"O agravamento da violência no norte de Moçambique está a tornar extremamente difícil a realização de atividades médicas com segurança em várias áreas da província de Cabo Delgado. Após os ataques registados este mês em Mocímboa da Praia, a Médicos Sem Fronteiras (MSF) tomou a difícil decisão de suspender temporariamente as suas atividades na vila e nas localidades do distrito [de Mocímboa da Praia]", lê-se num comunicado divulgado hoje por aquela Organização Não-Governamental (ONG).
Acrescenta que, desde o início de setembro, Mocímboa da Praia tem sofrido incursões armadas, com ataques de homens armados que "mataram e feriram brutalmente civis", ameaçaram a população e saquearam bens, atingindo bairros situados a poucos quilómetros do centro da localidade, sede do distrito, forçando milhares de pessoas a fugir.
"Foram igualmente suspensos o apoio em saúde mental e psicossocial, bem como as atividades comunitárias conduzidas por agentes de saúde em áreas remotas. Alguns pacientes que necessitam de cuidados especializados foram encaminhados para instalações de saúde em Pemba e Mueda", explica a ONG.
Víctor Leonor, chefe de operações dos MSF em Moçambique, citado no documento, manifestou "profunda" preocupação com a escalada da violência e com o seu impacto direto em todos os aspetos da vida das pessoas, incluindo o acesso aos cuidados de saúde.
Alertou ainda que "centenas de milhares" de pessoas necessitam "urgentemente" de assistência médica e humanitária em Cabo Delgado, "mas a insegurança continua a impedi-las de a obter. Isto resulta em mortes e sofrimento que poderiam ser evitados".
"Os MSF mantém-se empenhados em apoiar a população de Cabo Delgado e em retomar as atividades em Mocímboa da Praia, assim que tivermos garantias de que a nossa equipa poderá trabalhar em segurança", afirmou Víctor Leonor.
Os Médicos Sem Fronteiras recordam que já haviam sido "forçados" a suspender temporariamente o apoio médico em vários pontos de Cabo Delgado, por períodos que variaram de dias a semanas, ao longo deste ano, devido à insegurança armada, lançando o apelo a "todos os atores armados" que "garantam ativamente a proteção dos civis, dos trabalhadores humanitários e das instalações médicas face à violência em curso".
O Presidente moçambicano, Daniel Chapo, afirmou, na quinta-feira, que o combate ao terrorismo em Cabo Delgado deve ser assumido pelas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), e não por forças estrangeiras, que estão no terreno.
Em Cabo Delgado, província rica em gás, as Forças Armadas de Moçambique contam com o apoio, no combate aos grupos terroristas que operam na região desde 2017, com forças do Ruanda e da vizinha Tanzânia - ao abrigo de um acordo de apoio transfronteiriço -, enquanto a missão militar dos países da África Austral deixou o terreno em julho de 2024.
A província de Cabo Delgado regista um recrudescimento de ataques de grupos rebeldes desde julho, tendo sido alvos os distritos de Chiúre, Muidumbe, Quissanga, Ancuabe, Meluco e mais recentemente Mocímboa da Praia, com registo de vários mortos.
Só em 2024, pelo menos 349 pessoas morreram em ataques, no norte de Moçambique, a maioria reivindicados pelo grupo extremista Estado Islâmico, um aumento de 36% face ao ano anterior, segundo dados divulgados.
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