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Salários? "Direita foge sempre a dizer ao que vem"

Um artigo de opinião assinado por Pedro Vaz, dirigente do PS.

Salários? "Direita foge sempre a dizer ao que vem"
Notícias ao Minuto

13:26 - 30/11/21 por Notícias ao Minuto

Política Artigo de opinião

"Começa a ser visível, através das muitas declarações de protagonistas da direita portuguesa, mas também através da torrente de comentários, memes, infografias nas redes sociais, que a direita portuguesa irá centrar a sua campanha para as próximas eleições legislativas na baixa evolução salarial da classe média portuguesa.

Apesar do aumento salarial sem precedentes dos mais desprotegidos da nossa sociedade e que auferem o salário mínimo, nos últimos 6 anos o salário mínimo, em Portugal, teve um aumento de 165 euros e, ao que tudo indica, em 2022 terá um novo aumento de 40 euros (o maior de sempre num só ano), o que o colocará acima dos 700 euros.

A este propósito, importa relembrar que durante os Governos da direita (2011-2015) o salário mínimo não sofreu qualquer aumento até ao ano das eleições em 2015 (aumento de 20 euros). Mais, é evidente que a direita portuguesa tem um problema de coerência no que concerne ao salário mínimo nacional.

Para a direita portuguesa o salário mínimo é sempre muito elevado e deveria baixar, como afirmou Passos Coelho, em 2013, quando era primeiro-ministro e afirma, também sempre, que o aumento do salário mínimo conduzirá a mais desemprego e impede o crescimento económico.

Como os anos de governação do Partido Socialista comprovaram à saciedade que esses argumentos não só não são verdadeiros, como é exatamente o oposto, a argumentação da direita evoluiu num outro sentido, tentando virar portugueses contra portugueses, como sempre fizeram – estratégia de André Ventura e do Chega e que o PSD, a IL e o CDS também já adotaram nestes últimos tempos, no que concerne à evolução salarial no país.

Portanto, ao dia de hoje e como a argumentação do aumento do desemprego e da falta de crescimento económico já não resulta, a abordagem argumentativa é agora outra e será largamente utilizada na próxima campanha eleitoral.

A argumentação da direita assenta, agora, no esbatimento da diferença entre salário mínimo e salário médio dos portugueses. Afirmando que os sucessivos aumentos do salário mínimo não são acompanhados por aumentos dos salários daqueles que antes destes mesmos aumentos auferiam prémios salariais bem acima do salário mínimo e vêm o seu estatuto salarial ser cada vez mais nivelado por baixo.

Para a direita importa pouco que o salário médio em 2015 fosse de 913 euros e hoje seja de 1075 euros, como importa pouco que os que sobrevivem com os salários mínimos mereçam que esses salários sejam melhores, pois aquilo que verdadeiramente importa é que a diferença percentual do prémio salarial entre uns e outros se mantenha. A máxima é: os socialistas estão a nivelar por baixo e hoje são cada vez mais os que se encontram no fundo da tabela salarial.

Esta argumentação tem várias entorses, cuja falácia convém desmistificar.

Desde logo, omite que as políticas redistributivas e de rendimentos para a classe média portuguesa vão muito para além do prémio salarial. Refira-se, de forma não exaustiva, algumas das várias políticas que permitiram à classe média portuguesa ter um aumento de rendimentos líquidos: (i) a redução do valor dos passes de transportes que permitiu a algumas famílias pouparem algumas centenas de euros mensalmente e milhares de euros por ano; (ii) o aumento do abono de família e (iii) a gratuitidade dos manuais escolares que permitiu a muitas famílias verem o seu orçamento familiar aliviado em centenas de euros.

Quero com isto dizer que não deverá haver uma preocupação com o aumento dos salários de todos os portugueses? Obviamente, que não. Aliás, sou dos que defendem que as carreiras da função pública deverão ser revistas, em especial para os quadros técnicos especializados e superiores, que o valor dos estágios profissionais apoiados pelo Estado deva ser aumentado, de forma a pressionar o aumento do que se paga no privado a esses quadros técnicos (não é aceitável que se ofereçam prémios salariais de 800 e 900 euros/mês para arquitetos, engenheiros, juristas, etc., nas empresas portuguesas).

Será, pois, comum a qualquer partido político português a defesa do aumento dos salários em Portugal, embora o caminho traçado para lá chegar seja bastante diferente entre esquerda e direita e os resultados também o sejam. Para tal é relevante assinalar as diferenças.

A argumentação da direita passa por fugir à questão concreta do aumento do salário mínimo (montantes, evolução plurianual, etc.). Em teoria são a favor, na prática não, até porque a pressão dos lóbis empresariais que desenvolvem a sua atividade com base em salários baixos tem muita influência no PSD, CDS e IL.

Depois, mais que o aumento dos salários mais baixos, o que lhes interessa é a existência de uma diferença salarial entre esses salários e os restantes. É por isso que afirma que se está a nivelar por baixo os salários, quando todos estão a crescer, em vez de constatarem que se começou a nivelar por cima aumentando todos os salários (mínimo e médio).

Por fim, a sua política para o aumento dos salários assenta na redução de todos os impostos, especialmente para os que têm mais rendimentos e para as empresas, com o argumento falso que essa redução vai aumentar os rendimentos. Não defendem aumentos, defendem o mesmo rendimento com menos tributação. Este argumento, apesar de aparentemente ser bom, omite uma verdade insofismável. Menos impostos levará a menos capacidade de financiar o SNS, a escola pública gratuita, a sustentabilidade da segurança social e as restantes funções sociais do Estado, que as pessoas não percecionam como também elas rendimento disponível para as classes médias.

Os próximos tempos serão de um combate ideológico aguerrido pela visão de sociedade que queremos, pois não há qualquer forma milagrosa que nos permita aumentar salários, manter ou melhorar os serviços prestados pelo Estado de forma tendencialmente gratuita e reduzir impostos, tudo ao mesmo tempo. Alguma coisa ficará pelo caminho e a direita portuguesa foge sempre a dizer o que e ao que vem."

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