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"Se PCP e Bloco formassem governo, andariam helicópteros a dar dinheiro"

Diz que “nunca desistiu de nada”. Marinho e Pinto, entrevistado do Vozes ao Minuto esta semana, mantém-se no Parlamento Europeu depois de ter percebido que o MPT, pelo qual foi eleito, “é uma fraude política”. Em Bruxelas e Estrasburgo, tenta mudar o sistema e lutar pelos interesses de um “país pobre”, mas com uma “dívida pagável”.

"Se PCP e Bloco formassem governo, andariam helicópteros a dar dinheiro"
Notícias ao Minuto

08:30 - 13/12/16 por Goreti Pera

Política Marinho e Pinto

António Marinho e Pinto assumiu, durante seis anos, o cargo de bastonário da Ordem dos Advogados. Em 2014, voltou-se para a Europa e ocupa desde então o lugar de eurodeputado. Em entrevista* ao Notícias ao Minuto, assumiu-se como um homem revolucionário, que “sempre se deu mal com a mentira”, e um político “diferente dos outros por ter um discurso de verdade e transparência”.

Sobre o Parlamento Europeu, admite que “há coligações de interesses” e que “a Alemanha é manifestamente hegemónica”. Já em relação a Portugal, deixa a garantia de que “a dívida pública é pagável” e admite encarar “a Esquerda portuguesa como verdadeiros sindicatos”.

É um revolucionário desde tenra idade. Já aos 20 anos as motivações democráticas lhe valiam pena prisão e fortes reprimendas do seu pai. Recusa deixar, ainda hoje, que lhe roubem a liberdade?

A liberdade tem duas dimensões. A externa podem tirar-ma, prendendo-me, mas a liberdade de pensamento ninguém me tira. Nunca fui obediente a dogmas. Mesmo quando era religioso, fazia sempre as perguntas ‘porquê?’ e ‘para quê?’. Não aceitava uma verdade só porque me diziam que era verdade. Sempre me dei mal com a injustiça, a hipocrisia, o cinismo e a mentira. Tal como há 50 anos, é hoje o que predomina em Portugal, na política, justiça e finanças.

Quando é que sentiu, pela primeira vez, que tinha de lutar pelos seus ideais, sem medo de incomodar, como já disse, aqueles que "só se sentem bem com o silêncio dos outros"?

A verdade incomoda. Sou alvo de muitos ataques e injúrias, não porque ofenda alguém – nunca ofendi ninguém –, mas porque digo coisas que muita gente gostava que não fossem ditas. Quando se diz uma coisa no espaço público já ninguém pode fingir que não sabe. Quando somos honestos connosco próprios dizemos as coisas, mas quando começamos a pesar as consequências de dizer uma verdade acabamos sempre por dizer uma mentira, quer seja pela ação ou pelo silêncio. As grandes mentiras são feitas de silêncio, de palmadinhas nas costas e de encolher de ombros.

MPT – Partido da Terra é uma fraude política

Porque é que rompeu relações com o MPT – Partido da Terra?

Porque é uma fraude política e não sou só eu que o vejo. Depois de mim saíram dezenas de pessoas. Aquilo foi tomado por uma pessoa que quer servir as suas ambições, a sua mesquinhez. Percebi isso e saí. Não tinha nenhum compromisso com eles. Candidatei-me às eleições por esse partido porque não é possível uma pessoa candidatar-se sem ser por um partido. Os cidadãos deviam poder apresentar listas. Saí e cada um seguiu a sua vida, fundei o Partido Democrático Republicano (PDR), que está a passar por profundas transformações internas. Estamos a refundá-lo para servir os objetivos programáticos e não as ambições pessoais das pessoas que entraram para ele na busca de um lugar ao sol na política portuguesa.

Porque é que, mesmo assim, decidiu manter-se como eurodeputado?

Porque o meu lugar no Parlamento Europeu (PE) não é do MPT, é meu. As pessoas não votaram no MPT, votaram em mim. Ao contrário do que sucede na Assembleia da República portuguesa, no Parlamento Europeu os mandatos são dos deputados eleitos e não dos partidos. Só a degenerescência política portuguesa de querer que os deputados sejam lacaios dos partidos obriga a que quem queira candidatar-se tenha de fundar um partido ou inscrever-se num já existente.

Quando foi eleito mostrou-se surpreendido com o salário que auferem os eurodeputados, mas disse que precisava do dinheiro…

Isso é mentira, foi uma falsidade que alguma comunicação social inventou, ao serviço dos que sempre estiveram calados sobre estas questões. Eu disse quanto ganhava e que é um escândalo o ordenado de deputado para representar um país onde o salário mínimo é 500 euros. Fui a primeira pessoa que o disse e, porque ficaram furiosos, vieram dizer que eu não saía por causa do ordenado. Quando me perguntaram porque não dava o dinheiro aos pobres eu respondi, com ironia: ‘Eu também sou pobre’. O problema não está no que os deputados fazem com o seu ordenado, mas em quem o paga.

