Apesar de termos elogiado imenso ‘Ghost of Tsushima’ quando chegou à PlayStation 4 em julho de 2020, um ponto que nos faltou mencionar é que, antes de o jogarmos, estávamos um pouco saturados de jogos em mundo aberto.
Apesar de ter muito para fazer e explorar, ‘Ghost of Tsushima’ mostrou-se uma experiência diferente da oferecida por outros jogos com mundos abertos ao não ter qualquer mini-mapa no canto do ecrã com dezenas de ícones diferentes, permitindo assim ao jogador respirar e deixar-se absorver pelo cenário do Japão feudal.
Não escondemos que fomos surpreendidos pela experiência proporcionada por ‘Ghost of Tsushima’ e acabou até por se tornar num dos nossos jogos favoritos de 2020, muito à boleia da direção artística da produtora Sucker Punch Productions e da história protagonizada por Jin Sakai no século XIII durante a invasão Mongol.
© Sony Interactive Entertainment / Sucker Punch Productions
Cinco anos depois temos ‘Ghost of Yōtei’, um jogo desenvolvido pelo mesmo estúdio que, apesar de voltar a ter lugar no Japão, conta uma história no século XVII na região de Ezo (hoje em dia Hokkaido) e tendo como personagem principal uma mulher. A protagonista chama-se Atsu e, ao contrário da linhagem nobre de Jin Sakai, é uma mercenária que viu a sua família morta às mãos de um grupo conhecido como Yōtei Six.
Após anos de ausência, Atsu regressa a Ezo com o objetivo de se vingar dos Yōtei Six e percebe que o grupo responsável pela sua tragédia familiar está a tentar tomar controlo da região num confronto com o clã Matsumae. Movida apenas por sede de vingança, Atsu fica conhecida na região como uma Onryō - uma expressão no folclore nipónico para categorizar espíritos movidos por rancor, ódio e vingança.
À semelhança de ‘Ghost of Tsushima’, o enredo de ‘Ghost of Yōtei’ não perde tempo em mostrar aos jogadores o que está em causa e, desde os primeiros momentos, Atsu dá um excelente ponto de partido para uma história que será certamente do agrado não só dos aficionados por filmes de samurais, como também de clássicos modernos como ‘Kill Bill’ de Quentin Tarantino.
© Sony Interactive Entertainment / Sucker Punch Productions
Os paralelismos entre ‘Ghost of Yōtei’ e ‘Kill Bill’ são, aliás, muito fáceis de traçar. Ambos têm uma protagonista feminina que procura executar a sua vingança após uma tragédia pessoal. Tal como acontece com o grupo de assassinos de ‘Kill Bill’, os membros do grupo Yōtei Six são melhores vilões do que qualquer um dos mongóis defrontados por Jin Sakai em ‘Ghost of Tsushima’, com o jogador a ter a liberdade de reunir pistas sobre as localizações de cada um deles ao longo do mapa aberto à exploração.
A progressão de ‘Ghost of Yōtei’ é, aliás, uma das principais diferenças em relação ao antecessor. Em ‘Ghost of Tsushima’, a progressão de Jin Sakai no conflito contra as forças invasoras consistia, na prática, em reconquistar a ilha de sul para norte à medida que ia reunindo aliados, sendo que havia poucos motivos para voltar atrás a não ser por missões secundárias. Em ‘Ghost of Yōtei’ é um pouco diferente, na medida em que a área inicial continua a ser importante para a narrativa - desde logo por ser onde se encontra a casa onde Atsu viveu com a família durante a infância e ser onde o jogador tem a sua ‘base’.
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A casa de infância de Atsu é onde o jogador pode melhorar as armas principais (com um minijogo dedicado a forjar metal) e - tão importante quanto - ter acesso a memórias com os pais e irmão da protagonista, para as quais nos podemos transportar com um simples pressionar de botão (e sem qualquer ecrã de ‘loading’).
A progressão de ‘Ghost of Yōtei’ também é ajudada pelo facto de o jogador não saber precisamente onde se encontram os vilões da história. Para tal, é necessário interagir com as várias personagens com que Atsu se vai cruzando (seja durante a campanha ou missões secundárias) para lhe ser apontado o caminho para que as localizações dos seis integrantes dos Yōtei Six fiquem mais evidentes.
Este sistema de ‘pistas’ é mais desenvolvido pelo facto de o jogador receber frequentemente mapas que devem ser ‘encaixados’ no cenário onde são mostradas localizações importantes para a história, altares (para melhorar habilidades), pequenos santuários (para melhorar acessórios), alvos com a cabeça a prémio (com outras recompensas para Atsu além de monetárias), entre outras áreas de interesse.
© Sony Interactive Entertainment / Sucker Punch Productions
Em muitos sentidos, ‘Ghost of Yōtei’ não apresenta diferenças substanciais em relação a ‘Ghost of Tsushima’. O vento continua a ser a principal forma de o jogador saber a direção do objetivo que pretende seguir e pode ser ativado com a mesma facilidade que no antecessor - através de um arrastar do dedo de baixo para cima no ‘touchpad’ no centro do comando DualSense.
O combate mantém-se praticamente inalterado, na medida que continua a estar muito assente em ataques corpo a corpo e a ter um sistema de ‘pedra, papel, tesoura’ em relação ao tipo de inimigos diante de Atsu. A maior diferença neste ponto está na substituição das ‘posturas’ do primeiro jogo por diferentes armas. Enquanto Jin Sakai tinha apenas uma espada à disposição, Atsu também se mostra prolífica com duas katanas em simultâneo, uma lança, uma ‘odachi’ (uma katana mais comprida) e também uma ‘kusarigama’ (uma pequena foice unida a uma corrente com uma bola de ferro).
