O relatório divulgado segunda-feira sublinha que o número atual de deslocados internamente (pessoas que fogem das suas casas ara outras regiões do mesmo país) é equivalente à população da Alemanha e constitui mais do dobro do valor registado há seis anos.
"As deslocações internas acontecem onde o conflito, a pobreza e as complicações do clima existem, atingindo mais duramente os mais vulneráveis", lamentou a diretora do IDMC, Alexandra Bilak.
"Estes números comprovam que as deslocações internas não são apenas uma crise humanitária. São um claro desafio político e de desenvolvimento que requer muito mais atenção do que aquela que recebe atualmente", sublinhou.
De acordo com a análise hoje divulgada, quase 90% dos deslocados internos, ou seja, 73,5 milhões de pessoas, foram deslocados por conflitos e violência, o que representa um aumento de 80% em seis anos.
Em apenas 10 países havia, no final de 2024, mais de 3 milhões de deslocados internos devido a conflitos e violência, o dobro do número de há quatro anos.
Só o Sudão recebeu um recorde de 11,6 milhões de deslocados internos, o número mais elevado alguma vez registado num único país.
Números que preocupam o secretário-geral do Conselho Norueguês para os Refugiados, Jan Egeland, citado no documento ao referir que os valores registados em 202 devem servir de alerta para o estado da solidariedade global.
"O deslocamento interno raramente faz manchetes, mas para quem o vive, o sofrimento pode durar anos", afirmou, questionando-se sobre "quanto mais tempo poderá crescer o número de pessoas afetadas pela falta de responsabilidade e de liderança.
Cada vez que o financiamento para ajuda humanitária é cortado, mais uma pessoa deslocada perde acesso a alimentos, medicamentos, segurança e esperança, sublinhou o responsável.
"Ao longo do último ano, reuni-me com famílias deslocadas internamente na República Democrática do Congo, na Palestina e no Sudão, e ouvi-as falar sobre o impacto devastador das deslocações nas suas vidas e as suas esperanças para o futuro", contou Jan Egeland, para quem a falta de progresso é tanto uma falha política como uma mancha moral na humanidade.
"É agora o momento de os governos demonstrarem vontade política e investimentos financeiros para encontrar soluções duradouras que ajudem os deslocados", defendeu.
Como sublinha o relatório, em muitas situações, as pessoas tiveram de fugir várias vezes ao longo do ano, à medida que as áreas de conflito se foram alterando, aumentando as suas vulnerabilidades e impedindo os seus esforços para reconstruir as suas vidas.
Os desastres também são causa de muitas fugas, tendo provocado, no ano passado, 45,8 milhões de deslocações internas, o número anual mais elevado desde que o IDMC começou a monitorizar as deslocações por catástrofes, em 2008, e mais do dobro da média anual da última década.
Só os Estados Unidos foram responsáveis por quase um quarto das deslocações causadas por desastres no mundo e foram um dos 29 países e territórios com os números mais elevados alguma vez registados.
Os eventos relacionados com o clima, muitos intensificados pelas alterações climáticas, desencadearam 99,5% das deslocações por catástrofes durante o ano passado.
Os ciclones, como os furacões Helene e Milton, que atingiram os EUA, e o tufão Yagi, que atingiu vários países do leste asiático, desencadearam mais de metade (54%) dos movimentos ligados a catástrofes.
As inundações desencadearam 42% das fugas dentro do país, com grandes acontecimentos em todos os continentes, desde o Brasil até ao Chade, passando pelo Afeganistão, Filipinas e por toda a Europa.
Muitos deslocamentos causados por desastres aconteceram como evacuações preventivas para salvar vidas, como foi o caso nos EUA, nas Filipinas ou no Bangladesh, o que mostra que o deslocamento também pode ser um mecanismo positivo em países propensos a desastres, refere a análise.
Dos 163 países e territórios que reportaram deslocações devido a catástrofes no ano passado, 53 deveram-se a evacuações preventivas, mas o IDMC admite que o número até possa ter sido mais elevado já que não há dados completos sobre estas situações.
Os casos em que os dois motivos se sobrepuseram, ou seja, o número de países que reportaram deslocações devido a conflitos e desastres, triplicaram desde 2009.
Mais de três quartos das pessoas deslocadas internamente por conflitos e violência no final de 2024 viviam em países com elevada ou muito elevada vulnerabilidade às alterações climáticas.
"Os dados são claros", considerou a diretora do IDMC.
"Agora é tempo de os utilizar para prevenir as deslocações, apoiar a recuperação e construir resiliência. São precisos esforços imediatos para ajudar as pessoas que perderam tudo e investimentos para lidar com as vulnerabilidades subjacentes, a fim de as evitar", concluiu.
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