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Empresa de atum servia para recolha de informação, diz Gregório Leão

O antigo diretor dos serviços secretos moçambicanos Gregório Leão justificou hoje a criação da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), beneficiária do dinheiro das dívidas ocultas, com a necessidade de recolha de informação sobre atividades suspeitas na costa moçambicana. 

Empresa de atum servia para recolha de informação, diz Gregório Leão
Notícias ao Minuto

15:50 - 28/09/21 por Lusa

Mundo Moçambique

"A Ematum era para pesca de atum e também para nos facultar informação, através de trabalho de 'intelligence' sobre o que estava a acontecer no mar", declarou Leão, arguido no processo das dívidas ocultas, durante uma audição em tribunal. 

A acusação do Ministério Público refere que a Ematum recebeu 850 milhões de dólares (727 milhões de euros), tendo sido uma das três firmas usadas como veículo para a materialização do esquema criminoso. 

Questionado hoje pelo Ministério Público sobre a pertinência da criação da Ematum, depois da fundação da Proindicus - que, na avaliação da acusação, tinha a mesma vocação -, o antigo diretor do Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE) disse que a firma de atum iria combinar a atividade de pesca e a recolha de informações sobre embarcações envolvidas em operações suspeitas nas águas moçambicanas. 

"Se aquelas embarcações [suspeitas] estavam envolvidas apenas na pesca ou noutro tipo de atividades, era isso que nos queríamos aferir", enfatizou. 

A Proíndicus foi pensada para atividades de defesa e segurança com cariz militar, nomeadamente a proteção das multinacionais petrolíferas envolvidas nos projetos de gás natural, avançou Gregório Leão. 

"Não são barcos da Ematum que vão fazer a proteção das petrolíferas", enfatizou. 

O antigo diretor do SISE disse ainda que vários estudos indicaram a existência de tráfico de droga e de pessoas, pesca ilegal e ameaça de pirataria nas águas moçambicanas. 

"Nós não temos capacidade para ombrear com aquelas empresas que estão lá a pescar o nosso atum e as receitas eram exíguas em proporção com o número de embarcações", declarou. 

O arguido citou estudos que apontavam para a presença de cerca de 100 empresas envolvidas em atividades de pesca, considerando esse número exorbitante face às receitas anuais de quatro milhões de dólares (3,4 milhões de euros) que disse que eram encaixadas pelo Estado moçambicano com a atividade piscatória. 

Em relação à criação da Mozambique Assets Management (MAM), outra das empresas na base das dívidas ocultas, Leão justificou a decisão com a necessidade de assegurar a manutenção da frota e equipamentos navais da Proindicus e Ematum, bem como de outras entidades não ligadas ao Estado. 

Sobre questões colocadas pelo Ministério Público em relação a aspetos operacionais e comerciais das três empresas, Gregório Leão remeteu as respostas para o antigo presidente das firmas e ex-diretor da Inteligência Económica do SISE, António Carlos do Rosário, próximo arguido a ser ouvido.

A outras perguntas sobre a atividade das três companhias, Leão escudou-se no cariz "classificado" da informação na posse dos oficiais dos serviços secretos. 

"Remeto-me ao silêncio", respondeu muitas vezes Gregório Leão. 

Leão admitiu ter sido ele a solicitar ao antigo ministro das Finanças Manuel Chang a emissão das garantias do Estado para suportar os 2,2 mil milhões de dólares de dívidas (1,8 mil milhões de euros) mobilizados a favor das três empresas. 

Observou que a sua intervenção foi feita sob ordens do Comando Conjunto das Forças de Defesa e Segurança, entidade dirigida pelo então Presidente da República Armando Guebuza. 

As decisões do Comando Conjunto das Forças de Defesa e Segurança eram resultado de recomendações do Comando Operativo das Forças de Defesa e Segurança, cujas sessões eram dirigidas pelo então ministro da Defesa Nacional e atual chefe de Estado Filipe Nyusi, acrescentou Gregório Leão. 

Leão acrescentou que o seu papel no processo de emissão das garantias do Estado para as "dívidas ocultas" foi determinado pelo facto de a operacionalização do projeto de proteção da Zona Económica Exclusiva ter ficado sob responsabilidade do SISE. 

"Coube ao SISE operacionalizar as decisões do Comando Conjunto", notou Gregório Leão. 

O arguido reiterou hoje a posição que manifestou na segunda-feira de que o projeto que esteve na origem das dívidas ocultas tem mérito, porque visa combater ameaças à soberania do país. 

O interrogatório do antigo diretor do SISE voltou a ser marcado por momentos de crispação com o tribunal, tendo o arguido questionado ao tribunal se já foi "condenado por antecipação", ao que o juiz da causa Efigênio Baptista respondeu que ainda não há veredito, porque ainda decorre a produção de prova. 

O Ministério Público acusa Gregório Leão de ter recebido 8,9 milhões de dólares (7,6 milhões de euros) através de depósitos feitos a favor da mulher Ângela Leão, também arguida e já interrogada no julgamento em curso. 

Leão é o penúltimo dos 19 arguidos a ser ouvido, faltando ainda interrogar António Carlos do Rosário. 

A justiça moçambicana acusa os 19 arguidos do processo principal das "dívidas ocultas" de se terem associado em "quadrilha" e delapidado o Estado moçambicano em 2,7 mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) - valor apontado pela procuradoria e superior aos 2,2 milhões de dólares até agora conhecidos no caso - angariados junto de bancos internacionais através de garantias prestadas pelo Governo. 

As 'dívidas ocultas' foram contraídas entre 2013 e 2014 junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM. 

Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo. 

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