Se é jogador assíduo da popular franquia de videojogos Championship Manager (CM), o nome Evandro Roncatto com certeza lhe dirá algo. Um então jovem avançado brasileiro, que, com apenas 17 anos, saltava para a equipa principal do Guarani depois de se sagrar campeão mundial de sub-17, em 2003.
Os mais ávidos jogadores recordam-se de um ‘diamante’ que, depois de lapidado, valia golos atrás de golos. “Era considerado uma grande promessa do futebol brasileiro e, no CM, tornei-me numa máquina de fazer golos”, recorda, em entrevista ao Desporto ao Minuto. Mas, no mundo real, as coisas não corriam tão bem como no virtual.
“Naquela época, quando subi à equipa principal, a situação do Guarani começou a ficar complicada. Faltava dinheiro, haviam brigas internas, e tinham muitas esperanças num menino de 17 anos. Atiraram com tudo para cima das costas de um menino. Isso foi fundamental para atrapalhar a minha carreira”, lamentou.
Evandro Roncatto fazia tudo para resistir à pressão e, animado pelas expectativas em seu redor, apontava alto. “O pessoal da minha idade queria ser como Ronaldo, Romário… E eu sentia-me realizado, porque podia tentar ser igual a eles. Foi muito gratificante, tudo o que suei para chegar a profissional foi recompensado”.
As coisas não correram como esperado, mas, talvez empolado pelo ‘mito’ dos videojogos, o Belenenses apostou no avançado, então já com 21 anos. E foi só aí que Roncatto percebeu o porquê de tanta expectativa.
“Só comecei a ter noção quando fui para Portugal, aí é que fiquei a saber o que era o CM. Nem imaginava o que era. Até porque aqui no Brasil era muito diferente. Agora todos têm computador, mas, antigamente, eu não vivia muito com computador. As minhas amizades eram feitas na rua”, lembra.
No Restelo, o brasileiro encontrou uma “equipa muito boa”, que podia “ter ido mais além, se não tivesse surgido o caso do Meyong”, altura em que o Belenenses perdeu seis pontos e desceu para o oitavo lugar da classificação.
Se a primeira temporada correu bem, a segunda nem tanto. “Pressionava-me muito a mim mesmo para atingir objetivos e acabava por não dar certo”, lamenta. Seguiu-se um curto período no Paços de Ferreira. Depois, os cipriotas do Ermis Aradippou, quanto começou a ‘derrocada’.
“Podia ter continuado em Portugal, rendido mais e, quem sabe, ter ido para uma equipa grande. Mas acabei por olhar para o lado financeiro e fui embora para o Chipre”, recorda, desgostoso, admitindo que “foi uma decisão difícil”.
“Não conhecia o Chipre, não sabia nada. A única coisa que sabia é que tinha uma equipa na Liga dos Campeões. Mas jogavam lá alguns portugueses. O Wender, que tinha jogado no Sporting de Braga e no Sporting, também estava lá e falou-me muito bem do país. Olhei para o lado financeiro e deixei um país muito evoluído a nível do futebol”, reconhece.
Quando parecia que não podia piorar… piorou. “A minha carreira deu uma queda. Foi complicado. Quando sai do Chipre fui para a Bulgária [Beroe] e não me adaptei àquele futebol. Fiquei lá seis meses e depois fui para a Grécia [Niki Volos]. Foi muito complicado, não recebia salários. Ainda hoje não recebi nada”.
Como que dando uma segunda oportunidade a si mesmo, Evandro Roncatto decidiu arriscar num regresso a Portugal. “No Oriental tive uma sequência de jogos, fiz golos… e fui para o Cazaquistão [Irtysh]”.
“Correu muito bem lá. Em quatro meses fiz 12 jogos e seis golos. Tinha tudo para continuar. Mas, infelizmente, não chegámos a acordo, acabei por não ficar lá e voltei ao Brasil”. Quase dez anos depois de abandonar o Guarani rumo ao futebol europeu, o avançado ingressou no Rio Branco, da segunda divisão do Campeonato Paulista.
“Hoje não faço planos. Não sou aquela pessoa obcecada em fazer planos. Às vezes fazemos planos, mas Deus tem algo melhor para a nossa vida. Agora, deixo as coisas acontecer. Deus sabe o que faz e tudo tem a sua hora”, diz.
Com uma carreira cheia de ‘tropeções’ e ‘reviravoltas’, a mítica “máquina de golos” do CM admite que poderia ter dado muito mais, mas avisa: “Nunca vou desanimar e sei que coisas boas vão acontecer no futuro”.
“Tive decisões e escolhas que atrapalharam a minha carreira. Mas cumpri o meu sonho, tornei-me jogador. Sou uma pessoa realizada porque joguei em palcos que nunca imaginei jogar, contra equipas que jamais imaginaria defrontar. Só tenho a agradecer tudo o que aconteceu na minha carreira. E sei que ainda muitas coisas estão para vir”, conclui Evandro Roncatto, o homem que, em tempos, tanta rede virtual fez abanar.