"Começámos há cerca de um ano e meio a revisitar o regime jurídico das acessibilidades porque, além de já estar de certa forma desajustado em algumas matérias, entendemos que devemos olhar para a acessibilidade não apenas como uma acessibilidade física ou barreira física", disse à agência Lusa Clara Marques Mendes.
A revisão do documento está a ser estudada "por um grupo de trabalho que foi criado com várias áreas governativas e que tem também o envolvimento de várias entidades", afirmou a secretária de Estado da Ação Social e da Inclusão precisando que está a ser ouvida a Academia e entidades como a Associação Salvador, "no sentido de brevemente ser apresentado um trabalho para que este regime seja revisto".
A governante falava em Óbidos, à margem do Seminário Internacional de Inclusão, inserido na programação do Folio -- Festival Literário Internacional, que este ano decorre sobre o tema "Fronteiras".
O festival é "o único em Portugal que se debruça sobre esta questão, dedicando desde 2022 um dia inteiro à inclusão", afirmou a responsável pelo seminário, Célia Sousa, coordenadora do Centro de Recursos para a Inclusão Digital (CRID), do Instituto Politécnico de Leiria (IPL).
Na abertura do encontro, Célia Sousa aproveitou para partilhar com a secretária de Estado "desassossegos" de um setor em que "ainda existem muitas fronteiras", com a maioria das pessoas "a pensar que acessibilidade é apenas ter rampas ou percursos táteis".
Em Portugal, as livrarias e bibliotecas "continuam sem livros acessíveis em braille, em áudio, em escrita fácil, em linguagem pictográfica ou com vídeo e em Língua Gestual", lamentou a coordenadora do CRID, criticando o facto de a maioria das editoras não pesarem na acessibilidade.
No país em que se fala "tanto de inclusão, equidade e diversidade", acrescentou, "uma parte significativa da população, entre 15% e 20%, continua sem poder usufruir livremente de uma peça de teatro, de um sessão de cinema, de um concerto".
Na lista de preocupações, Célia Sousa lamentou que "a escola, que deve ser para todos, ainda não tenha histórias acessíveis", e que a comunicação acessível "ainda não seja uma realidade generalizada".
Nas "irritações" quanto a este segmento, lamentou "que só de fale de pessoas com deficiência para retratar tragédias ou exaltar feitos extraordinários", apelidando-as de "coitadinhas ou super-heróis, e quase nunca, simplesmente, [se fale de] pessoas".
Célia Sousa deixou ainda à secretária de Estado o repto para que se constitua um grupo de trabalho entre os ministérios da Segurança Social, da Educação e da Cultura, para discutir o acesso ao livro para todos.
O Fólio - Festival Literário Internacional de Óbidos celebra este ano a sua 10.ª edição com três prémios Nobel, e escritores de vários países a participar em mais de 450 iniciativas culturais, a acontecer na vila até ao próximo domingo.
O festival é organizado pelo município de Óbidos, em parceria com a empresa municipal Óbidos Criativa, a Ler Devagar e a Fundação Inatel, e realiza-se desde 2015 na vila classificada como Cidade Criativa da Literatura pela UNESCO.
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