O também ativista dos direitos humanos foi o orador principal na sessão inaugural da VI Conferência Mundial de Presidentes de Parlamentos -- organizada a cada cinco anos pela União Interparlamentar (UIP) em colaboração com as Nações Unidas.
Nomeado em 1998 "Mensageiro da Paz" da ONU pelo empenho em questões de desarmamento, incluindo a não-proliferação nuclear, Douglas deplorou na intervenção que vários países continuem a distanciar-se de instituições que ajudaram a criar, como a própria ONU, e de acordos mundiais como o de combate às alterações climáticas e de controlo de armas.
"O mundo hoje é mais perigoso do que em qualquer altura da minha vida. As nações estão a gastar cada vez mais dinheiro em máquinas de guerra e cada vez menos nas pessoas, com os orçamentos de Defesa a aumentarem em milhares de milhões [de dólares], enquanto milhões de pessoas não têm acesso a cuidados de saúde, alimentação ou educação, que são as verdadeiras fundações da segurança", afirmou o ator, de 80 anos, a mesma idade da Organização das Nações Unidas.
Criticando o "aumento do autoritarismo, da violência política, dos ataques à imprensa livre, a da política do «nós contra eles», que penaliza a cooperação e demoniza os mais frágeis", Michael Douglas assumiu então que "não há nenhum lugar no mundo onde esta realidade seja mais vívida e dolorosa" do que nos Estados Unidos.
"Já fomos líderes no palco mundial, arquitetos da ONU, participantes na UIP [que os EUA abandonaram em 2003]", lembrou o ator, lamentando essa aposta na diplomacia e no multilateralismo tenha dado lugar a uma realidade na qual "multidões armadas invadem o Capitólio", funcionários públicos são ameaçados e "eleições são postas em causa só porque o resultado não é favorável a um dos lados".
"As eleições e as nossas instituições estão em apuros, o que significa que também nós estamos em risco", advertiu Michael Douglas, reconhecendo que já não acredita no seu "sonho de criança de ver um mundo sem armas nucleares".
Ainda assim, apelou aos presidentes dos parlamentos presentes na conferência para trabalharem no sentido de "devolver a esperança", a mesma que disse ter testemunhado numa recente deslocação a Kiev, onde ficou surpreendido por muito ucranianos manifestarem otimismo e a convicção de que a guerra pode ser uma "chamada de despertar" para o desarmamento.
Na abertura dos trabalhos, que se vão prolongar até quinta-feira, o secretário-geral da UIP, Martin Chungong, também assumiu que, ao iniciar esta sexta conferência da organização, há que "enfrentar uma verdade desconfortável", a de que "o sistema multilateral tal como é conhecido está em crise" e "a ONU, em particular, está sob imensa pressão".
Congratulando-se por esta edição da conferência mundial da UIP decorrer na cidade suíça de Genebra, "a cidade da paz, da diplomacia e dos direitos humanos", o dirigente camaronês exortou os presidentes dos parlamentos "a apoiar em uníssono o respeito pelo direito humanitário internacional nos conflitos" em curso, falando designadamente da guerra na Ucrânia e de Gaza.
Devido a atrasos no programa, a primeira sessão, consagrada a um debate sobre «Um mundo em turbulência: cooperação parlamentar e multilateralismo para a paz, a justiça e a prosperidade para todos», contou apenas com pouco mais de uma dezena de intervenções, prosseguindo a discussão na quarta-feira.
A situação de catástrofe humanitária em Gaza foi a mais mencionada, com intervenções particularmente duras da Turquia e da Jordânia relativamente a Israel, face ao que classificaram como "genocídio" e "crimes contra a humanidade" em curso.
A Conferência Mundial de Presidentes dos Parlamentos, organizada a cada cinco anos, tem por objetivo "promover um multilateralismo forte e eficaz, com a ONU no centro, e em que os parlamentos e os deputados são chamados a desempenhar um papel fundamental" na promoção da diplomacia e da democracia nas relações internacionais.
Nesta VI Conferência, participam a presidente do Senado russo, Valentina Matvienko, e o presidente da Rada (parlamento ucraniano), Ruslan Stefanchuk, assim como o presidente do Knesset (parlamento israelita), Amir Ohana, e o presidente do Conselho Nacional Palestiniano, Rawhi Fatooh, assim como líderes parlamentares do Irão e das duas Coreias.
"Não viemos aqui para falar, mas também para ouvir, e este não é um espaço para enfatizar as divisões, mas para construir pontes", disse, no discurso de abertura, Martin Chungong.
A delegação portuguesa é encabeçada pelo vice-presidente da Assembleia da República Rodrigo Saraiva.
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