Gisèle Pelicot, a mulher francesa cujo ex-marido foi condenado a 20 anos de prisão por violação agravada, depois de a ter drogado e entregado a desconhecidos durante dez anos, vai estar presente no julgamento de recurso de um dos seus violadores.
Husamettin Dogan, de 44 anos, era um dos 51 homens acusados de ter violado Gisèle Pelicot e foi condenado a nove anos de prisão, no julgamento que decorreu no final do ano passado. Agora, recorreu da sentença e será novamente julgado.
Segundo a agência de notícias France-Presse (AFP), a mulher - que se tornou numa heroína feminista após ter renunciado ao seu direito de anonimato no julgamento de dezembro de 2024 - irá estar presente no novo julgamento, que decorrerá na segunda-feira, no Tribunal de Recurso de Nîmes, no sul da França.
"Ela estará lá para explicar que uma violação é uma violação, que não existe violação leve", explicou o seu advogado, Antoine Camus.
Husamettin Dogan violou Gisèle inconsciente. Pensava que era uma "brincadeira"
Husamettin Dogan, de 44 anos, construtor civil e cuidador do filho deficiente, foi condenado a nove anos de prisão por violação agravada.
No primeiro julgamento, o homem contou que entrou em contacto com o então marido de Gisèle, Dominique Pelicot, e dirigiu-se à casa do casal na mesma noite. Disse à mulher que ia sair e violou a vítima enquanto ela estava inconsciente.
No entanto, defendeu que pensava que era apenas uma "brincadeira" entre o casal. "Eu não sou um violador, isto é demasiado pesado para eu suportar", disse.
Gisèle Pelicot foi violada durante 10 anos pelo marido e dezenas de homens
Gisèle Pelicot foi drogada e violada durante 10 anos pelo marido, Dominique Pelicot, e por dezenas de homens que este recrutou na internet, com idades compreendidas entre os 26 e os 74 anos.
Dominique Pelicot, atualmente com 73 anos, foi condenado em 19 de dezembro a 20 anos de prisão pelo Tribunal de Avignon, no sul de França, por violação agravada.
Pelicot, que admitiu ter violado e drogado com ansiolíticos a vítima durante anos para a sujeitar a violações por dezenas de desconhecidos recrutados na Internet, foi condenado com a pena máxima em França.
O principal arguido foi também considerado culpado de filmar e possuir imagens tiradas sem o conhecimento de Gisèle, tendo registos de quase 200 violações, mas também por ter imagens da filha e das noras.
Em tribunal, o homem confessou ser "um violador" e afirmou que os restantes acusados "sabiam de tudo".
"Nunca toquei nos meus filhos ou netos. Sou um violador como as pessoas que estão nesta sala. Eles sabiam de tudo. Não podem dizer o contrário. Ela não merecia isto, admito-o", afirmou.
Dominique Pelicot contou que foi vítima de duas violações sexuais durante a sua juventude, afirmando que teve "sempre estes traumas". "Não se nasce assim, tornamo-nos assim", disse.
Os factos ocorreram entre 2011 e 2020, primeiro na região de Paris e, a partir de 2013, na casa para onde o casal Pelicot se mudou quando ambos se reformaram, situada em Mazan, uma aldeia de 6.000 habitantes perto de Avignon.
As provas de todos os crimes foram encontradas pela polícia em mais de 20.000 vídeos e fotografias presentes no computador de Dominique em 2020, depois de ter sido detido por filmar por baixo das saias de mulheres num supermercado.
Os investigadores contaram um total de 72 violadores diferentes, sem conseguir identificar todos.
Gisèle Pelicot tornou-se um ícone feminista, sobretudo por recusar que o julgamento se realizasse à porta fechada, para que "a vergonha mudasse de lado" e deixasse de pesar sobre os ombros das vítimas de violação.
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