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Vozes ao Minuto: "Quando precisamos do SNS desta forma é porque estamos a perder o jogo"

Vozes ao Minuto: Elisabete Ramos, a primeira mulher a assumir o cargo de presidente da Associação Portuguesa de Epidemiologia e investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, é a entrevistada de hoje do Vozes ao Minuto.

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Sílvia Abreu
10/11/2020 09:20 ‧ 10/11/2020 por Sílvia Abreu

País

Epidemiologista

Portugal está 'a braços' com a Covid-19 desde março. E apesar de muito sobre o vírus SARS-CoV-2 já se ter descoberto, muito mais haverá ainda por deslindar. Já em plena segunda vaga da pandemia e com memórias do aparente êxito com que foi combatida a primeira, Elisabete Ramos não tem dúvidas de que "não vamos lá com medidas obrigatórias" e de que "a comunicação" é um instrumento de grande importância neste combate. 

A primeira mulher a assumir o cargo de presidente da Associação Portuguesa de Epidemiologia manifesta ainda a esperança de que este seja um momento em que o papel dos epidemiologistas, mais do que reconhecido, seja compreendido.

O mundo está 'a braços' com a pandemia. O que é que já se sabe e é incontestável? 

Já sabemos muito mais. Já sabemos caracterizar melhor a evolução da doença, ter noção do que é que são os sinais que nos indicam qual vai ser o prognóstico, embora isso, obviamente, tal como a própria palavra indica, tenha um lado desconhecido, mas é muito mais previsível do que aquilo que era no início.

Isso ajuda-nos a organizar melhor e a ter uma maior noção, por exemplo, de qual é o tempo expectável de cuidados diferenciados por cada doente, em função do que vai sendo a sua evolução, e também a ficar mais tranquilos com o facto de se manter as pessoas em casa e saber quando se pode esperar e quando é que isso não é aceitável de todo. Mas ainda há muita coisa desconhecida. A história mais longa que temos desta doença são nove meses, nós não estamos minimamente habituados a lidar com doenças para as quais apenas conhecemos uma história de nove meses.

Acho que isso tem sido o grande erro, tem-se assumido que a mesma mensagem serve para todos e não serve E o que não se aprendeu e devia ter aprendido com a primeira vaga?

Diria que na parte da comunicação, de um ponto de vista geral, ainda temos muito que aprender. Agora que já conhecemos um bocadinho melhor [a doença], temos de aprender a comunicar melhor com a população, que é algo que se calhar ainda não conseguimos fazer nas melhores condições. É um equilíbrio muito difícil entre o não assustar de forma a que as pessoas mais suscetíveis não fiquem em pânico, mas também não ser tão leve na informação, que crie a sensação de que não é necessária uma ação concertada e muito dura.

Nós sabemos comunicar para chegar a fatias específicas, mas é muito difícil conseguir uma forma de comunicar que seja adequada para toda a gente. E acho que isso tem sido o grande erro, tem-se assumido que a mesma mensagem serve para todos e não serve. 

As medidas em vigor colocam 121 concelhos na 'lista vermelha'. Concorda com a decisão?

De um ponto de vista geral, parecem-me boas medidas, sim. Temos é de ter sempre em conta que há sempre um 'delay' [atraso] entre aquilo que é dito e o momento em que é de facto implementado, e depois entre a altura em que é implementado e que tem impacto no número de novos infetados. Só depois de ter impacto no número de novos contágios é que tem impacto nos cuidados de saúde. Por isso, na verdade, em termos de aliviar verdadeiramente o Sistema Nacional de Saúde, só daqui a três semanas é que poderá ser visível o início do efeito destas medidas.

Considera então que deviam ter sido adotadas mais cedo?

Elas começaram a ser tomadas mais cedo em alguns sítios específicos e mais críticos - Lousada, Felgueiras e Paços de Ferreira - por isso, na realidade, embora de uma forma mais alargada tenham sido nesse sentido, houve pontos onde elas começaram mais cedo.

