Na TV russa, comentador admite que guerra "vai piorar" para a Rússia
Khodaryonok assumiu que a Rússia está isolada geopoliticamente do mundo e apelou a um maior realismo relativamente às dificuldades russas, num espaço de comentário na televisão estatal russa.
© Reuters
Mundo Rússia
Apesar da forte opressão nos meios de comunicação russos no que diz respeito a conteúdos e opiniões sobre a guerra na Ucrânia (que o Kremlin continua a descrever como uma "operação militar especial"), um comentador russo remou contra a maré - na televisão estatal russa - e admitiu que a situação na Ucrânia está a tornar-se cada vez mais difícil para as tropas invasoras.
Mikhail Khodaryonok, comentador sobre Defesa, afirmou que o apoio militar dos Estados Unidos e da União Europeia irá eventualmente chegar às forças ucranianas, e a situação "vai francamente piorar" para a Rússia.
"As forças armadas ucranianas têm a capacidade para armar um milhão de pessoas. Eles próprios dizem isto. O principal problema é até que ponto eles são capazes de providenciar este exército com armas modernas e equipamento. Sozinhos, claro que não conseguem fazer nada, mas considerando que o programa 'Lend Lease' [referindo-se ao pacote de ajuda aprovado pelos Estados Unidos] está prestes a entrar em funções, que a a resistência de um único senador [Rand Paul] vai ser ultrapassada rapidamente, e considerando que a ajuda europeia irá chegar, a existência de milhão de soldados armados tem de ser vista como uma realidade no futuro muito próximo", explicou o analista à televisão estatal russa, num vídeo traduzido pelo jornalista da BBC Francis Scarr, antes de constatar que os "cálculos operacionais e estratégicos" não são favoráveis.
In an extremely rare moment of candour on Russian state TV today, defence columnist Mikhail Khodaryonok gave a damning assessment of Russia's war in Ukraine and his country's international isolation. It's fairly long but worth your time so I've added subtitles. pic.twitter.com/0mr7WAgSx6
— Francis Scarr (@francis_scarr) May 16, 2022
Quando a anfitriã do programa o interrompeu, para argumentar que os soldados ucranianos não são tão profissionais quanto os russos, Khodaryonok criticou o argumento e o "dogma" perpetuado pelo regime.
"Um exército de alistados pode ser altamente profissional. A forma como um exército é recrutado nunca determina o seu nível de profissionalismo. Nesse sentido, no nosso país o dogma que tem sido firmemente entrincheirado nas mentes de alguns dos nossos cientistas políticos diz que, se um homem é um soldado contratado, é um profissional. Longe disso", disse o comentador, chegando a citar Lenine para acrescentar que um fator crucial para a batalha é a "vontade de defender a pátria".
Khodaryonok apontou ainda o dedo à propaganda russa de forma indireta, alertando que é necessário haver na Rússia "um sentido de realismo político e militar". "Mais tarde ou mais cedo, a realidade da história irá bater-te com tanta força que te arrependerás", atirou o comentador, sobre as ameaças russas contra a Finlândia.
"A maior deficiência da nossa posição política e militar é o nosso total isolamento geopolítico e, por muito que custe admitir isto, praticamente todo o mundo está contra nós. É uma situação da qual precisamos de sair", afirmou.
O comentador aproveitou ainda para desmistificar alguns boatos entre os meios de comunicação russos, nomeadamente sobre a baixa moral dos ucranianos. Mikhail Khodaryonok disse que é necessário ter cuidado com a informação que chega, pois "por vezes, é espalhada informação sobre um colapso mental e psicológico nas forças armadas ucranianas" e isso, disse, "é falso".
"Há casos particulares, claro, prisoneiros de guerra, algumas unidades, mas são individuais", rematou.
Francis Scarr, que partilhou as imagens, descreve-as como "um momento de sinceridade extremamente raro na televisão estatal russa".
A guerra na Ucrânia já matou mais de 3.800 civis ucranianos, segundo os dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, mas a organização adverte que o número real de mortos poderá ser muito superior, dadas as dificuldades em contabilizar as baixas em cidades sitiadas e tomadas pelos russos.
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