O que pode parecer à primeira vista uma pequena mudança estética sem efeitos práticos acaba por se revelar um aprofundamento maior do combate, uma vez que todas estas armas têm os próprios ‘ritmos’ de combate e até alguns ataques especiais. Esta mudança não representa somente um combate mais diversificado, mas também algo importante a respeito de Atsu enquanto personagem.
© Sony Interactive Entertainment / Sucker Punch Productions
Ao contrário de Jin Sakai, que ao longo do enredo de ‘Ghost of Tsushima’ se depara com um conflito pessoal entre a honra da sua posição enquanto samurai ou alguém que usa todos os recursos à sua disposição para expulsar os adversários, Atsu não tem esse tipo de debate na medida que, para ela, só interessa eliminar os seus inimigos.
Isto é algo que fica amplamente claro nas interações de Atsu com outras personagens. A certa altura, um aliado apresenta dúvidas a respeito da decisão da protagonista de matar um dos membros dos Yōtei Six pela calada e pelas costas, com Atsu a desmerecer as questões e a decidir avançar sem qualquer tipo de dúvida.
Só temos coisas boas a dizer da história de ‘Ghost of Yōtei’. Além de se tratar de uma história mais pessoal, também é mais emotiva e apresenta um ritmo mais forte do que a do seu antecessor. Se a narrativa foi uma das coisas que não gostou a respeito de ‘Ghost of Tsushima’, ‘Ghost of Yōtei’ será certamente capaz de o ‘prender’ mais ao longo de todo o jogo.
© Sony Interactive Entertainment / Sucker Punch Productions
As missões secundárias também são mais interessantes, com os alvos que vão surgindo com a cabeça a prémio a proporcionarem pequenos (mas agradáveis) desvios em relação à história principal. Tal como em ‘Ghost of Tsushima’, pode contar com muitos itens estéticos para deixar Atsu à sua imagem, desde bainhas para as armas e cores para as diferentes armaduras que servem de recompensa para algumas destas missões secundárias.
A direção artística também se encontra ao mais elevado nível e, impulsionado pelo poder acrescido da PlayStation 5, podemos dizer que se trata de uma experiência visual singular. Não estamos perante um salto geracional tão impressionante como assistimos em outros exclusivos PlayStation como de ‘Death Stranding’ para ‘Death Stranding 2: On the Beach’, mas as cores do cenário, a iluminação, assim como as partículas e animais que acompanham Atsu durante viagens a cavalo não são nada menos do que impressionantes.
Desfrutámos de ‘Ghost of Yōtei’ numa versão base da PlayStation 5 e, entre modos que dão prioridade à resolução, ‘framerate’ ou ‘ray tracing’ todos impressionam à sua própria maneira e proporcionaram experiências visualmente acima da média de outros jogos desta geração.
© Sony Interactive Entertainment / Sucker Punch Productions
Considerações finais
Ao contrário do que acontece com outras produtoras da Sony Interactive Entertainment como a Naughty Dog, a Santa Monica ou a Insomniac, a Sucker Punch Productions nunca foi uma das produtoras mais ‘vistosas’ da PlayStation. Isto é algo que consideramos incompreensível tendo em conta que se trata de um estúdio que, além de ‘Ghost of Tsushima’, já nos deu ‘franchises’ de grande qualidade como ‘Sly Cooper’ ou ‘inFamous’.
‘Ghost of Yōtei’ é, em muitos sentidos, um ‘pé na porta’ da Sucker Punch Productions para estar entre o panteão de estúdios responsável por alguns dos melhores jogos exclusivos da PlayStation disponíveis no mercado. ‘Ghost of Yōtei’ é o que se pode considerar uma ‘continuação’ perfeita do percurso do antecessor, na medida que responde a grande parte das críticas e ao mesmo tempo que continua a aperfeiçoar o que já estava bem feito.
Apesar da história de vingança de ‘Ghost of Yōtei’, o percurso de Atsu não é só marcado por sangue e morte mas também por uma reconexão com Ezo. No começo da história, o regresso a Ezo é apenas o regressar a um local que foi ‘palco’ de uma tragédia mas, à medida que Atsu volta a embrenhar-se gradualmente entre as suas ‘gentes’, a atravessar as suas planícies, rios, lagos e florestas sob o olhar atento do imponente Monte Yōtei, fica evidente que a protagonista vai fazendo as ‘pazes’ com a terra que a viu nascer e a aprende não só a apreciá-la, como também a lutar pela identidade desta terra ainda fora do alcance do Shogun.
Pontos fortes
- Direção artística continua impecável;
- Grafismo colorido;
- História mais emotiva de uma protagonista complexa;
- Os vilões do grupo Yōtei Six;
- Combate diversificado com armas distintas;
- Estrutura mais aberta e menos rígida do que no antecessor;
Pontos fracos
- Agradáveis ao início, os minijogos podem tornar-se repetitivos;
-Apesar de impressionante, o grafismo pode não oferecer o realismo acrescido que muitos poderiam esperar de uma nova geração de consolas;
- Algumas personagens que povoam o mapa podem ter faces e expressões muito semelhantes;
Ideal para…
‘Ghost of Yōtei’ é uma recomendação fácil de fazer para qualquer pessoa que tenha apreciado ‘Ghost of Tsushima’, sendo que também é uma proposta viável para qualquer aficionado por jogos de ação em mundo aberto ou de histórias com samurais. A história mais emotiva e com melhor ritmo também faz de ‘Ghost of Yōtei’ mais recomendável caso tenha abandonado o jogo anterior a meio.
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