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Livraria Aberta quer ajudar a resgatar a história 'queer' em Portugal

A Livraria Aberta, no Porto, que na terça-feira celebra o primeiro aniversário, usa a curadoria de livros e avança para a edição própria para resgatar a história 'queer' em Portugal e "fixar conhecimento".

Livraria Aberta quer ajudar a resgatar a história 'queer' em Portugal
Notícias ao Minuto

14:36 - 27/06/22 por Lusa

Cultura Livraria Aberta

Em entrevista à agência Lusa, a propósito do primeiro aniversário, os criadores e gestores da livraria, Paulo Brás, formado em literatura, e Ricardo Braun, do teatro, explicam a vontade de entrar no campo da edição e também como "não há ainda uma grande preocupação em Portugal em escrever a história 'queer'", defende o primeiro.

"Nem há muitos livros publicados, ou os que existem esgotam e não são reeditados. Acontecem colóquios e as atas não são publicadas. O conhecimento não se fixa, parece que estamos sempre a começar do zero. Isto cria uma ideia geral de que 'ah, os autores não existiram'", acrescenta.

Com um catálogo "bastante abrangente" na livraria, sita na Rua do Paraíso, no Porto, o seu universo aborda questões não só do espectro LGBT mas também com "uma preocupação interseccional de ter textos feministas, narrativas raciais e outro tipo de exclusões".

Para o movimento LGBT no país, "é preciso é haver conhecimento, investigação", um trabalho que fazem, pela livraria, ao ir às editoras encontrar os livros que lá estão, e que "noutro sítio se calhar ficam perdidos", encontrando estantes de onde não saem "após três meses de exposição", com outro "tempo de vida".

"Mesmo da parte das editoras que vão lançando coisas que se encaixam no nosso catálogo, se calhar há menos medo, ou pudor, em que as sinopses já levantem ou assumam que os livros falem dessas questões", lembra Ricardo Braun.

As edições ligadas ao tema sofrem de um "código", alerta, em que não se diz "que as personagens são LGBT, fala-se de amores proibidos ou tendências desviantes", uma "maneira muito críptica de falar das coisas para não alienar ninguém".

As editoras mais independentes, completa Paulo Brás, já criam "um diálogo", seja a perguntar por livros especificamente 'queer' que ainda não estão publicados em português, num país sem editoras em papel especificamente dedicadas.

"Os próprios distribuidores foram percebendo que os livros LGBT não são só os livros com os meninos nus na capa a namorar, ou com LGBT na sinopse. Não são só esses. Um caso muito flagrante: na poesia, é preciso conhecer a obra, e por vezes a vida do poeta, para saber que o livro pode estar cá", refere Paulo Brás.

A possibilidade de editar em nome próprio está "prevista desde o início", mas ainda falta "dinheiro para isso".

A sustentabilidade é a prioridade antes de assumirem esse risco, com o qual querem "suprir lacunas no catálogo", e aplicar o conhecimento que têm para acrescentar e não duplicar.

Editar é para poder "contribuir para fazer história" do movimento no país, "para mostrar que aquelas coisas existiam", que "tiveram o seu impacto" e trazê-las de volta, contornando a dificuldade da falta de acesso quando algumas obras -- ou autores -- esgotam.

"Não tiramos da mesa e percebemos a importância de também ajudar de alguma maneira autores 'queer' a tentar publicar sem conseguir. Há áreas pouco exploradas. Um autor trans português? Há poucas edições", acrescenta Paulo Brás.

Entre a programação do primeiro aniversário está uma série de sessões informais moderadas por Paulo Brás, pelas 18:00 das segundas-feiras, até 01 de agosto, sobre referências LGBTQ na literatura portuguesa.

Assentarão num "formato de 'não-aula', uma coisa mais de partilha, leitura, descoberta", explica Ricardo Braun, sobre referências da literatura portuguesa LGBT, que Paulo Brás assumiu quase como "um dado adquirido".

"Essas conversas vão ser moderadas por mim e a ideia é eu trazer para a mesa cópias e excertos, [que] lemos e comentamos em conjunto. Não sou professor, e depois, porque eu venho inicialmente desse contexto mais académico, de comunicações, e não sinto que isso proporcione um diálogo. Até porque eu não sei quem vem a essas conversas. Posso estar a falar do António Botto e está aqui um 'superfã' do Botto e que quer falar sobre ele", explica.

Para a frente, numa fase de primeiro aniversário, além da edição, é "importante que as pessoas percebam que a livraria tem de ser sustentável", refere Paulo Brás, para que não corra o risco de ser "mais um projeto que dura dois ou três anos e desaparece".

"Além disso, queremos intensificar a questão da programação, porque sabemos que são sempre momentos de cruzamento de muitas pessoas, e é importante para o ambiente que queremos na livraria", acrescenta Paulo.

Para Ricardo, há pontes com outros agentes culturais e trabalho em rede que pode ser intensificado, e o espaço infantojuvenil, demarcado do resto da livraria, continuará a ser uma aposta para que livros infantis dedicados à temática possam "facilitar a conversa".

"Para que pais, tios, avós, possam falar descomplicadamente destas coisas às crianças. O facto de virem cá, porque querem falar de algo à criança da família é bom, é ótimo", acrescenta.

Leia Também: Livraria Aberta celebra 1.º ano como espaço 'queer' aberto no Porto

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