Há um problema quando nós comparamos com outros países ou regiões que é, nós não podemos comparar de um ponto de vista temporal. Isto é, o facto de por exemplo França ter tomado na semana anterior, não significa necessariamente que tenha tomado mais cedo, porque se eles estiverem numa situação pandémica mais complicada do que nós, até estão a tomar mais tardiamente, embora cronologicamente tenha sido mais cedo. 

Vão existir localidades e áreas onde vai ser sempre potencialmente mais difícil controlar a pandemia

E é importante a análise de todos estes aspetos.

Sim, e nós não estávamos habituados a fazer isso. Como até agora o nosso grande confronto era com as chamadas doenças crónicas, em que a sua evolução ao longo de um ano é muito ligeira.

Para comparar se estamos a tomar [medidas] mais cedo ou mais tarde, temos de olhar para todo o padrão de doença naquele momento em cada um dos países. Depois há um outro aspeto que é importante, quando comparamos países é importante a questão do padrão de testagem, a nossa capacidade de ir ativamente à procura dos casos ou não. Muitas vezes também temos de olhar para a situação, não em termos de número de novas infeções, mas em termos de qual é a resposta possível para aqueles que precisam de cuidados especializados, ou seja, internamento, e depois infelizmente para os óbitos.

Para comparar os países, temos de olhar também para isto, em que medida é que estamos perto ou longe de atingir o nosso limiar de resposta.

Mesmo em Portugal, o vírus 'atacou' primeiro o Norte, depois Lisboa, e agora está novamente com uma maior incidência no Norte.

Isso dá-nos a ideia de que há regiões onde as condições vão ser sempre mais difíceis. Porque há maior concentração de pessoas, porque as pessoas trabalham em funções em que não é possível ter restrições como o teletrabalho. Vão existir localidades e áreas onde vai ser sempre potencialmente mais difícil controlar a pandemia. E o facto de ter começado na zona de Felgueiras, resultou um bocadinho disto, de serem regiões com uma indústria que, por um lado, fez com que existisse mais contactos naquele momento com Itália, e, por outro lado, também fez com que fosse mais fácil a propagação da doença num curto espaço de tempo. 

Concorda com a decisão de que seja obrigatório o uso de máscara na rua?

A obrigatoriedade da máscara tem nuances, que é em caso de não ser possível manter o distanciamento, o que nessa situação faz sentido. O que é diferente de usar sempre.

A primeira medida deve ser manter a distância, porque é de todas a mais segura. Na situação em que não posso manter o distanciamento físico, quer seja na rua, quer seja num local fechado, aí sim a regra é que devo ter máscara. É a única medida que tenho para criar uma barreira.

Quando posso usar a distância como barreira, tranquilo. É a melhor medida possível. Essa e a lavagem das mãos. A lavagem das mãos tem uma importância fundamental. 

E quanto ao uso da aplicação StayAway Covid?

Ela tem o seu papel, mas nada justifica que seja obrigatória. Até porque toda a sua utilidade se baseia na lógica do voluntariado. Vai sempre depender da ação do próprio indivíduo. A 'app' tem um aspeto importante que é o da consciencialização do indivíduo. Se alguém recebe uma mensagem a dizer que esteve em contacto com alguém que testou positivo, é provável que vá tomar medidas para minimizar o contágio com outras pessoas e esta é uma mais-valia, mas que mais uma vez depende da autoperceção da pessoa. 

Decidir que não faz sentido concentrar-me com centenas de pessoas para ver as ondas, mesmo que não estivesse ali nenhum polícia, era de bom senso  

Vamos lá com medidas obrigatórias? Como se explicam fenómenos como os do recente ajuntamento na Nazaré

Acho que não vamos lá com medidas obrigatórias. Não quer dizer não sejam precisas algumas, até para suportar decisões como por exemplo ir ou não trabalhar. Há aqui alguns aspetos que têm de estar definidos e enquadrados. Mas o exemplo da Nazaré representa muito isso. É impossível haver um polícia em cada esquina e por isso as coisas têm que ser essencialmente baseadas na informação e na capacitação das pessoas para tomar as melhores decisões possíveis, porque eu não vou ter sempre alguém ao meu lado que me vigie ou que me diga o que tenho de fazer.

