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"Em Portugal, não há coragem. Não se valorizam os bons trabalhos"

Em entrevista ao Desporto ao Minuto, Emanuel Simões, antigo dirigente do Santa Clara, falou sobre o futuro do futebol português e da grande diferença entre as cinco principais equipas e as restantes do campeonato nacional, apelando ainda à aposta na formação.

"Em Portugal, não há coragem. Não se valorizam os bons trabalhos"
Notícias ao Minuto

07:21 - 19/01/22 por Rodrigo Querido

Desporto Exclusivo

Emanuel Simões, antigo dirigente do Santa Clara, traçou, em entrevista exclusiva ao Desporto ao Minuto, aquele que é o panorama atual do futebol português, destacando a cada vez maior distância entre os maiores clubes do futebol português e os restantes.

Para além de analisar a passagem pelo Santa Clara, o também treinador pediu uma maior aposta na formação, destacando que os clubes têm de olhar mais vezes de olhar para os campeonato mais baixos em Portugal, em vez de ir 'pescar' ao estrangeiro.

Emanuel Simões destaca, ainda, a enorme qualidade que existe, quer nos treinadores portugueses, quer nos jogadores nacionais, pedindo um futebol que se coadune com estes valores.

O futebol português, na minha opinião, tem um fosso cada vez maiorHá muitos bons jogadores em Portugal que podem render estes melhores jogadores, como é o caso do Morita no Santa Clara...

Os dirigentes têm de tem esta capacidade de lidar com a crítica dos adeptos. No futebol, não há insubstituíveis. Os jogadores saem, os clubes continuam a ganhar. O importante é o coletivo e a mensagem que passas. Enquanto as pessoas não perceberem isso, vamos continuar a este nível. O futebol português, na minha opinião, tem um fosso cada vez maior. Aproximaram-se dois clubes, mas o fosso entre os cinco primeiros e o resto continua a crescer. Está na altura de equilibrar isto muito mais e só vamos equilibrar se conseguirmos comprar bem, vender melhor e investir em tudo, como melhores condições de treino, melhores treinadores e jogadores. Mas para investir é preciso ter dinheiro e, por isso, vender.

E para se ter esse dinheiro, é preciso rentabilizar os jogadores que temos. O Ajax é uma boa prova disso, assim como o Barcelona há uns anos. Em Portugal, temos de perder a ideia de ir comprar constantemente fora. Temos os melhores jogadores do mundo em todos os escalões, os melhores treinadores do mundo, dos melhores treinadores do mundo e por que não temos o melhor futebol do mundo? Pensamos sempre no mesmo, e essas são algumas das questões que levam a que projetos sejam interrompidos e não haja continuidade uma vez que se pensa muito no momento e no resultado.

E Portugal tem cada vez mais competições de futebol para promover essa aposta na formação...

Temos competições a mais para o futebol que temos, e, se queremos apostar tanto na formação, porque não fazemos como noutros países, em que na Taça da Liga têm de estar obrigatoriamente um número elevado de jogadores até determinada idade? Porque é que temos de ter o campeonato sub-23, equipas B, I Liga, II Liga, Liga 3, Campeonato de Portugal e os distritais todos? Porque não arranjamos forma de promover o nosso produto? Eu não consigo perceber isto…

Nunca é tarde para uma oportunidadeTemos cada vez mais casos de treinadores que sobem de divisões mais baixas até ao topo do futebol português…

Nos meus 12 anos a treinar, passei por todos os escalões dos distritais, fiz Campeonato Nacional de Seniores [agora Campeonato de Portugal], II Liga e cheguei à I Liga como dirigente. Tenho a noção perfeita e conhecimento daquilo que há abaixo do topo do futebol português. Quando estava no Vizela, há uns anos, e tenho essa notícia, guardada nos meus rascunhos, que saiu num jornal de relevo antes do jogo com o Sporting para os oitavos de final da Taça e que dizia ‘equipa de velhos e dispensados faz sensação’. E realmente era a equipa que consegui fazer na altura. Tinha jogadores com 38 e 39 anos a jogar sem qualquer problema.

O meu guarda-redes com 36 anos disse que essa época tinha sido a melhor da carreira dele. O que quero dizer com isto é que nunca é tarde para uma oportunidade, mas, acima de tudo, para termos a coragem de apostarmos naquilo que é possível. E não é por isso que vai haver menos qualidade. Nessa época, fomos à fase de subida, mas falhámos. Ninguém dava cinco tostões por nós, mas fizemos uma época fabulosa. No Merelinense, no ano passado, íamos no mesmo caminho, e o jogador mais caro ganhava 500 euros. Fizemos o brilharete que fizemos e ninguém acreditava que íamos à fase de subida. Ficámos a um ponto da subida. Muitas vezes, fico indignado porque não há coragem para trabalhar. E, em Portugal, não se valorizam os bons trabalhos, assim como há jogadores que não são valorizados.Jovens do Santa Clara têm de competir em algo mais exigente do que o atualO Santa Clara tem, na formação, jovens nos quais possa apostar e, posteriormente, vender?

Acho que tem, mas tem de mudar o modelo. O Santa Clara está num contexto do resto do futebol português, que é a questão da ilha. Na Madeira, há muito mais clubes do que nos Açores. O Santa Clara tem uma dificuldade ao nível da competitividade se quiser fazer jogos treino ou observar jogadores. Não existem atletas do mesmo nível ou do patamar abaixo, estão muito longe. O patamar é muito distante entre a I Liga e o Campeonato de Portugal. Os dirigentes do clube têm de pensar numa estratégia concertada com o resto dos Açores. Depois de ter estado lá tirei essas mesmas conclusões. Se chegarem a uma estratégia conjunta, os outros clubes vão ficar a ganhar porque se vão tornar mais fortes, e o Santa Clara torna-se mais forte também.

Para mim, os melhores jogadores dos juvenis do Santa Clara têm de passar a jogar nos juniores e contra jogadores desse escalão. Eu até sou contra queimar etapas, mas, no contexto da ilha, têm de ser queimadas etapas para os obrigar de uma forma mais rápida a enrijecer e crescerem mais rápido. E os juniores têm de jogar no distrital porque eles não têm ninguém contra quem jogar. Com isto, os melhores jogadores do Santa Clara vão ser os melhores noutros clubes, essas equipas vão crescer mais e toda a gente vai crescer mais. E, no final da etapa da formação, os jogadores vão dar ainda mais ao Santa Clara. No escalão deles, os atletas do Santa Clara ganham 14-0 ou 15-0 e não aprendem nada, e vão chegar a um ponto que não vão saber lidar com a deceção. Têm de competir em algo mais exigente do que o atual.

E quais são os projetos para as próximas semanas?

O meu objetivo é voltar o quanto antes ao trabalho dentro das quatro linhas, mas não estou obcecado com isso. O que vai acontecer comigo nos próximos tempos é começar a observar jogadores e equipas, mas não me vou mostrar às equipas. Gosto de ter uma listagem de jogadores e de os ver jogar. Há jogadores que já identifique no InStat, gostei e agora quero ir vê-los ao vivo. Não sei onde vou estar a treinar, nem que que divisão vou estar nos próximos tempos, mas quero, e acho que vou consegui voltar a treinar rapidamente, estar preparado para, quando chegar a esse projeto, ter o conhecimento de qualquer divisão e qualquer tipo de jogador que perdi um bocadinho enquanto fui administrador. Andei a observar jogadores de outro nível, e eu gosto é de observar jovens e jogadores lá de baixo.

Leia Também: "Sucederam-se coisas no Santa Clara que são casos de polícia"

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