Esta decisão coincide com a reunião anual da OIAC que decorre desde hoje e onde se prevê um braço de ferro entre a Rússia e o ocidente, com os investigadores da organização a prepararem-se para designar pela primeira vez os responsáveis de ataques químicos na Síria.
No fim de semana, o portal da Internet WikiLeaks divulgou um correio eletrónico de um membro da equipa que investigou um alegado ataque químico na cidade de Douma em abril de 2008, acusando a OIAC de ter dissimulado irregularidades.
A Rússia e seus aliados tiveram acesso a esta mensagem, e ainda a um anterior documento que também põe em causa as conclusões da OIAC divulgadas em março de 2019.
Moscovo tem questionado sistematicamente a veracidade dos ataques químicos na Síria e afirmado que foram manipulados, rejeitando designadamente o relatório da organização que indica o uso de cloro em Douma durante um ataque que provocou 40 mortos em abril de 2018.
Os ocidentais, com destaque para os Estados Unidos, acusaram na ocasião o regime sírio de responsabilidade pelo incidente, e em represália atacaram instalações militares sírias.
"É natural que qualquer inquérito aprofundado dos membros de uma equipa exprima pontos de vista subjetivos", declarou hoje o diretor-geral da OIAC numa intervenção que deu início à reunião anual dos Estados-membros a organização, com sede em Haia.
"Alguns destes pontos de vista divergentes continuam a circular em certos espaços de discussão pública, mas reafirmo que mantenho a conclusão independente e profissional" do inquérito, acrescentou.
De acordo com o WikiLeaks, um investigador não identificado exprimiu num correio eletrónico as suas "preocupações muito graves", afirmando que o relatório da OIAC "deturpa dos factos" e reflete uma "tendência não intencional".
Fernando Arias indicou que o conteúdo do relatório sobre o incidente em Douma foi comunicado à nova equipa de investigadores responsável pela identificação dos presumíveis autores destes ataques na Síria.
Este primeiro relatório deverá ser divulgado no início de 2020, uma perspetiva que agravou a tensão entre os Estados-membros da organização.
No decurso desta reunião decisiva que decorre até sexta-feira, Moscovo ameaça bloquear a votação do orçamento da OIAC para 2020, caso inclua um financiamento para a equipa de investigadores.
O bloqueio do orçamento poderá colocar graves problemas à organização, mesmo que Estados Unidos, França e Reino Unido considerem garantir suficientes apoios para que seja adotado por larga maioria.
Em 2019, Rússia, Irão e China conjugaram esforços para tentar bloquear o orçamento, por fim aprovado por 99 votos contra 27. Os diplomatas ocidentais esperam obter este ano uma maioria ainda mais ampla, com o objetivo de sublinhar o apoio internacional à OIAC.
Apesar das fortes objeções provenientes da Síria e aliados, a maioria dos 193 Estados-membros votou em junho de 2018 a favor do reforço dos poderes da OIAC, autorizando-a a designar o responsável de um ataque químico e não apenas a documentar a utilização de determinado armamento.
Na ocasião, a Rússia comparou a organização -- prémio Nobel da Paz em 2013 --, a um "Titanic prestes a afundar", ao considerar que se tornou demasiado politizada.
De acordo com diversos diplomatas, o relatório dos investigadores deverá ser publicado em fevereiro ou março.