Por isso, tenho de ser capaz de decidir nas diferentes circunstâncias o que é que faz sentido e o que é que não faz. Decidir que não faz sentido concentrar-me com centenas de pessoas para ver as ondas, mesmo que não estivesse ali nenhum polícia, era de bom senso. 

De que forma olha para a tendência crescente de teorias/movimentos negacionistas?

Vai haver sempre. Ha aqui um aspeto que é: a capacidade de resposta será proporcionalmente melhor em função da capacidade de dar informação e que cada pessoa consiga entender o porquê de cada medida. E isso é fundamental, porque se eu não entender qual é a razão pela qual só posso estar com cinco pessoas em vez de 10, isto vai parecer-me sempre arbitrário. Porquê cinco e não oito?

Se alguém me explicar que se estiver com cinco pessoas e uma destas pessoas estiver doente, só temos que rastrear essas cinco, mais as cinco com que cada uma delas contactou, no fundo vai dar entre 50 a 60 pessoas para rastrear. Agora, se estiver com 10, isto já aumenta para muito mais e não há capacidade.

Se as pessoas entenderem bem o motivo de cada uma das medidas, acho que é mais fácil cumprirem

Se as pessoas entenderem bem o motivo de cada uma das medidas, acho que é mais fácil cumprirem. Por outro lado, na realidade nós não estávamos numa fase economicamente maravilhosa, toda a Europa não estava no seu melhor. E, por isso, já havia muita revolta à espera de oportunidade para se ir manifestando.

E medidas mais repressivas dão oportunidade a isso.

Se as medidas forem muito repressivas, autocráticas e com impacto brutal - é que todas estas medidas têm um impacto brutal no nosso dia a dia e na nossa perspetiva do que vai ser a evolução do país, da Europa e do Mundo -, é muito fácil criar as condições para que as pessoas se manifestem contra.

Daí a importância da informação e de como é comunicada?

Claramente, a informação é preciosa. Não simplesmente para transmitir informação em si, mas o porquê de cada uma destas coisas. Há muita dificuldade em perceber o porquê. Ainda há pouco vi algumas questões nos professores de porque é que dentro de uma turma só alguns alunos são testados e porque é que não se fecha a turma toda. É essencial que as pessoas percebam o porquê e qual a segurança com que se toma essa decisão, porque essa decisão não é aleatória. É uma decisão que é tomada com consciência e tendo por base o risco que cada um tem de ter havido transmissão da infeção.

Passar essa informação de forma clara e concisa é responsabilidade de quem?

Obviamente há aqui uma responsabilidade institucional dos responsáveis pela Saúde em Portugal e essas [instituições] deveriam também trabalhar a questão da comunicação. Acho que é um aspeto fundamental e que tem especificidades. Não pode ser qualquer pessoa que trabalhe a comunicação, há especialistas em comunicação e acho que se deve trabalhar com eles para melhorar.

Mas também não é exclusivamente. Por exemplo, as próprias associações de profissionais podem de alguma forma trabalhar para melhorar essa comunicação, nomeadamente, fazendo a recolha do que é que são as dúvidas.

Diria que é pouco provável que o SNS colapse, até porque imagino que claramente estão definidas estratégias para aumentar a disponibilidade. Agora, o que acontece é que essa disponibilidade não é a custo zero

O número de internamentos nos hospitais portugueses, nomeadamente em UCI, tem sido motivo de alarme. O SNS pode mesmo vir a colapsar?

O nosso limiar de alarme é sempre esse, porque quem fica em casa não tem grande impacto. O grande problema é que sabemos que isto é sempre proporcional e quando há muitas pessoas assintomáticas ou com sintomas ligeiros, proporcionalmente vai aumentar o número de pessoas que precisam de cuidados especializados. 

