Ribeiro de Mello, entre os livros da Cabra-Cega e os de Sade e Masoch
O editor Fernando Ribeiro de Mello (1941-1992), cujo trabalho está agora exposto em Lisboa, fundou a Afrodite em 1965, publicou Marquês de Sade e Sacher-Masoch, mas também livros infantis com Maria Alberta Menéres, sob a chancela Cabra-Cega.
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Obras como a 'Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica', coordenada por Natália Correia, com ilustrações do pintor surrealista Cruzeiro Seixas, e textos de Camões a Antero, Gomes Leal e Cesariny, ou a 'Antologia do humor português', dirigida por Ernesto Sampaio, com capa e grafismo de Sena da Silva, são algumas das mais representativas da editora.
Nos últimos anos da ditadura, a Afrodite mobilizou artistas plásticos como Eduardo Batarda, Martim Avillez, João Machado, José Rodrigues e Rocha de Sousa, autores como Manuel João Gomes, Luiza Neto Jorge, Aníbal Fernandes, publicou Mário de Sá Carneiro, Almada Negreiros, Luiz Pacheco e Cesariny, André Breton e Alfred Jarry, e os mais novos Armando Silva Carvalho, Álvaro Guerra ou Emma Santos.
Resgatou clássicos como 'Peregrinação', de Fernão Mendes Pinto, 'História Trágico-Marítima', de Bernardo Gomes de Brito, 'O Manual dos Inquisidores', de Nicolau Emérico, e 'Arte de Furtar', obra anónima do século XVII.
Quando quase todas as suas edições foram proibidas pela censura, retiradas do mercado e destruídas pela PIDE, Ribeiro de Mello manteve a atividade e dedicou-se então à edição de livros infantis.
Fundou a coleção Cabra-Cega, onde se estrearam autores como António Torrado ('Pinguim em fundo branco'), Maria Alberta Menéres ('Conversas com versos') e António José Forte ('Uma rosa na tromba de um elefante'), e publicou livros ilustrados por muito jovens artistas, recém-formados, como Fernando Calhau, Eduardo Batarda ou Julião Sarmento.
Dos sete livros que lançou no primeiro ano de atividade, Ribeiro de Mello teve os seis primeiros proibidos: 'Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica' e 'A Filosofia na Alcova', que foram alvo de processos nos tribunais plenários da ditadura, 'Kamasutra', 'Vénus de Kazabaika', de Sacher-Masoch, 'Antologia de Vanguarda' e 'O Vinho e a Lira', ambos de Natália Correia.
A esta lista juntar-se-iam mais tarde a 'Antologia do Conto Abominável' (1969) e 'Anti-Dühring', de Friedrich Engels (1971).
Após o 25 de Abril, com a queda da censura, Ribeiro de Mello procurou manter o caráter de 'editor maldito', com publicações contra a corrente, que iam de 'Mein Kampf' (1976), de Adolf Hitler, a '26 Anos na União Soviética', de Francisco Ferreira.
Não abdicou da linha original, com autores como Alfred Jarry ('O Super Macho'), Natália Correia ('Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente') e Luiz Pacheco ('Textos Malditos'), ou ainda o 'Pequeno Livro Vermelho do Estudante', 'manual de resistência' com raízes no Maio de 1968. Mas a concorrência e a acumulação de dívidas iriam pôr a editora em causa.
Em 1990, Ribeiro de Mello admitia que já não era tempo de 'editar contra'. E a editora desapareceria com a sua morte, dois anos mais tarde.
No final da década, em 1999, a 'Antologia de poesia portuguesa erótica e satírica' seria resgatada pela Antígona e a Frenesí, numa nova edição conjunta.
A 'Antologia do Humor Português', no entanto, mantém-se uma raridade de alfarrabista, com as suas mais de mil páginas e uma seleção que vai das cantigas medievais 'd'Escarnho e Mal Dizer' ao século XX de Alexandre O'Neill e Pedro Oom, sem esquecer os mais críticos textos de Gil Vicente e Fernão Mendes Pinto, Cavaleiro de Oliveira e António José da Silva, Garrett, Camilo, Eça ou Almada Negreiros, com o 'Manifesto anti-Dantas'.
As obras estão reunidas na exposição 'Insólita ofensiva de corrupção': a Afrodite de Fernando Ribeiro de Mello durante o Estado Novo (e depois)', aberta ao público na Biblioteca Nacional até 20 de maio.
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