O caso da empresa familiar de Luís Montenegro, na origem da crise política e das eleições antecipadas de domingo, nunca entra nas intervenções do líder da AD. Em contraponto, o presidente do PSD culpa a oposição -- o PS "aliado ao Chega" -- pela queda do Governo, e só fala na Spinumviva se questionado pela comunicação social e para dizer que já deu todos os esclarecimentos.
Ao contrário do que aconteceu há um ano, Montenegro é sempre a figura central, e até se autointitulou como farol e um seu secretário de Estado classificou-o como "grande timoneiro".
Os ex-líderes do PSD apareceram, quase todos, uma única vez, por ocasião do aniversário do partido, quando nas anteriores legislativas foram protagonistas frequentes de primeira linha.
Já o parceiro de coligação, o líder do CDS-PP, Nuno Melo, que em 2024 discursava em quase todos os comícios, tem sido uma presença mais discreta e já quis sublinhar que a coligação AD é mesmo só entre PSD e CDS-PP.
Com a generalidade das sondagens a apontarem para a vitória da AD, Montenegro tem pedido reiteradamente "uma maioria maior" que lhe dê condições e governabilidade e evita falar sobre cenários pós-eleitorais e um eventual entendimento com a IL, dizendo que vai lutar por "uma grande coligação com os portugueses".
Na segunda semana, o líder da AD reforçou o apelo ao voto útil em nome da estabilidade, com vários ministros a defenderem até que uma opção pelos liberais, com quem admitem afinidades, retira força ao atual primeiro-ministro.
Montenegro tem argumentado que o país teve, nos 11 meses do executivo PSD/CDS-PP, estabilidade económica, financeira e social, faltando apenas garantir a estabilidade política, essencial numa conjuntura complexa internacional.
Por isso, pede aos eleitores que colocam o valor da estabilidade acima de tudo e "que estão fartos de eleições" que votem AD, mesmo que não concordem a 100% com as suas ideias.
O único que fugiu, até agora, ao guião foi o antigo líder Pedro Passos Coelho, que considerou que só estabilidade política não basta e é preciso "espírito reformista", sem dizer se via essa qualidade no Governo cessante.
Nos seus discursos, Montenegro reivindica falar sempre pela positiva e com propostas, mas visa indiretamente o eleitorado socialista e o próprio PS de Pedro Nuno Santos, que acusa de "andar zangado" e ser "um profeta do medo".
Com grande frequência, dirige-se aos pensionistas, para lembrar que aumentou todas as reformas, como manda a lei, e deu um suplemento às mais baixas, prometendo voltar a fazê-lo se houver condições financeiras.
Em vários discursos, Luís Montenegro apresenta-se aos eleitores como "o moderado", que não é socialista nem liberal.
Para a administração pública, aponta ter chegado a acordos para melhorar 19 carreiras socioprofissionais, como professores, médicos, enfermeiros, polícias ou militares, partindo deste ponto para passar a mensagem de que "está a salvar o Estado social".
Na disputa do eleitorado à direita do PSD, defende parcerias público-privadas em várias áreas e realça o tema da imigração regulada, dizendo que o seu Governo "acabou com a balbúrdia das portas escancaradas", e que está pronto para deportar os ilegais.
O Chega é retratado na campanha da AD como um partido irresponsável, sem condições para fazer parte de uma solução de Governo, e que traiu o seu eleitorado ao "aliar-se ao PS" no último ano em vários momentos no parlamento.
A campanha divide-se, sobretudo, entre comícios e contactos de rua, sempre muito confusos e em que o candidato praticamente não diz mais do que "conto convosco", e com momentos mais informais, destinados à imagem.
Em Espinho, jogou vólei de praia e deu um mergulho no mar e, num momento mais controverso, foi cumprimentar a sua mulher, em peregrinação a Fátima, com a AD a levar ao local alguns repórteres de imagem das televisões, com a restante comunicação social a ser informada 'a posteriori'.
Numa "coincidência feliz", segundo Montenegro, estava em Fátima quando saiu fumo branco no Vaticano a assinalar que estava escolhido um novo Papa.
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