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Teatro é sempre sobre o contemporâneo para Christiane Jatahy

A encenadora Christiane Jatahy defende que o teatro é "sempre sobre o contemporâneo", sobre o presente, para "acertar no alvo" e entrar na essência da obra.

Teatro é sempre sobre o contemporâneo para Christiane Jatahy
Notícias ao Minuto

09:28 - 05/03/18 por Lusa

Cultura Artistas

"Para mim, o teatro é sempre sobre o contemporâneo. Porque o espetador está no momento contemporâneo. Então, eu não tenho como não falar com esse espectador do momento de hoje", disse à agência Lusa, à margem da sua apresentação como Artista na Cidade 2018, que decorreu esta noite, no Teatro São Luiz, em Lisboa.

No trabalho da encenadora e realizadora brasileira, qualquer obra do passado "é sempre vista [a partir] do momento presente". "Então o contemporâneo tem de estar nela e isso não quer dizer que estou saindo dela para construir alguma coisa, mas ao contrário".

"Dou sempre o exemplo do estilingue [fisga]: é como puxar para fora, para esticar, para, na verdade, acertar no alvo", sustentou. Por isso, Christiane Jatahy sublinha que "puxa pelo momento presente, para entrar na essência da obra".

Assim vê melhor o real, argumenta a encenadora e realizadora brasileira, que faz de cada produção um acontecimento multidisciplinar, entre a ficção e a realidade.

"É mesmo 'puxar' pelo momento presente para entrar na essência da obra", acrescenta, sublinhando que, quando escolhe uma obra, é porque acha "que, de alguma maneira, ela se reflete no momento presente".

Nascida no Rio de Janeiro, em 1968, o trabalho mais recente da criadora é "Ítaca - Nossa odisseia I", que apresentará no S. Luiz, de 07 a 11 de junho.

Esta será a primeira parte de um díptico, inspirado na "Odisseia", de Homero, que vai prosseguir em 2019, com um projeto sobre viagens, revelou Christiane Jatahy à agência Lusa.

É um projeto - disse - em que irá documentar "as verdadeiras odisseias, as verdadeiras travessias, levando a ficção para essas travessias diárias [de imigrantes e refugiados], e depois documentar a obra".

Para elaborar a segunda parte do díptico, a criadora irá trabalhar sobre as viagens que se fazem "nos nossos dias em África, na Europa, no Brasil e nas suas fronteiras, assim como em toda a linha do Mediterrâneo".

No trabalho de Christiane Jatahy, que em 2016 abriu o Festival Alkantara, no S. Luiz, com "E se elas fossem para Moscou", a partir de "As três irmãs", de Tchekov (numa apresentação em que coube o protesto pela destituição da ex-Presidente brasileira Dilma Rousseff), é fundamental a escolha do texto de que parte o seu trabalho.

E parte muitas vezes de textos clássicos e universais, para os "reinterpretar" à luz do contemporâneo, indica.

"Quando penso um projeto, não é mesmo só sobre a abordagem de um texto, é também sobre como esse texto - e porque é esse texto - está inserido hoje, para mim, [na atualidade], e que relação [tenho com ele]", afirmou.

"Eu fundamento a minha pesquisa na relação com esse texto", argumenta, "porque cada projeto tem a sua característica, evidentemente, mas existem algumas questões que vêm antes de tudo, sustenta.

"Não conta apenas o próprio material dramatúrgico, mas sim saber como é que ele se vai desdobrar num documentário ou numa pesquisa paralela", defende.

"Quando decidi que ia fazer o 'Se elas fossem para Moscou', o que me interessava era partir da realidade, ou seja, olhar para fora, olhar para o mundo e trazer esse mundo para dentro da ficção", disse.

"Mas também pode acontecer o contrário e levar a ficção para a realidade", admite. E esses dois ângulos são, nas suas palavras, a sua "linha de caminho", a sua "linha de entrada e saída", "muitas vezes, até para me poder aproximar do que é a essência dessa ficção ou para se constituir uma nova ficção", observa.

"Quando você coloca tanto um filme como uma peça, e você tem um espectador que assiste, aquilo imediatamente é entendido como ficção. Ou seja, o que é real e o que não é real, em cena, é mesmo muito relativo. Mas esse material que parte do aqui e do agora e da relação com o momento presente, com as questões que são do mundo, são fundamentais para a constituição do corpo do trabalho", disse à Lusa.

"Isso é uma das partes importantes do meu trabalho, juntamente com a escolha do texto", ou seja, "do local onde quero aportar".

Outra das variáveis importantes no trabalho da criadora é o espaço. "Espaço não como cenografia, mas no sentido de questionar como é que o espetador o vai ver. Espaço como a relação que vai usar, da perspetiva do espetador em cena", sublinha.

Duas variáveis que a criadora considera muito importantes no seu trabalho, uma vez que têm sempre a ver com o passado, "enquanto memória que nos forma", e com "o presente que se vive", conclui.

Christane Jatahy é artista associada do Théâtre Nacional Wallonie-Bruxelles e do Le CentQuatre e Odéon Théâtre, em Paris, onde estreará "Ítaca", no dia 16.

Para a construção desta primeira parte do díptico a continuar no próximo ano, a artista entrevistou refugiados e improvisou com os atores, antes de escrever o texto final, transfigurando as faces de Penélope e de Ulisses, de Homero, em diferentes personagens.

Um processo de criação que expõe no livro "Fronteiras invisíveis: diálogos para a criação da floresta que anda", livro que lançará em 19 de maio, no Teatro Nacional D. Maria II.

Christiane Jatahy atuou em Portugal, anteriormente, no Tetaro Joaquim Benite, no Festival de Almada (2006), no Teatro Nacional São João, no Porto, e no S. Luiz, em Lisboa.

Jatahy sucede ao bailarino e coreógrafo congolês Faustin Linyekula, Artista na Cidade de Lisboa em 2016. O dramaturgo e encenador britânico Tim Etchells, em 2014, e a coreógrafa belga Anne Teresa de Keersmaeker, em 2012, foram os anteriores convidados da bienal que junta diferentes palcos e instituições da cidade.

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