e da sociedade, em vez de ser necessariamente tópico. O cinema documental nos Estados Unidos consegue ser muito tópico. Quando digo tópico é sobre temas importantes, mas no momento.
O filme em que estou a trabalhar agora, por exemplo, é um sobre um tema importante, do momento, mas não o estou a abordar de uma forma tradicional.
Por outro lado, os filmes que faço sobre Portugal e com temáticas portuguesas são sempre à volta daquela ideia de que quando se está longe, de fora, se consegue ver as coisas de uma forma diferente. A verdade é que estar aqui também me permitiu uma distância crítica e uma maneira de ver as coisas de forma diferente.
O filme 'Home, revisited' é uma compilação de vídeos caseiros, que poderiam ser considerados, individualmente, banais, comuns... como é que se pega numa mão cheia destes vídeos e se conta uma história com a qual uma sala de cinema inteira se pode identificar, mesmo que não sejam os vídeos caseiros da sua família e da sua vida?
O filme é quase uma análise sobre as imagens, mais do que tentar fazer algo novo com elas. Isto começou quando estagiei na Videoteca Municipal de Lisboa, em 2016. Na altura, tornou-se no meu projeto de mestrado em Antropologia, que demorou, mas foi feito.
Na verdade, aquelas imagens significavam muito para mim, da mesma maneira que o José também vê nelas coisas muito portuguesas e começa a pensar em coisas da sua família e da cultura com que se relaciona.
Na altura, via aquilo e pensava o quão bonitas eram aquelas imagens, mas também o quão complicado era fazer um filme com elas. Não só porque sentia que eram pessoas a sério, até porque eu conhecia os donos daquelas imagens, mas também porque havia uma responsabilidade que recai em nós, enquanto cineasta, quando trabalhamos imagens dos outros. Na verdade, o filme, que foi parte do meu mestrado em Antropologia, uma espécie de etnografia do ato de fazer cinema de apropriação, que é fazer cinema com imagens de arquivos, ou que não são nossas.
Acabou por ser mais uma espécie de ensaio visual, em que as imagens reagiam a uma série de indagações que ia fazendo a outros realizadores, que trabalham muito com imagens de arquivo. É um filme sobre o cinema e a maneira de fazer cinema e também sobre a nossa herança do cinema em Portugal. Mas é como diz, uma responsabilidade, algo que temos de pensar profundamente quando fazemos filmes com imagens dos outros. Temos as vidas e as imagens dos outros nas nossas mãos, independentemente de já terem morrido, por exemplo. É uma questão que também faz muito parte do meu trabalho.
Foi nessa procura do meu próprio enclave que encontrei naquele outro enclave [Chinatown, em São Francisco] uma coisa bonita de representar
A questão etnográfica é uma das caraterísticas principais do seu trabalho. Deixe-me ir aqui buscar um projeto seu já com alguns anos, que até foi em fotografia, não em vídeo. Chama-se 'Enclave'. Que memórias ficaram dessa viagem pelos bairros étnicos de São Francisco?
Ui, já foi há algum tempo. Foi nos primeiros anos em que, eu própria, como estrangeira, estava à procura do sítio onde fazia sentido, para mim, estar. Um enclave é uma espécie de um bairro, uma pequena região, um sítio que se identifica com uma coisa que é diferente daquilo que está à volta. Que simboliza uma cultura e uma realidade específica diferente do que está à volta. Chinatown, em São Francisco... lá está, quando eu vim para os Estados Unidos pela primeira vez, nunca tinha saído da Europa. Então nunca tinha estado num bairro como uma Chinatown. Temos certos bairros em Lisboa que têm caraterísticas culturais mais marcadas, mas não da mesma forma histórica, até, como a Chinatown de São Francisco tem, talvez a primeira dos Estados Unidos.
Sempre me fascinou muito passear por lá, foi dos primeiros sítios onde andei quando cheguei... e tem uma vida muito própria, onde as pessoas existem nas suas vidas. Há muito pendor turístico, e as pessoas vão lá espreitar, mas eu admirava como é que continuavam, ainda assim, as suas vidas ali, sem se deixarem incomodar por aquilo que outros, e eu própria, estávamos a fazer. Foi nessa procura do meu próprio enclave que encontrei naquele outro enclave uma coisa bonita de representar. Agora já não faço tanto, mas na altura fazia muito fotografia de rua e foi um prazer poder tirar fotografias ali.
