Em 2021, estima-se que tenham ocorrido 247 milhões de casos de malária e mais de 619 mil mortes, a maioria das quais de crianças com menos de cinco anos que vivem em África. O progresso contra esta doença estagnou desde a pandemia, com mais 13 milhões de casos e mais 63 mil mortes em 2020 e 2021. Prevê-se ainda que o aquecimento do clima alargue as áreas de propagação da malária e aumente a duração da época de transmissão da doença em muitos locais. Mas, agora, uma investigação, publicada na revista Science, indica que uma bactéria natural (Delftia tsuruhatensis Tres Cantos 1 - TC1), descoberta por cientistas da GSK, pode ser a base de novas intervenções contra a malária.
Estudos realizados em colaboração com o Johns Hopkins Malaria Research Institute, da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health, mostram que a bactéria pode reduzir significativamente a carga do parasita da malária, tanto no intestino médio do mosquito como nas glândulas salivares, indicando o potencial da TC1 para inibir a transmissão do parasita aos seres humanos através do mosquito. A investigação inclui também dados de estudos preliminares de semi-campo realizados com o Institut de Recherche en Sciences de la Santé (IRSS) numa instalação ‘MosquitoSphere’ no Burkina Faso, o que sugere a possibilidade de os resultados laboratoriais serem transpostos com êxito para o terreno, com vista ao controlo da malária.
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"Esta recente descoberta, que se junta à primeira vacina contra a malária e à primeira cura radical da malária P. Vivax, é o resultado do compromisso contínuo da GSK com a inovação no domínio da malária. Uma ferramenta adicional, a Delftia tsuruhatensis Tres Cantos 1 (TC1), com uma abordagem inteiramente nova para o controlo da malária, tem potencial para reduzir ainda mais o enorme impacto da malária nos países endémicos e é mais uma prova de que, através da aplicação de uma série de abordagens de prevenção, poderemos finalmente ser capazes de erradicar esta doença terrível", considera Thomas Breuer, chief global health officer da GSK, em comunicado.
A descoberta da bactéria TC1 foi feita por cientistas da unidade de I&D de Saúde Global daGSK em Tres Cantos, Espanha, que trabalham na próxima geração de medicamentos contra a malária. Os cientistas observaram que os mosquitos de uma colónia de An. stephensi no seu insectário já não eram capazes de manter a infeção por P. falciparum - o tipo de malária mais prevalente e fatal em África, bem como noutras partes do mundo. As experiências confirmaram que uma estirpe específica de Delftia tsuruhatensis, denominada TC1, era responsável pela perda de capacidade infeciosa.
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Os investigadores da GSK, do Johns Hopkins Malaria Research Institute, e da Fundación MEDINA descobriram que a TC1 segrega quantidades muito pequenas de uma molécula, harmane, que inibe as fases iniciais do desenvolvimento do P. falciparum no intestino médio do mosquito. É importante destacar que os mosquitos expostos à bactéria TC1 ou a concentrações muito baixas de harmane apresentaram uma redução significativa na forma do parasita Plasmodium, que é transmitido aos seres humanos pela picada de um mosquito. Uma vez no intestino médio, a bactéria povoa de forma estável o intestino do mosquito e a inibição do P. falciparum dura mais de 16 dias e, possivelmente, durante todo o tempo de vida útil do mosquito.
A Delftia tsuruhatensis é uma bactéria de origem natural, que já se encontra amplamente distribuída em diferentes ecossistemas (água doce e marinha, solo e plantas), o que sugere um potencial de disseminação segura no ambiente. Os mosquitos não libertam a bactéria com a sua saliva quando se alimentam, o que sugere que não é transmitida aos seres humanos.
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O TC1 foi eficaz contra os mosquitos An. stephensi e An. gambia e que são os principais vetores da malária na região indo-iraniana e em África. O TC1 também demonstrou inibir dois tipos de parasitas da malária - o P. falciparum, o tipo de malária mais prevalente em África, e o parasita da malária dos roedores, o P. berghei. Estes resultados sugerem um potencial de inibição do desenvolvimento de todos os parasitas da malária que afetam os seres humanos (P. vivax,P. ovale e P. malaria e, para além do P. falciparum).
Está atualmente em curso um extenso estudo de semi-campo conduzido pela GSK com parceiros do IRSS no Burkina Faso e estão em curso estudos clínicos complementares sobre eficácia, capacidade de fabrico e segurança. "A malária é uma enorme ameaça para a saúde pública que mata milhões de crianças e restringe profundamente o desenvolvimento socioeconómico em África. Descobertas como a da bactéria TC1 têm um enorme potencial para África. Pretendemos fornecer uma solução viável que possa ser prontamente aplicada no terreno para controlar e prevenir a transmissão da malária, o que poderá ter um impacto profundo na saúde pública, de modo a ajudar a salvar a vida de milhões de crianças e a promover o desenvolvimento sustentável nas regiões onde a malária é endémica", defende Abdoulaye Diabaté, director of medical entomology and parasitology, IRSS.
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