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Dois atores surdos dão vida a 'Zoo Story' que estreia no Teatro D. Maria

A necessidade de entendimento e de comunicação, sem pretensiosismos nem artificialismos, é o ponto de partida do conflito existente na peça 'Zoo Story', de Edward Albee, que se estreia na quinta-feira, no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa.

Dois atores surdos dão vida a 'Zoo Story' que estreia no Teatro D. Maria
Notícias ao Minuto

11:15 - 05/10/22 por Lusa

Cultura Teatro

Dirigida por Marco Paiva e toda falada em Língua Gestual Portuguesa, a peça, que estará em cena na sala Estúdio, conta com dois intérpretes surdos e surge na continuidade que o encenador e diretor da produtora Terra Amarela tinha realizado em coprodução com o D. Maria II, na peça 'Calígula morreu. Eu não', de Cláudia Cedó, que esteve em cena no ano passado.

A peça escrita pelo dramaturgo norte-americano, em 1959, e 'Na solidão nos campos de algodão', de Bernard-Marie Koltès, eram os textos que tinham ficado em cima da mesa para poderem ser trabalhados numa produção posterior a 'Calígula morreu. Eu não', e que já fora discutida com Tiago Rodrigues, então diretor do D. Maria II, explicou Marco Paiva.

A escolha tem por base o facto de serem dois textos "muito retóricos, onde se encontra a poesia e filosofia, e muito assentes no discurso oral", explicou o encenador, acrescentando ter optado pela peça de Albee "por ser um texto contemporâneo escrito para teatro, e mais ágil de traduzir para língua gestual".

A peça começa com a projeção num ecrã de imagens de Sigourney Weaver em 'Alien - o 8.º passageiro', filme realizado por Ridley Scott, em 1979.

O filme é o preferido do ator Tony Weaver, que interpreta Peter, e serviu de pretexto para a escolha do nome artístico deste.

Num encontro involuntário, Peter encontra-se com Jerry, personagem interpretada por Marta Sales, que insiste várias vezes ter ido a um jardim zoológico antes de se encontrar e começar a dialogar com Peter.

Entender as relações humanas fora o pretexto de Jerry para a ida ao jardim zoológico, e é usado na peça para estabelecer um paralelismo entre a construção de um objeto cénico num espaço protegido e ficcional para também tentarmos entender as relações humanas, explicou Marco Paiva.

A comunicação e o lugar da exposição são pretextos que perpassam toda a peça que assenta num encontro involuntário entre duas pessoas que, ao dialogarem, expõem o isolamento, a segregação e a desumanização das sociedades modernas.

'Zoo Story' é uma criação que parte para um trabalho centrado na falência da norma, buscando encontrar uma redenção para as relações humanas ao mesmo tempo que desmistifica e explora outras formas de comunicar.

Nas palavras de Marco Paiva, 'Zoo Story' é um "espetáculo que viaja sempre entre o objeto ficcional e questões muito práticas", que "têm de ser pensadas e praticadas fora da sala de espetáculos".

"O nosso desejo é que o espetador, quando sair, tenha esta perceção muito clara de que aquilo que nós aqui abordamos e propomos é algo que tem de continuar a ser pensado e praticado fora da sala de espetáculos", disse.

Nomeadamente, "a relação com a língua gestual ou com as artes performativas que começam a encontrar outros lugares de expressão que, de certa maneira, não são os lugares mais normativos", sustentou.

Assim, trata-se de encontrar outras maneiras de relação com o próprio teatro. Afinal, o encontro com artistas que obrigam os encenadores a questionar formas instaladas de fazer - formas instaladas que, de certa maneira, os têm adormecido na prática performativa - é também objetivo do trabalho de Marco Paiva, encenador e diretor artístico da produtora Terra Amarela, que tem trabalhado com artistas com algumas limitações.

Ao mesmo tempo, como com 'Zoo story' demonstra, existe uma língua, que é a Língua Gestual Portuguesa. E, a partir da cultura e da arte, será possível que esta língua saia do plano ficcional, que é a sala de teatro, para aquilo que é a vida lá fora, acrescentou Marco Paiva.

O encenador acredita que o aparecimento de mais artistas e de mais projetos destes, "também acaba por contaminar os comportamentos das relações sociais quotidianas".

Marco Paiva tem "esperança nas artes performativas, naquilo que ainda está para vir e naquilo que a cultura e a arte podem ter de motor impulsionador de uma relação quotidiana mais feliz, livre e democrática".

Até ao final deste ano, 'Zoo story' será representada em Loulé e Águeda, e, no âmbito da Rede Eunice do D. Maria II, em Felgueiras, Ponte de Lima, Barcelos e Lamego. Funchal e Guimarães são outras das cidades onde a peça será representada.

O espetáculo vai sempre com um conjunto de ações de mediação para que todas as temáticas que envolve possam ser discutidas com professores, alunos e públicos.

Ao mesmo tempo da digressão de 'Zoo story', Marco Paiva estará também a trabalhar na próxima produção conjunta da Terra Amarela com o D. Maria II - 'Ricardo III', numa adaptação do texto de Shakespeare por um poeta surdo espanhol a cuja produção se associou igualmente o Centro Nacional Dramático de Madrid, avançou o encenador à Lusa.

Com récitas de quarta-feira a sábado, às 19h30, e, ao domingo, às 16h30, 'Zoo story' estará em cena até 23 de outubro, no Nacional D. Maria. No dia 16, haverá uma conversa com os artistas.

A cenografia é de F. Ribeiro, os figurinos de José António Tenente, o desenho de luz de Nuno Samora, a sonoplastia de José Alberto Gomes e a videoarte de Mário Melo Costa.

Na produção conjunta da peça estão também o Cine-Teatro Louletano, o Centro de Artes de Águeda, o Centro Cultural Vila Flor e a Culturproject.

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