Nunca desisti de nada na vida. Também não vivo da política

O que acha que os portugueses viram em si e não viram nos demais políticos portugueses?

Não sei. Eu sou diferente dos outros por ter um discurso de verdade e transparência, que pretende regenerar a política, tirá-la do lodo em que está atolada há décadas. Quero redignificar e credibilizar as instituições democráticas, nomeadamente o Parlamento, que é o coração da democracia. Tem de se acabar com as encenações grotescas em que vive permanentemente. Se as pessoas acharem que estes são objetivos válidos, muito bem. Se não acharem, eu também não vivo da política. Comecei a fazer política aos 64 anos e fi-la antes do 25 de Abril, quando a esmagadora maioria apoiava a ditadura. Depois deixei de fazer porque achei que a democracia tinha o caminho aberto para se desenvolver, mas não aconteceu. E hoje estaria muito mal comigo próprio se estivesse quieto e calado.

Chegou a dizer, na altura em que foi eleito eurodeputado, que o Parlamento Europeu era "uma inutilidade". Continua a pensar da mesma forma?

Não disse que era uma inutilidade. Disse que aquilo era um faz de conta. Muita daquela atividade frenética não tem importância, é para procurar dar um sentido artificial à função de deputado. No Parlamento Europeu, os deputados não podem fazer propostas legislativas. Estão condicionados a montante, porque só podem apreciar as propostas de lei da Comissão Europeia, e a jusante, porque mesmo essas têm de ser aprovadas pelo Conselho da União Europeia. Aquilo tem um mecanismo perverso e há ali coligações de interesses. Há um país que é manifestamente hegemónico, que é a Alemanha. Há quatro famílias políticas presididas por alemães. É muito difícil aprovar qualquer coisa com que a Alemanha não concorde. Eu luto para mudar isso. E quando o denuncio não me quero vir embora. Nunca desisti de nada na minha vida. Tento mudar as coisas.

Sente-se acompanhado por outros eurodeputados?

Sim, há muitos eurodeputados que estão empenhados em colocar as instituições da União Europeia ao serviço dos povos da Europa e da cidadania e não dos capitais.

Entre eles estão eurodeputados portugueses?

Há bons eurodeputados portugueses. Tenho boas relações com quase todos eles, mas não temos trabalhado em conjunto, por acordo prévio, neste sentido. Votamos muitas vezes de forma contrária, mas quando estão em causa os interesses de Portugal é fácil haver unanimidade entre os portugueses. Houve, por exemplo, na questão das sanções e suspensão de fundos.

União Europeia encheu Portugal de dinheiro e nunca escrutinou gastos

Qual é a sua opinião em relação ao tema das sanções?

Sempre fui contra sanções. Portugal não é um aluno que deva ser castigado por se ter portado mal. Portugal nunca cumpriu os seus compromissos perante a União Europeia, mas foi porque a União Europeia nunca criou um clima de responsabilidade nas relações com Portugal. Encheu um país de dinheiro e nunca escrutinou esses gastos. Muito desse dinheiro desapareceu na corrupção, sem ser usado para os fins a que se destinava. Depois da quantia que recebeu, Portugal é um país pobre, com desemprego, jovens a emigrar e uma dívida pública que esmaga qualquer hipótese de desenvolvimento.

O Partido Democrático Republicano está a lutar, neste momento, para concorrer às próximas legislativas?

Para as próximas legislativas ainda faltam três anos. O PDR irá concorrer, está num processo de reformulação e reconversão do qual irá emergir mais forte e credível.

A Esquerda portuguesa não tem propostas políticas, são verdadeiros sindicatos

No vosso site perguntam aos portugueses qual o desafio mais urgente para Portugal. Qual é que elegeriam?

Neste momento, o desafio mais urgente são medidas políticas e económicas que restabeleçam a confiança dos empresários portugueses e estrangeiros. E o outro desafio é sanear as finanças públicas, fazer a consolidação orçamental, acabar com os défices crónicos do nosso Orçamento e encarar o problema da dívida pública. Essa conversa da reestruturação só pode ter um sentido: é passar a fatura para as gerações futuras.

Não havendo reestruturação, resta-nos pagar a dívida.

Resta-nos desenvolver a economia para a pagar. Porque a nossa dívida, ainda que seja monstruosa, é pagável. É preciso que haja investimento privado e que se crie emprego. Como é que uma empresa vai investir em Portugal quando o Governo é apoiado por partidos ferozmente anti-economia de mercado e anti-capitalistas? Eles não perceberam que a alternativa ao capitalismo falhou. O que há a fazer é criar condições para que haja confiança no investimento e que o Estado não se reduza a um mero guarda noturno da economia, mas que regule os mercados suprindo as suas deficiências e moderando os seus excessos.

A Esquerda portuguesa não tem propostas políticas, são verdadeiros sindicatos. Dá ideia que, se PCP e Bloco de Esquerda formassem um governo, andariam helicópteros por aí a dar dinheiro ao povo. Não percebem uma coisa essencial, que é a economia de mercado.

*Pode ler a segunda parte desta entrevista aqui.

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