"Ela não é uma figura política e não tem experiência na Assembleia Nacional e isso é um grande problema. A Assembleia é complicada, ela foi mal eleita em Calvados com 52%, não é normal. Ao mesmo tempo, se Emmanuel Macron a demitir é um sinal de fragilidade", disse Virginie Martin, professora de Ciência Política na Kedge Business School, em declarações à Agência Lusa.
Elisabeth Borne cumpriu a primeira missão que lhe foi dada como primeira-ministra ao ganhar o seu círculo eleitoral no norte do país, mas angariando apenas 52% face a Noe Gauchard, um jovem de 22 anos da coligação de esquerda, o que significa que a mulher de confiança de Emmanuel Macron não se impôs como uma figura política incontornável.
Durante a campanha, a primeira-ministra preferiu manter-se discreta, tendo ficado maioritariamente no seu círculo eleitoral, não se mostrou como uma líder da força política do Presidente, o que pode dificultar a liderança de um Governo perante uma Assembleia sem maioria absoluta.
"Estamos longe do modelo de primeiro-ministro que tem um papel político por inteiro. Manifestamente, ela não tem intervenções fortes, o que acabou por condizer com a campanha de Macron que foi discreta e uma quase não campanha", indicou o historiador Jean Garrigues.
Como era esperado, o Presidente da República não aceitou a demissão e fonte oficial do Eliseu disse que a primeira-ministra fica para levar a cabo "as tarefas do Governo", mas o perfil de Elisabeth Borne, que até há dias parecia corresponder ao que o país precisava, não parece agradar nem à oposição nem à própria maioria.
"Vemos uma certa dificuldade da sua parte no plano parlamentar e vemos que ela não tem carisma. Não esteve à altura de uma chefe de campanha, algo que deveria ter sido para o partido do Presidente", sublinhou Garrigues.
Mais do que isso, Elisabeth Borne é uma mulher de esquerda que potencialmente terá de negociar com a direita para encontrar um entendimento, já que só a direita pode oferecer uma maioria sólida para realizar reformas importantes como a reforma das pensões.
"Ela é uma mulher de esquerda, mas hoje o Presidente vai ter de negociar com a direita. Como é que vai encontrar os entendimentos necessários", questionou Virginie Martin.
No entanto, as virtudes de Borne podem ainda ser úteis num quadro em que a população deposita pouca confiança nos políticos e nas instituições.
"Temos uma primeira-ministra tecnocrata, mas isso dá-lhe também uma imagem séria e de integridade que, por enquanto, lhe é benéfica e deverá ser julgada sobre a sua capacidade de levar a cabo reformas ou encontrar acordos", defendeu Garrigues.
A primeira-ministra almoçou na segunda-feira com Emmanuel Macron, François Bayrou e Édouard Philippe, os líderes da coligação do Presidente e vai hoje reunir-se com o Governo, tendo perdido três ministras que não conseguiram a eleição nos seus círculos eleitorais. Uma remodelação está assim à vista até ao final deste mês, restando a dúvida sobre o futuro de Borne.
O recém-reeleito Presidente francês, Emmanuel Macron, perdeu a maioria absoluta na Assembleia Nacional na segunda volta das eleições legislativas que decorreram no domingo.
A coligação Ensemble!, que apoia o chefe de Estado francês, conseguiu eleger 245 deputados, abaixo dos 289 necessários para alcançar a maioria absoluta. Na segunda posição, com a eleição de 131 deputados, surge a coligação de esquerda Nova União Popular Ecológica e Social (NUPES), sob a liderança de Jean-Luc Mélenchon e que reúne forças diversas deste quadrante político como a França Insubmissa, os socialistas, ecologistas e comunistas.
Já a extrema-direita francesa, representada pela União Nacional (Rassemblement National) foi a terceira força política mais votada e conseguiu o seu melhor resultado de sempre ao conquistar 89 assentos parlamentares. Nas eleições de 2017, a força política de Le Pen tinha alcançado a eleição de apenas oito deputados.
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