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Alexandra Lucas Coelho lança 'Deus-Dará' com tributo ao povo Krenak

O terceiro romance de Alexandra Lucas Coelho, 'Deus-dará', lançado no Brasil este mês, levará a autora à terra indígena demarcada do povo Krenak, num tributo a "pessoas reais que foram simplesmente massacradas" aquando dos "Descobrimentos".

Alexandra Lucas Coelho lança 'Deus-Dará' com tributo ao povo Krenak
Notícias ao Minuto

11:58 - 11/05/19 por Lusa

Cultura Literatura

Em entrevista à Lusa, a escritora e jornalista faz questão de frisar que o lançamento do seu livro no Brasil não é normal, porque os tempos que o país sul-americano atravessa também não o são.

Apesar de a obra ter sido publicado em Portugal no final de 2016, e de atravessar 500 anos de história entre Portugal e o Brasil, trata-se de um romance que não perde atualidade, por ter sido a própria atualidade brasileira a levar a autora a querer percorrer locais que têm sido alvo de cortes por parte do governo brasileiro, liderado por Jair Bolsonaro, como universidades federais, que viram o seu orçamento bloqueado em até 30%, ou terras indígenas, cuja exploração foi defendida pelo chefe de Estado.

"Acho que este é o maior desafio de sempre da democracia brasileira. Estes tempos não são normais, e são tempos para tentarmos estar com quem mais precisa. Pensamos nesta digressão para estarmos com as universidades públicas, com as livrarias independentes, com as periferias, com os interiores e com terra indígena", declarou à agência Lusa a escritora portuguesa, referindo ainda uma passagem por uma universidade privada, com grande tradição bolsista.

Para a autora e jornalista portuguesa não fazia sentido percorrer vários estados do Brasil para lançar o seu livro sem prestar tributo aos povos que foram "massacrados" no encontro entre os navegadores portugueses e índios brasileiros na época dos "descobrimentos".

"Em Minas Gerais vamos fazer uma coisa muito especial, porque era muito importante que a terra indígena aqui estivesse presente. Nós estamos aqui, as duas sentadas, porque em 1500 umas naus chegaram ao Brasil e tiveram um encontro com os indígenas. Para mim era muito difícil encarar esta digressão sem um tributo aos povos indígenas. [...] Vou fazer 500 quilómetros até à terra indígena demarcada dos Krenak, onde está o Ailton Krenak, umas das maiores lideranças indígenas do Brasil, [...] e vamos fazer na Serra do Cipó uma atividade em torno deste livro", revelou à Lusa Alexandra Lucas Coelho, em Brasília.

Em 'Deus-dará', Lucas Coelho quis dar voz a narrativas que a própria história portuguesa acabou por anular, que são as narrativas de quem resistiu, tanto dos povos indígenas como dos povos africanos, "como um terreiro em que vivos e mortos se podem encontrar", disse.

Este romance, com mais de 500 páginas, escritas com diferentes sotaques, e retratado por Alexandra Lucas Coelho como "transatlântico", resulta da experiência de três anos e meio em que a autora viveu na "cidade maravilhosa" do Rio de Janeiro.

A escritora quis ser "atravessada" pelo maior território colonizado por Portugal e, dessa vivência, surgiu a história de Lucas, Judite, Zaca, Tristão, Inês, Gabriel e Noé, as sete personagens de "Deus-dará", que percorrem a geografia do Rio de Janeiro, em sete dias ao longo de três anos, num percurso apocalíptico, intensamente marcado pela "herança do domínio colonial escravocrata" que Portugal exerceu no país sul-americano.

Aquilo que seria um retrato "horizontal" do presente de milhões de pessoas que viviam ao 'Deus-dará', passou também para um plano "vertical", onde a autora quis escavar até ao passado.

"Inicialmente a proposta era fazer um retrato do Rio de Janeiro, mas depois eu percebi que tinha de ir de uma linha horizontal, onde temos a ação a decorrer no presente, cronologicamente, para uma linha vertical, onde na verdade fui escavar a história do lugar de onde eu venho, o passado. O livro passa-se nestas duas linhas, onde há uma escavação até antes de 1500, porque me interessava aprender e convocar tudo o que existia aqui antes de as naus terem chegado", frisou.

"Quando nós falamos da chegada das naus, e há toda esta retórica em relação ao descobrimento [...], estamos também a falar de um embate entre o velho e novo mundo que simplesmente provocou o extermínio de muitos povos, cujas línguas, culturas e cosmogonias desapareceram para sempre", afirmou a escritora, sublinhando que essa violência continua perpetuada, ainda que sob outras formas.

A agenda da autora pelo Brasil inclui encontros em cidades como Campinas, Poços das Caldas, Brasília, Salvador, São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.

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