Meteorologia

  • 19 ABRIL 2024
Tempo
17º
MIN 15º MÁX 21º

Museu Nacional de Arte Antiga sem conservadores de pintura nem manutenção

A existência de apenas dois técnicos de manutenção, para todo o Museu Nacional de Arte Antiga, em vez da anterior equipa, e a falta de conservadores, na coleção de pintura, foram aspetos revelados hoje pelo diretor da instituição, no parlamento.

Museu Nacional de Arte Antiga sem conservadores de pintura nem manutenção
Notícias ao Minuto

23:05 - 07/07/21 por Lusa

Cultura MNAA

O diretor do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), Joaquim Oliveira Caetano, foi ouvido na comissão parlamentar de Cultura e Comunicação, a pedido do Bloco de Esquerda (BE), por causa da "situação de colapso no funcionamento" da instituição, segundo o requerimento apresentado pelo grupo parlamentar e sublinhado hoje pela deputada Alexandra Vieira, na intervenção de abertura da audição.

"O que se passa no MNAA é o exemplo mais trágico e paradigmático das políticas públicas para o setor [do património], nas últimas décadas", durante as quais a aplicação de dinheiro foi sempre encarada "como despesa e não como investimento".

"Infiltrações em salas com acervos valiosos, climatização avariada, problemas de eletricidade, falta gritante de assistentes de sala", a permanência de 'vitrines' provisórias, há décadas, foram exemplos apontados pela deputada do BE, que Joaquim Caetano definiu como um "retrato bastante certo dos problemas essenciais, ou pelo menos dos mais urgentes".

"As 'vitrines' não podiam ser [um assunto] mais atual. Ainda ontem se desmoronou uma da ourivesaria, uma provisória, feita para durar seis meses e há 40 anos em uso", acrescentou.

A audição de Joaquim Oliveira Caetano acontece depois de, no final de maio, o MNAA ter anunciado que iria voltar a encerrar várias salas da exposição permanente, por falta de vigilantes.

No final de junho, em declarações à agência Lusa, o diretor considerou de "rutura" a situação do museu, e mostrou-se preocupado com a proteção do património, pelos "problemas recorrentes" a que se juntam, entre outros, infiltrações no último piso do anexo e a paralisação de um dos elevadores.

Na passada sexta-feira, o Governo anunciou que tinham sido desbloqueadas verbas, para o início de obras urgentes, já este mês, assim como para contratação de vigilantes adicionais, que permitam a reabertura das salas.

Em declarações à Lusa, a secretária de Estado Adjunta e do Património Cultural, Ângela Ferreira, garantiu então que tinham sido lançados os procedimentos necessários, para que, ainda este mês, fosse possível iniciar as obras nas coberturas e resolver os problemas no sistema de ar condicionado e na instalação elétrica, num total de intervenções orçadas em 300 mil euros.

A entrada de novos vigilantes, ainda segundo a governante, será feita em regime de 'outsourcing', havendo a expectativa de encontrar soluções definitivas até ao final do ano, para se evitarem os mesmos problemas, em 2022.

Joaquim Caetano disse hoje no parlamento que muitas destas intervenções não podiam esperar pelos investimentos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). "São de tal forma urgentes que poderiam vir a pôr em causa, a muito curto prazo, situações delicadas de conservação, e o mesmo em relação aos vigilantes: no ano passado havia 26, diurnos, este ano temos 19".

"Algumas obras são absolutamente essenciais para estancar a degradação em áreas vitais do museu, como a questão dos telhados, a iluminação", disse o diretor, referindo-se à reunião com o Governo em que foram decididas as obras de urgência.

"Trata-se de estancar uma ferida e evitar que se acumulem irreversivelmente estes problemas, que possam refletir-se na conservação [da coleção do museu]. É essencial que aconteça muito rapidamente, antes de esperarmos pelo PRR", afirmou.

A falta de investimento em equipamentos e em meios humanos criou "as duas grandes áreas" em situação mais grave, no MNAA e noutros museus, apontadas por Joaquim Caetano, aos deputados.

