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"Quem votou Marcelo teve pena de não poder votar em mim também"

Diz ser um homem do povo, equipara-se a Marcelo Rebelo de Sousa e não tem problemas em dizer que o Partido Socialista “não acolhe os melhores”. Falamos de Vitorino da Silva, mais conhecido por Tino de Rans. Sem problemas em assumir o seu lado inovador de político, Tino de Rans é um dos entrevistados do Vozes ao Minuto.

"Quem votou Marcelo teve pena de não poder votar em mim também"
Notícias ao Minuto

21/12/16 por Inês Esparteiro Araújo

Política Tino de Rans

Tino de Rans não hesita em colocar-se lado a lado com Marcelo como um político adorado pelo povo e garante que cada pedra que coloca é pensada e com um objetivo. Ensinamento que foi ganhando ao longo da sua experiência como calceteiro.

Nesta segunda parte da entrevista fala ainda sobre o PS e não esconde que o partido podia ser hoje em dia muito melhor do que aquilo que é.

Quando se candidatou às presidenciais acreditou mesmo que as pessoas o escolheriam a si em vez de Marcelo?

Acredito mesmo. O eleitorado é o mesmo. Quem votou Marcelo, votaria em mim. Era a segunda escolha.

Nesse caso, se seriam os dois favoritos, porque é que não ficou em segundo lugar e sim em sexto?

Fiquei devido ao o voto útil. As pessoas diziam que não queriam que acontecesse ao Marcelo o que aconteceu ao Freitas do Amaral. Depois houve aquela situação em que o Marcelo podia ter 52 ou podia ter 49. Mas claro que se o Marcelo tivesse tido 49, teria vencido na segunda volta, porque pelo menos o meu voto ia ter.

Noto uma grande admiração por Marcelo…

Sim, foi a pessoa que melhor percebeu o Tino. Jogou limpo. Tenho a certeza de que o Marcelo me respeita muito. Eu sei que perdi muitos votos para o Marcelo. O voto que eu tive foi de confiança. Os que eu tive davam para encher o estádio do Dragão, de Alvalade. E muita gente que votou Marcelo teve pena de não poder votar nos dois.

O PS lucrou muito com aquele abraço do Tino, calceteiro, ao engenheiro, primeiro-ministro. Foi a primeira vez que o primeiro-ministro desceu ao povo profundoDa maneira que fala, parece que Marcelo era o seu único adversário.

Ando no meio do povo, oiço as pessoas. Sei que o Marcelo tem o povo e somos os dois políticos muito parecidos. Temos uma escola, mas diferente: Enquanto a minha escola era a da biqueira de aço, a dele era a do ar condicionado, da academia, mas no fundo somos duas pessoas que falamos simples. A principal arma do Marcelo é que ele fala para todos, apesar de conhecer quase todas as palavras do dicionário.

Recuemos um pouco no tempo, quando ainda não se conhecia o Tino como candidato a Presidente da República. Em 1999, no 11.º Congresso do PS, disse uma frase que ainda hoje penso que continua a dizer: "Por favor não durmam à sombra da laranjeira". Isto que continua a acontecer no país?

Claro, o Partido Socialista dormiu à sombra da laranjeira. Não me posso esquecer de que a maior sondagem que saiu do PS até aquela altura, foi um mês a seguir ao abraço. O PS lucrou muito com aquele abraço do Tino, calceteiro, ao engenheiro, primeiro-ministro. Foi a primeira vez que o primeiro-ministro desceu ao povo profundo. Aquela gente que vem de longe e que tem muito para dizer. Normalmente, nos Congressos, é tudo feito para os chefes e quando aparece alguém que fala em horário nobre e consegue ser percebido… Era um alerta: Não durmam à sombra da laranjeira porque depois vem ai um Durão [Barroso].

E atualmente, como acha que está a correr o trabalho feito pelo PS e pela maioria parlamentar que o sustenta?

A oposição do PS está dentro da Geringonça. Sinto que as pessoas não estão tristes. Na altura foi tudo muito quente e as pessoas ficaram muito chateadas, mas a partir do momento em que já se sente o país a entrar nos trilhos... Estou satisfeito com o trabalho deles.

E qual a razão para não entrar nas listas do PS?

O grande problema dos partidos é que primeiro são para os filhos, para os enteados, porque eles não metem os melhores. Porque têm medo dos melhores. Normalmente quem está ali e vê gajos muito bons, pensa: “Fogo este gajo daqui a pouco passa-me à frente” e isso é que é o grande problema. Há muita gente que vai para deputado para encher.