Só me apercebo das minhas inspirações nos momentos de desespero... não sou religiosa, mas é quando faço uma reza a um qualquer mentor
Encontrar um enclave noutro é um conceito engraçado, muito ligado a pessoas que vivem noutros países e que, de certa forma, se sentem ligadas a outros estrangeiros que também estão longe dos seus países, ainda que venham de sítios diferentes.
São Francisco é uma cidade muito peculiar, podia estar horas a falar aqui da cidade... Chinatown é uma zona intocável, há gentrificação que acontece à volta mas ali não pode entrar, porque está protegida, então é um contraste muito interessante com o resto da cidade.
Voltando ao seu cinema... que figuras a inspiraram - ou inspiram, atualmente - ao longo da carreira?
Só me apercebo das minhas inspirações nos momentos de desespero... não sou religiosa, mas é quando faço uma reza a um qualquer mentor...
É o típico ateu até que o avião começa a cair, não é?
Exato. [risos] Pessoalmente, enquanto cineasta estrangeira que faz filmes nos EUA, olho muito para o trabalho de cineastas, também estrangeiros, que fizeram trabalhos nos EUA. Falamos de Wim Wenders, a Agnès Varda, a Chantal Akerman... todos cineastas que fizeram filmes nos EUA. Todos eles são uma grande inspiração para mim, tanto em termos filosóficos como em termos de estilo de cinema. A maneira como se relacionam com os sítios onde filmam e como trazem ao de cima essas imagens dos EUA que eu tento captar agora, é muito interessante para mim.
Também tenho muita ligação à literatura, de certa forma, especialmente à literatura de não-ficção. O primeiro livro de não-ficção que me tocou foi o 'Vozes de Chernobil', da Svetlana Alexievich. Todo o trabalho dela de entrevistar pessoas e tornar o discurso delas em prosa é algo que eu incorporo bastante no meu trabalho, especialmente no filme que estou a fazer agora, que tem uma dimensão até quase de ficção, mas que incorpora elementos do documentário.
Depois, o cinema português tem pessoas que eu admiro bastante, nomeadamente a Susana de Sousa Dias, que é uma cineasta documental que trabalha muito o arquivo e alguém para quem olho muito. Podia continuar, só que estávamos aqui o dia todo...
Somos portugueses, temos um país muito pequeno e vir para os EUA lidar com o tamanho do país e com as dificuldades no acesso a saúde pública foi uma realidade que me bateu muito forte quando cheguei
Fale-me do filme que está a fazer agora, como está a correr? Dificuldades?
Oh pá... [risos] O filme que estou a fazer agora é uma curta, com título em debate, mas, até agora, chama-se 'Unravelling'. É sobre o aborto nos EUA, mais especificamente sobre a experiência de viagem para conseguir fazer um aborto. Somos portugueses, temos um país muito pequeno e vir para os EUA lidar com o tamanho do país e com as dificuldades no acesso a saúde pública foi uma realidade que me bateu muito forte quando cheguei.
E eu estava na Califórnia, num campus, numa zona central cheia de serviços e já sentia, às vezes, a dificuldade de deslocação, quanto mais depois situações de mulheres em diferentes estados, muito longe de clínicas onde podiam fazer abortos. E eu queria investigar isso.
Nos últimos anos, aconteceu muita coisa, nomeadamente o fim do aborto nos EUA enquanto um ato protegido pela lei federal, o que fez com que vários estados acabassem, ou limitassem, o aborto até uma certa quantidade de semanas. Ficamos, então, numa situação em que há ainda mais mulheres a viajarem para conseguirem fazer um aborto. Agora temos uma dimensão em que há estados a querer proibir isso, portanto estamos a entrar numa coisa ainda mais distópica de uma realidade em que ficamos pior do que o que estamos agora e no passado. E, à partida, não devíamos estar nesta situação. Devíamos estar sempre a evoluir, para coisas mais positivas, sempre coisas melhores, em vez de ter retrocessos nos nossos direitos.
Portanto, o filme é uma espécie duma exploração de histórias de mulheres que viajaram para conseguir fazer um aborto. Estou a trabalhar agora nele, espero filmar no início do próximo ano e será lançado, à partida, até ao final do próximo ano.
Gosto muito de dar aulas e de poder ensinar cinema e ensinar a pensar cinema
E o doutoramento que aí vem, com direito à bolsa da fundação La Caixa... como se sente? Que expectativas tem?
