Para Jamil Chade, o Brasil, nunca teve uma democracia para todos os brasileiros e não será com o candidato da extrema-direita às presidenciais e atual Presidente do país, Jair Bolsonaro, que alcançará esse "sonho democrático", elo que a única alternativa é um não ao 'bolsonarismo' e o voto no seu opositor nas eleições de dia 30, o antigo Chefe de Estado, Luíz Inácio Lula da Silva.
Por isso, esta é para o jornalista a eleição "mais importante da história democrática desde os anos 80" no Brasil. "Ela não vai definir só quem é o próximo Presidente, vai definir quem nós somos. A urna está sendo o espelho da sociedade [brasileira] naquele momento", afirmou o jornalista premiado como correspondente internacional em Genebra, na Suíça, em entrevista à Lusa, a propósito do lançamento em Portugal do seu novo livro em coautoria com a colega de profissão, Juliana Monteiro, e que tem como título "Ao Brasil com amor".
Um livro que os dois autores assumem, em declarações à Lusa, ter sido planeado para sair em altura de eleições no Brasil, com o objetivo de ser também um contributo para uma campanha contra o "bolsonarismo".
Esta eleição é "extremamente poderosa (...), porque vem num momento de uma encruzilhada no país", afirmou o jornalista. "Nós vamos querer continuar o sonho democrático ou nós vamos abrir mão disso, em nome de uma outra ideologia ou preocupação?" é a questão que se coloca, acrescentou Jamil Chade.
Na opinião do jornalista, a democracia no Brasil "existe na urna a cada quatro anos, mas não existiu na prática, não existiu no acesso a alimentos, à educação. Para milhares de brasileiros a democracia nunca chegou ainda. Então o mais correto talvez seja falar em construção ainda da democracia brasileira" e é esse o caminho que se procura nessas eleições.
Do mesmo modo, defendeu que não haverá um reencontro entre brasileiros num pós Bolsonaro. Somente "uma tentativa de um primeiro encontro", que passa por garantir que "as periferias, que os grupos mais vulneráveis e que as minorias passem a ter o direito de sonhar, da mesma forma que os grupos que, não só sonharam, mas que controlaram os sonhos".
Para que tudo isso aconteça, o jornalista defende que é preciso dizer um "não ao atual modelo" de governação, que "provou ser extremamente destrutivo da coesão social" e que se revelou "perigoso no que respeita ao desmantelamento da democracia", com "orçamentos secretos no parlamento, com a retirada de mecanismos de participação social na vida política".
Também no que respeita ao combate à corrupção muito defendido por Bolsonaro, o jornalista considera que, pelo contrário, "houve um desmonte" daquela luta no país sob a sua liderança, "com a interferência na justiça, com a troca do chefe da polícia federal quatro vezes e uma série de outras medidas".
Por isso, Jamil Chade não diz que Lula da Silva é o candidato ideal para governar o país, mas "o não ideal e o inaceitável é o atual Governo".
Na entrevista, o jornalista até admitiu que poderia votar em qualquer um de três dos candidatos na disputa à primeira volta das presidenciais, Ciro Gomes (do Partido Democrático Trabalhista - PDT), Simone Tebet (do Movimento Democrático Brasileiro - MDB) ou Lula da Silva (do Partido Trabalhista -- PT, mas que nestas eleições representa uma coligação de várias forças partidárias), se qualquer um deles tivesse "reais chances de derrubar esse movimento [bolsonarista] no Brasil".
"Porque o que precisamos acima de tudo é de restabelecer as bases do Estado de direito", sublinhou.
Quanto à mudança de voto dos brasileiros de uma eleição para outra, de um candidato de extrema-direita para um progressista como Lula da Silva, o jornalista e colunista, a partir de Genebra, dos órgãos de comunicação social brasileiros, UOL e Bandeirantes, e que também colabora para meios internacionais como The Guardian, El País, BBC, CNN, Al Jazeera e France24, entre outros, considera que "uma parcela muito grande da população brasileira não vota por ideologia. Vota por saber se no mês que vem ou no ano que vem a vida vai para melhor".
No Brasil de hoje há "dois défices muito grandes", um de diálogo e outro de amor, frisou Jamil Chade.
"Há o deficit de diálogo, a incapacidade de ouvir o outro, de entender a posição do outro, e que uma outra posição, eventualmente, pode ser (...)", afirmou o jornalista brasileiro, que foi eleito duas vezes como o melhor correspondente brasileiro no exterior.
Quanto à falta de amor, defendeu que há uma "estratégia política de usar o ódio como instrumento de voto, aplicando mais ódio
"Ao Brasil, com amor", é uma publicação da Autêntica Editora, que reúne a correspondência trocada pelos dois jornalistas, ambos residentes na Europa entre setembro de 2021 e julho de 2022. As cartas mostram as inquietações, expectativas e incertezas do momento histórico de transição que o Brasil atravessa.
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