Diria que colapsar é pouco provável, até porque imagino que claramente estão definidas estratégias para aumentar a disponibilidade. Agora, o que acontece é que essa disponibilidade não é a custo zero. A disponibilidade de camas para Covid é a custo de tirar camas que estavam disponíveis para outras situações. Por isso, temos de fazer todo o esforço para reduzir esta pressão, porque não tenho qualquer dúvida que se vai responder. Mas vai responder-se indo procurar recursos que estavam alocados a outras necessidades.

Quando nós precisamos dos profissionais do Serviço Nacional de Saúde é porque estamos a perder o jogo

Não é possível ainda prever para quando será o pico desta segunda vaga?

Não. Ainda estamos na fase ascendente e não há nenhum indicador que nos mostre que atingimos um planalto ou que estamos perto da inflexão. Na realidade, a inflexão só se nota depois de ter acontecido, diria que pode haver uma perspetiva de imaginarmos que, uma vez que foram agora tomadas medidas, dentro de duas semanas, isso seja visível, mas é impossível prever com toda a certeza que as medidas serão suficientes para conseguir causar essa inflexão. 

Ficámos com a sensação que podíamos fazer uma série de coisas porque ninguém ficava doente

O sucesso do combate à primeira vaga fez com que se pensasse que a situação não era tão grave?

É muito provável que isto resulte um bocadinho desse sucesso, é o preço do sucesso da primeira vaga. Correu muito bem, conseguiu-se - com uma medida muito drástica e com um impacto gigante - conter. E a sensação foi um bocadinho essa, que afinal conseguíamos lidar com isto, não é preciso estar preocupado.

Como existiam poucos casos, ficámos com a sensação de que podíamos fazer uma série de coisas porque ninguém ficava doente. Uma festa de aniversário em maio... como havia pouquíssimos casos, aprendemos a ideia que 'afinal podemos fazer festas de aniversário que não acontece nada'.

No fundo, quando nós precisamos do Serviço Nacional de Saúde e dos seus profissionais é porque estamos a perder o jogo. Eles são a nossa reserva especialíssima, que só entra em campo quando a coisa corre mal. E, por isso, precisarmos deles e desta forma, significa de facto que não estamos a jogar para ganhar o campeonato.

Não é expectável, do meu ponto de vista, que se consiga erradicar o SARS-CoV-2

Este vírus vem alertar-nos para a importância da Saúde Pública, até agora um pouco de lado?

Sim, claramente. Acho que esta situação nos chama à razão para muitas coisas. Em primeiro lugar, acho que nos chama à razão para a questão das desigualdades sociais e do quanto isso é importante e impactam em toda a sociedade. Porque não há fronteiras e esse é um problema de todos e não só de alguns.

Por outro, reforça a ideia de que a Saúde Pública e a Epidemiologia, na lógica de termos boas fontes de informação, usarmos os números que são recolhidos com qualidade para fazermos um planeamento a médio/longo prazo, é algo que também deve ficar. É importante ter profissionais que se dediquem a recolher informação de qualidade e a compreendê-la no seu contexto. Não é meramente ter uns gráficos que dizem uns números, é olhar para os números e compreender o que é que eles dizem.

Termos um nível de imunidade que pudesse ser uma estratégia para proteger a população é incompatível com um SNS que consiga dar resposta

E a chegada de uma vacina? Irá erradicar a Covid-19 ou é um vírus com o qual teremos de conviver?

Diria que é mais provável que seja um vírus com o qual vamos ter de aprender a conviver. A história diz-nos que só conseguimos erradicar uma doença, que foi a Varíola, a Polio (Poliomielite) andamos há décadas a tentar erradicar e ainda não conseguimos.

Por isso, não é expectável, do meu ponto de vista, que se consiga erradicar o SARS-CoV-2. Acho que vamos aprender é a viver com ele e esperemos que para isso tenhamos cada vez melhores ferramentas quer na proteção, nomeadamente por uma vacina, quer no tratamento para que ele seja menos letal e que sejam precisos menos cuidados diferenciados e específicos, que é o que está aqui a condicionar toda a nossa vida.

A lógica da imunidade de grupo é uma opção ou não é de todo o caminho?

