A antiga eurodeputada socialista Ana Gomes analisou as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a crise no Governo e a demissão rejeitada do ministro das Infraestruturas, por parte de António Costa, afirmando que "o Presidente da República ficou exposto" após andar "a ameaçar há um ano que poderia dissolver a Assembleia".
Na ótica de Ana Gomes, em comentário na SIC Notícias, a não dissolução do Parlamento por parte do Presidente da República prende-se com o facto de "o primeiro-ministro ter virado o jogo ao dar a entender a divergência com o presidente acerca do ministro Galamba".
"Marcelo não o pode por erro seu, por já o ter feito em 2021 e por essa dissolução em 2021 ter resultado numa maioria absoluta do Partido Socialista", argumenta, assumindo que, por isso, "hoje não tem a possibilidade de dissolver mesmo quando está em conflito aberto com o Governo sobre um ministro". No entanto, exorta, "a dissolução está no ar, a prazo".
Para a antiga eurodeputada socialista, o chefe de Estado pode, no entanto, dizer "'acabou este bloco central entre os palácios [de Belém e São Bento]' após sete anos dessa intensa relação". "Ficou evidente", completou.
"O Governo está preparado para eleições e o Presidente não está preparado para eleições e, portanto, não pode dissolver a Assembleia da República", argumentou. Face a isso, Ana Gomes apontou que resposta de Marcelo vai ser "desgastar o Governo", como reforçou no discurso ao país.
Segundo a comentadora, "o que, no fundo, o Presidente da República quis fazer foi declarar guerra aberta".
Ana Gomes considerou ainda que o ministro das Infraestruturas, João Galamba, na origem desta "divergência de fundo" com Costa "é um cadáver adiado no Governo" que "dá imenso jeito ao primeiro-ministro".
Recorde-se que, na terça-feira, o primeiro-ministro e o ministro das Infraestruturas protagonizaram um momento que marcou a agenda política do país, e o Presidente da República não ficou, de todo, fora da polémica.
Galamba demitiu-se, Costa segurou-o (apesar de haver quem ache que foi tudo um teatro) e Marcelo discordou, mas em silêncio. Da Presidência, quando o país inteiro debatia a decisão do chefe do Governo, surgia apenas uma nota de discordância.
A missiva dizia que o Presidente "não pode exonerar um membro do Governo sem ser por proposta do primeiro-ministro" e que o mesmo "discorda da posição deste quanto à leitura política dos factos e quanto à perceção deles resultante por parte dos portugueses, no que respeita ao prestígio das instituições que os regem".
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