Hoje em dia também sente isso, que o PS não reúne as melhores pessoas no dentro do partido?

Acho que não. Toda a gente sabe que não. Há muitos que são deputados e eu nunca os vi. Estão lá 230 e o povo conhece quatro ou cinco deputados. E muitos deles só os conhecem quando morrem.

Foi por essa razão que se afastou do partido?

Não, eu afastei-me do partido porque queria ver a minha filha crescer e precisava de crescer com a minha filha. Mas senti que as pessoas queriam que o Tino fosse a votos. Até porque fazem falta pessoas como o Tino. Pessoas que têm o coração na boca. Não há nenhum político que tenha o coração na língua.

A principal arma do Marcelo é que ele fala para todos, apesar de conhecer quase todas as palavras do dicionárioNem Marcelo?

Eu digo que Marcelo Rebelo de Sousa é um homem muito inteligente, é um sábio da política. Já levou muitas caneladas, já foi muito atraiçoado e tem a idade que tem que lhe permite defender-se melhor do que há 20 anos. O Marcelo é intocável.

Apesar da clara admiração que nutre pelo nosso Presidente da República, Guterres é o seu político preferido? Relembro aqui o mítico abraço.

Acho que neste momento tenho dois amores, que é o secretario-geral da ONU e o Marcelo. Imagine que eu um dia sou Presidente de Câmara. Eu tenho a certeza de que nenhum ministro me vai fechar a porta porque a partir do momento em que eu consigo chegar ao Guterres e ao Presidente da República… Quero crer que quando chegar a presidente da Câmara, se chegar a defender os interesses dos penafidelenses aqui em Lisboa ou no Governo, não me batem com a porta.Mas há uma coisa que de não tenho dúvidas, é que o Marcelo e o Guterres são muito amigos. E o Marcelo só arrancou porque o Guterres ia para secretário-geral da ONU. Tenho a certeza que eles nunca seriam adversários.

Só depois de saber disso Marcelo arrancou para a presidência?

Eu tenho muito respeito tanto por um, como pelo outro e tenho a certeza de que a primeira pessoa que Marcelo ouviu foi o Guterres e vice-versa. Eles um para o outro jogam limpo. São mesmo amigos. A máquina é a mesma. O Duarte, um homem que trabalha diretamente com o Marcelo, é sobrinho do Guterres. Não tenho duvidas nenhumas de que aquilo é um bunker. Se o Guterres não quisesse ir para secretário-geral da ONU, Marcelo não iria a votos. É garantido. E se o Guterres não conseguisse ser secretário-geral, era o próximo Presidente da República a seguir ao Marcelo.

E que balanço faz dos 10 anos de Cavaco Silva como Presidente?

Passou-me completamente ao lado, despercebido. Isto é como a água e o vinho. Agora temos um Presidente como o Marcelo, que não tem medo de ser tocado, que é um íman, que fura protocolos. Que não tem medo de se misturar com o povo, que tanto cita grandes escritores como cita o povo. Um político não deve andar ao sabor das marés, mas foi isso que ele [Cavaco] fez. Um Presidente da República tem de ser de 360 graus. Tem de olhar para a esquerda, direita, para frente, para trás. E eu acho que o Presidente Cavaco não era isso. A mim não me transmitia confiança.

O grande problema dos partidos é que primeiro são para os filhos, para os enteados. Eles não metem os melhores porque têm medo dos melhoresO que acha que devia mudar na nossa classe política?

Que não tenham medo de se aproximar das pessoas. Que deixem de usar vidros fumados, a sair pela porta dos fundos. Não apareçam ao povo só em tempo de campanha. Um político que só aparece ao povo para dar beijinhos e abraços em tempo de campanha e depois limpa as beiças e esquece-se do povo até ser novamente eleito… Um político tem de ser político 24 horas por dia, a tempo inteiro. Os políticos pensam que são uma classe superior e não são.

Qual o maior problema que Portugal enfrenta agora?

Oiço muita gente a falar de milhões. A minha filha foi para economia e eu perguntei-lhe porque é que ela tinha ido para esta área. Ela disse-me que ia para pôr o dinheiro no sítio dele, porque as pessoas dão demasiada importância ao dinheiro. Se os governos, os bancários, fizessem a gestão como faz uma pessoa que ganha o ordenado mínimo nacional, o país estava bem. Só se fala de milhões e milhões e ninguém explica os tostões. É preciso saber onde estamos para sabermos onde ir.

Pode ler a primeira parte desta entrevista aqui.

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