Ninguém consegue responder a isso. Nós só conseguimos dizer no máximo dos máximos, qual é a imunidade que alguém tem ao fim de nove meses, porque é o tempo que temos de doença. Ninguém sabe dizer se esta imunidade vai durar um, dois ou três anos. Ninguém faz a mínima ideia. Por isso, desse ponto de vista, eu diria que é uma aposta muito arriscada.

Depois, há outro aspeto. Nós estamos com níveis de imunidade que andará pelos 3%, 5%... e o impacto que já teve no nosso Serviço Nacional de Saúde. Termos um nível de imunidade que pudesse ser uma estratégia para proteger a população é incompatível com um SNS que consiga dar resposta até chegar a esse nível. Por isso, não me parece que essa seja claramente a estratégia. 

É uma doença altamente transmissível, contudo, têm sido conhecidos casos em que num agregado familiar, uns estão infetados e outros não. Qual é a explicação?

Não há. É um dos aspetos em que ainda não se conhece completamente a doença. Porque é que algumas pessoas infetam e outras não, teoricamente estando expostas à mesma fonte. São aspetos a compreender com o tempo.

Na generalidade das situações, nós sabemos que ela é muito transmissível e este muito transmissível facilmente é visível quando olhámos para os gráficos das últimas três semanas, em que vemos uma linha quase na vertical. E isso é que nos diz que a doença é altamente transmissível, porque uma pessoa transmite para várias e em pouco tempo temos números muito grandes. Isto não significa necessariamente que transmita para todos aqueles com quem contactou. Felizmente, porque isso, sim, seria o caos.

Há algumas pessoas que parecem ter alguma forma de proteção contra a infeção. Descobrir o que é isso é fundamental e será mais uma daquelas ferramentas que nos pode vir a ajudar, mas por enquanto é impossível saber. 

Jogamos no Euromilhões, sabendo que tem uma probabilidade baixíssima de acontecer, e acreditamos que vamos ganhar, mas estamos a tomar café com alguém a uma distância curta porque, embora a probabilidade seja muito maior, acreditamos piamente que não vamos ficar infetados

A este ponto, que mensagem devem os portugueses ter em mente neste combate à pandemia?

Todos nós temos um papel importante, cumprindo as regras. E as regras essenciais são o distanciamento físico, a atenção às mãos e a sua lavagem e, sempre que não é possível o distanciamento físico, a máscara.

A questão extraordinariamente importante de não colocarmos os outros em risco ou seja, sempre que tenho sinais e sintomas que são suspeitos ou sempre que, mesmo não tendo sinais e sintomas - porque é o problema desta doença -, se tenho conhecimento que contactei com alguém que pode estar infetado, pelo menos até prova em contrário, assumir que estou infetado e por isso tentar evitar ao máximo a transmissão da doença. Esses aspetos são extraordinariamente importantes.

É também importante criar as condições para que o outro tome essas atitudes e não ridicularizar ou minimizar quando o outro as toma.

Há a tendência de se pensar sempre que não é Covid-19, apesar de tudo o que já se sabe.

Somos eternos adolescentes. Achamos sempre que o caminho é outro e que não é a nós que vai acontecer. Jogamos no Euromilhões, sabendo que aquilo tem uma probabilidade baixíssima de acontecer, e acreditamos que vamos ganhar. Mas estamos a tomar café com alguém a uma distância curta porque, embora a probabilidade seja muito maior, acreditamos piamente que não vamos ficar infetados.

Num ano que ficará mundialmente marcado pela pandemia, é a primeira mulher a assumir o cargo de presidente da Associação Portuguesa de Epidemiologia. É o melhor ou o pior ano para o fazer?

É o ano certo. Não por causa da pandemia, mas porque resulta do trabalho que foi desenvolvido até agora e era o que fazia sentido. Espero que a pandemia seja mais um momento em que o papel dos epidemiologistas seja reconhecido. Mais do que reconhecido, que definitivamente seja compreendido que o papel de epidemiologista não é exclusivamente nas epidemias, mas é para conhecer e compreender a saúde da população. É esse de facto o papel do epidemiologista. 

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