No caso do MNAA, recordou, houve os investimentos básicos para a 17.ª Exposição de Arte, Ciência e Cultura, do Conselho da Europa, organizada por Portugal em 1983, e depois alguma remodelação para a Capital Europeia da Cultura, em 1994. Hoje, "são os mesmos equipamentos que estão presentes, muitíssimo envelhecidos; e durante a última década e meia estiveram, por força das dificuldades económicas, muito tempo sem manutenção, o que acabou por agravar bastante a sua 'performance'".

"A outra parte [do problema] é o investimento humano, a sucessiva e muito rápida perda de recursos, nomeadamente na vigilância. Não podemos abrir as 80 salas do museu com os nove funcionários, que tínhamos na semana passada".

"Seria necessário entrarem pelo menos 12 [vigilantes], para termos a certeza de rotação sem problemas", afirmou.

Joaquim Caetano fez questão de lembrar que o trabalho de "vigilância obriga a fazer três fins de semana por mês, feriados, com situação remuneratória nada compensadora", o que "leva a que a entrada de trabalhadores para estas funções, num quadro de contrato permanente, seja menos permanente do que parece, porque muitos acabam por pedir transferência".

"Era importante encontrar mecanismos que tornem esta carreira mais atrativa, menos penalizadora e assim permitir maior estabilidade para as instituições e os trabalhadores", alertou, recordando que o 'outsourcing' também não é solução. "Pode funcionar pontualmente, mas dentro de uma estratégia marcada pela instituição. A permanência, a ligação às equipas é essencial".

Ao nível dos conservadores e restauradores, Joaquim Caetano recordou o envelhecimento dos profissionais e o não rejuvenescimento dos quadros, essencial "para que haja transmissão do saber".

"Os problemas existentes no MNAA e noutros museus são problemas cumulativos. Cada demora em resolver os problemas torna-os mais irresolúveis", prosseguiu.

Caetano lembrou que, quando entrou para o MNAA, há 30 anos, "era normal cada coleção ter duas pessoas a trabalhar", ao nível de conservadores. "Neste momento, nenhuma tem duas pessoas, a maior parte não tem ninguém", acrescentou, referindo-se a áreas como as de pintura, escultura, desenho e gravura, ourivesaria, mobiliário, cerâmica, têxtil, vidro e arte da Expansão, em que se divide o acervo do museu.

"No estudo das coleções e no conhecimento essencial para se fazer o trabalho do museu, praticamente voltámos a níveis anteriores a 1980", garantiu.

Joaquim Caetano deu como exemplo a coleção de Pintura, uma das mais requisitadas do MNAA a nível internacional, que agora se encontra sem conservadores, depois da sua passagem a diretor, em 2019, e da reforma do historiador de arte José Alberto Seabra Carvalho, anterior diretor adjunto do MNAA. Esta coleção reúne autores como Piero della Francesca, Hieronymus Bosch, Albrecht Dürer, Hans Holbein ou Nuno Gonçalves.

Quanto à equipa de manutenção, uma das mais importantes numa instituição museológica, está neste momento com duas pessoas. "Quando entrei, em 1990, eram mais de dez. Um [dos técnicos atuais] vai reformar-se este ano e outro pediu transferência".

Sobre as bolsas para estágios científicos no museu, Joaquim Caetano frisou que não resolvem os problemas, e exigem a mobilização de meios não existentes. "São um bom instrumento para chamar investigadores, mas decorrem sobretudo em ambiente académico, pelo que não são resolução para os problemas dos recursos humanos do MNAA ou de qualquer outro museu".

"Este esquema das bolsas ligadas às universidades serão extremamente úteis para a investigação dentro dos museus, mas irão requerer, da parte dos técnicos, trabalho muito grande com esses jovens. Esse trabalho é esforço acrescido", sublinhou.

Em resposta aos deputados, Joaquim Caetano lembrou igualmente que o MNAA, "como os outros museus, não tem autonomia", embora haja "uma lei que ainda não foi levada à prática".

"Não é possível esperar muito mais. Estamos nas últimas gerações que fizeram carreira de 20, 30 anos nas instituições. É fundamental que entre gente de forma a que a memória e conhecimento possam ser transmitidos", concluiu.

Leia Também: Há 140 contratações para museus que aguardam autorização das Finanças

Recomendados para si

;
Campo obrigatório