Ainda nem comecei, só começa daqui a alguns meses. O doutoramento é algo que sempre quis fazer e que vejo como um momento da minha carreira em que me posso dedicar ao meu trabalho. Vou fazer o doutoramento em Film and Digital Media na University of California Santa Cruz, que é um doutoramento especificamente focado na prática artística, cinematográfica. Não é um doutoramento dito tradicional.
Sim, faremos todo o tipo de trabalho académico que normalmente se faz, mas tem uma componente de trabalho prático em que me posso focar nos projetos que estou a trabalhar agora e noutros projetos que terei no futuro. Isso foi bastante importante para mim.
Claro que o que foi essencial nesta candidatura foi, efetivamente, a candidatura à bolsa La Caixa, à qual já sabia que me queria candidatar há alguns anos. Tinha uma amiga espanhola que já tinha conseguido fazer o mestrado com essa bolsa e, quando soube que permitiam a portugueses candidatar-se, decidi avançar. Candidatei-me em janeiro ou fevereiro do ano passado, consegui a bolsa e, depois, passei o ano seguinte a candidatar-se às universidades nos EUA. Agora vou começar o doutoramento com dois anos de apoio da fundação La Caixa e, depois, os anos seguintes, vai ser a universidade que vai apoiar.
Gostava de dar aulas?
Quero ser professora. Gosto muito de dar aulas e de poder ensinar cinema e ensinar a pensar cinema. É o meu sonho, até eventualmente poder voltar a Portugal e dar aulas. Vejo este passo de começar o doutoramento como um passo essencial para a minha carreira de artista, cineasta, mas também de professora.
Teria uma certa satisfação em poder devolver, de certa forma, ao meu país. Influencia tanto o meu trabalho que sinto que tenho de dar qualquer coisa em troca
E depois do doutoramento, para além do ensino, algum plano de voltar a Portugal, então?
É assim, o doutoramento são 5 anos. [risos] Portanto há muita coisa que pode acontecer, mas sim, gostava de voltar a Portugal. Parece que é o estereótipo de emigrante que quer voltar a casa, mas gostava mesmo, ou então a algum outro país na Europa, não rejeito nenhuma boa oferta de trabalho, quando aparecer. Mas teria uma certa satisfação em poder devolver, de certa forma, ao meu país. Influencia tanto o meu trabalho que sinto que tenho de dar qualquer coisa em troca.
Uma das coisas de que mais gosto no cinema é de, para além de o fazer, ver pessoas a apaixonar-se por ele e a fazê-lo também
De onde vem o desejo de dar aulas?
Devia ter referido isto antes, quando me perguntou sobre as minhas influências. Os professores tiveram um impacto muito forte em mim. Tive um percurso fora do normal, fiz Ciências e Tecnologias no ensino secundário, não era a melhor aluna mas acho que, apesar de tudo, foi uma experiência muito importante para mim ter feito aqueles 3 anos, porque me ajudou a pensar de forma diferente e também a aprender a fazer as coisas de forma diferente.
Fui daquelas pessoas que faz Ciências mas depois vai para Humanidades. Algo que para os meus colegas, e até para os meus professores, era estranho, mas senti que era o caminho certo, até porque estar naquela área me ensinou a pensar de uma certa forma. Depois, durante a educação básica, mas também no ensino superior, os professores tiveram um grande impacto em mim.
Uma das coisas de que mais gosto no cinema é de, para além de o fazer, ver pessoas a apaixonar-se por ele e a fazê-lo também. Ver que isso faz diferença nas suas vidas e na maneira como se relacionam com a sua história e a sua cultura. Portanto, poder fazer parte nesse exercício e poder devolver ao país algo nesse sentido seria algo muito importante para mim.
Ver alguém a apaixonar-se por algo que também nos apaixona é sempre divertido...
Exatamente, e ajudá-los a descobrir. Especialmente os miúdos, os jovens... vá, eu também ainda sou jovem, mas percebe. [risos] Vê-los a rejeitar uma coisa e depois apresentar-lhes algo, mostrar-lhes uma maneira de ver essa mesma coisa de forma diferente, e eles começam a construir novas relações. Eu tenho muita experiência de ver os alunos a dizer 'Ah, mas eu só quero fazer longas-metragens de ação, isto curtas não tem valor nenhum, documentário não tem valor nenhum', e eu responder 'Ah não? Então deixa-me mostrar-te o valor que isto tem', e depois, no fim do curso, poder ver as pessoas a dizer 'Inês, isto é incrível, agora só quero fazer curtas e documentários'. Claro, não quero também estar a obrigar as pessoas a nada, mas poder abrir-lhe os olhos para coisas novas é bom.
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