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Tribunal ouve "simples motorista" acusado de cumplicidade genocídio tutsi

O tribunal parisiense que está a julgar um franco-ruandês por cumplicidade com o genocídio dos tutsis no Ruanda em 1994 ouviu hoje descrever o réu como "um simples motorista" sem relevo, mas com um percurso semeado de mentiras.

Tribunal ouve "simples motorista" acusado de cumplicidade genocídio tutsi
Notícias ao Minuto

19:57 - 23/11/21 por Lusa

Mundo França

Ao longo de um interrogatório de várias horas, o juiz, Jean-Marc Lavergne, tentou caracterizar Claude Muhayimana, um homem de 60 anos, calmo, polido e por vezes sorridente.

Segundo a agência France-Presse (AFP), o réu mostrou-se também discreto, apesar de ter chorado várias vezes, nomeadamente quando se falou do seu pai, que já morreu.

No entanto, ao longo do interrogatório foi-se tornando clara a linha de defesa do acusado: um cidadão comum, mas vítima de uma conspiração orquestrada contra si pelas autoridades ruandesas pós-conflito.

Vestido com calças de ganga e 'sweatshirt', Muhayimana, um homem baixo e forte, exprimiu-se em francês correto, apesar de algumas questões do juiz lhe terem sido traduzidas para quiniaruanda, uma das línguas oficiais do Ruanda.

Acusado de cumplicidade com o genocídio e de crimes contra a humanidade durante o extermínio dos tutsis no Ruanda, tenta mostrar-se como um "cidadão comum apanhado no caos", imagem que tem sido defendida pelos seus advogados desde o princípio.

"Não gosto de discórdias na minha vida", resumiu Muhayimana, que permanece em liberdade.

No entanto, o percurso deste "simples motorista" revela várias zonas sombrias que o próprio não conseguiu esclarecer completamente, conta a AFP.

Questionado sobre as mentiras existentes no seu pedido de asilo em França, que foi rejeitado, nomeadamente de que vários dos seus familiares teriam sido mortos, Muhayimana respondeu que "foi mal interpretado" e acusou o tradutor de então de ter "inventado" e montado um caso contra ele.

Acusa ainda a ex-mulher, tutsi e cujo testemunho poderá revelar-se crucial, de ter sido "controlada" pelo regime ruandês.

Claude Muhayimana é membro do partido RNC (Rwandan National Congress), um partido de oposição ao Presidente Paul Kagame, que dirige o país com mão de ferro desde o fim do genocídio.

Muhayimana foi, em 1994, motorista no hotel Guest House, em Kibuye, nas margens do Lago Kivu.

O cidadão franco ruandês é acusado de "cumplicidade" no genocídio e de crimes contra a humanidade por ter "ajudado e incitado" milicianos, fornecendo-lhes transporte em várias ocasiões para os locais onde ocorreram os massacres de tutsis na prefeitura de Kibuye, as colinas de Karongi, Gitwa e Bisesero (oeste), onde dezenas de milhares de pessoas foram exterminadas.

As milícias, armadas com machetes e enxadas e chamados "Interahamwe" ("aqueles que trabalham juntos" em Kinyarwanda) foram a principal ala armada do genocídio contra a minoria tutsi, orquestrado pelo regime extremista hutu, que matou mais de 800.000 pessoas entre abril e julho de 1994.

Muhayimana, que enfrenta a possibilidade de uma sentença de prisão perpétua, é um refugiado em França, onde obteve a nacionalidade em 2010. Trabalha no setor rodoviário na câmara municipal e vive em Rouen (noroeste). Foi preso em 2014, um ano após a abertura de uma investigação iniciada por uma queixa do Coletivo de Partidos Civis pelo Ruanda (CPCR), que luta contra a impunidade e a presença em França de alegados genocidas ruandeses.

O julgamento, aberto pelo Tribunal de Assis de Paris, após 10 anos de procedimentos e dois adiamentos devido à crise sanitária, durará quase um mês, com a audição de cerca de 50 testemunhas, das quais 15 do Ruanda.

A sua singularidade é que está a julgar um cidadão comum, e não uma personalidade que teve funções políticas, administrativas ou militares durante os assassínios.

Nos dois julgamentos anteriores, dois antigos presidentes de câmara foram condenados a prisão perpétua e um ex-capitão do exército a 25 anos de prisão.

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